quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

[Conexões Globais 2.0] Antônio Martins e a ação rotineira

Como contei no primeiro texto sobre o Conexões Globais 2.0 - Festival Internacional de Cultura Livre, das apresentações de ontem do Diálogos Globais, a que mais gostei - e acredito até que não só eu, mas todos que o aplaudiram algumas vezes - foi a do "jornalista por um mundo pós-jornais" Antônio Martins.

Antes de escrever sobre a sua fala no debate "Da primavera árabe à internet na construção da democracia 2.0", faz-se necessário apresentar o seu currículo. Antônio foi um dos criadores do Le Monde Diplomatique Brasil, que para mim é o melhor, e mais crítico, periódico que circula no Brasil. Entre ótimas edições regulares, com textos produzidos aqui no país tanto pelos jornalistas que fazem parte da equipe quanto por pesquisadores e manifestantes sociais, e dossiês temáticos que elaboram um raio-x de um grande problema social (como foi o de nº 8, sobre a crise econômica) a representação da revista opinativa francesa, em meu ver, cumpre com o que tem no setor "Quem somos":

"Com independência político-econômica, autonomia editorial e densidade analítica, Le Monde Diplomatique Brasil é uma publicação apartidária, pluralista e democrática, que busca ocupar um espaço que não foi até agora devidamente contemplado pelo jornalismo brasileiro".

Além disso, ele também foi um dos criadores do Outras Palavras, plataforma que eu não conhecia e que tem no seu subtítulo uma atividade muito boa mais difícil: "Comunicação compartilhada e Pós-capitalismo". É isso, inclusive, que, pelo que pude entender, justifica o "jornalista pós-jornal". Não que isso ocorrerá por um fim de jornal impresso ou qualquer coisa do tipo, mas que acabe-se com a intermediação no ato de se comunicar. Então, vamos aos meus relatos sobre o que ele disse.

Por Ramiro Furquin (Sul 21)
REINVENÇÃO DA DEMOCRACIA
É justo sobre essa ideia que ele começou a sua apresentação, com uma crítica (velada ou não) que eu concordo plenamente sobre o jornalismo escrito em vias de esquerda. Para ele, mais importante que criticar o PIG, Partido da Imprensa Golpista (Globo, Folha, Estadão como representantes principais), o principal é pensar uma comunicação que ofereça elementos para a compreensão da sociedade.

A atual crise - ou, como dizemos no NIEG, e lá na Espanha também, a farsa com o nome de crise - apresentaria os sinais de miséria da democracia e a possibilidade de sua reinvenção, seja para algo melhor ou pior.

Antes de continuar, Antônio lembrou do massacre realizado na desocupação do Pinheirinho, no último domingo, em São José dos Campos. Ele citou um vídeo em que o juiz de São Paulo, Rodrigo Carpez, teria justificado a decisão, dentre outras coisas, para retomar o prestígio da Justiça paulista (veja aqui http://www.r3noticias.com.br/videos.php?idc=7977, a partir de 2:45).

Voltando ao tema do debate, a reinvenção da democracia, ele destacou que não é a tecnologia em si que possa fazer uma transformação para algo melhor, mas a apropriação da tecnologia para criar relações humanas que dispensem as questões do poder estabelecido que acabam por criar situações desumanas, como a citada acima, seja pela crise econômica ou no que ocorreu/ocorre no Pinheirinho.

Vivemos uma forte hegemonia do capital, que permitiu que se chegasse na atual situação num processo que durou três décadas. Num ponto em que a cidadania não encontrou formas de debate possíveis, num momento com forte poder do capital, para além dos Estados-Nação.

Para reverter este quadro é necessário uma mudança no pensamento sobre a política, e o Fórum Social Mundial deveria ser essencial para isso. Antônio nos relembrou que uma verdadeira transformação social não virá em algumas gestões de executivo, já que política são atitudes diárias, cotidianas. Antes de mais nada, de ação social, e não de representação, já que a transformação social não se delega.

Claro que, segundo ele, como não se trata de um processo repentino - interpretando aqui a própria necessidade das pessoas aprenderem a compreender a sociedade por conta própria -,  é necessário a pressão sob a estrutura atual de democracia, com grande destaque para a representação. Precisa-se ir na esfera contraditória do Estado, atritar e incidir sobre ela. Dentre as alternativas elencadas, está a reforma da política, não a que se pretende fazer no Congresso Nacional, que tende a ser inócua na prática, mas que isso se dê através das mobilizações sociais.

Falar isso num espaço tão abrangente, e com uma "preferência" pelas mobilizações via rede, num momento tão próspero para manifestações populares, mas ao mesmo tempo ainda muito paralisado pós e durante governos com origem de esquerda no Brasil, é muito importante. Provocações assim deveriam ser mais rotineiras do que o normal em espaços assim.

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