sábado, 23 de agosto de 2014

Os conflitos entre negócio e torcedores

0 comentários

Em maio deste ano, escrevi aqui no Observatório que dentre os modelos de distribuição dos recursos do broadcasting, o campeonato nacional que mais se aproximava do ideal é a Premier League. O campeonato inglês, organizado pelos clubes desde 1992, divide metade do valor de maneira igualitária e o resto é de acordo com a classificação e a quantidade de jogos transmitidos. Contei lá que os valores subiram muito com o novo contrato, a ponto de o último colocado da temporada 2013/2014 receber mais que o campeão da temporada anterior.

No último final de semana começou a temporada 2014/2015, mas um dos principais, mais ricos e mais disputados torneios do mundo teve uma semana com duas controvérsias: uma manifestação de torcedores contra o valor dos ingressos e a notícia que o Manchester proibiria tablets em jogos no estádio do clube. Ambos os casos refletem o problema em coadunar no que se chama de “futebol moderno”, que se constituiu a partir dos anos 1990, as ferramentas oriundas de uma nova fase de mercantilização do jogo com os interesses dos torcedores de clubes, fundamentais tanto para que a paixão simbólica continue todos os dias quanto para movimentar o próprio mercado que existe a partir deste esporte.

Uma marcha foi realizada no último dia 16 de agosto em Londres. Organizada pela Football Supporters’ Federation – um elemento concreto de associação, que pode ser comparada à Frente Nacional de Torcedores, criada em 2011 no Brasil para pedir melhorias reais no esporte, tendo em vista a manutenção do direito de torcer da maneira “tradicional” –, o protesto foi contra o fato de os preços das entradas seguirem aumentando mesmo com as outras fontes de receita – não só o broadcasting, mas também os patrocinadores, especialmente no caso dos principais clubes – seguirem crescendo.

No caso britânico, é importante citar que se trata de um processo que reflete o que ocorreu na organização do jogo a partir da década de 1990. Se a Premier League trouxe uma série de benesses, como a maior atratividade no campeonato local, é necessário resgatar a conjuntura imediatamente anterior ao se tratar das tentativas de mudar as formas de torcer, trazendo ao futebol a ideia de espetáculo, com momentos específicos para comemoração e apoio.

Arenas multiuso

No ano passado, a ex-primeira-ministra Margaret Thatcher faleceu e em nenhuma partida do torneio houve minuto de silêncio. Isso porque foi no governo dela, um dos primeiros a aplicar as políticas neoliberais em países desenvolvidos, que se criou uma série de exigências para excluir os torcedores violentos, mas que acabaram também por afastar aqueles de classes menos favorecidas. O marco foi a “Tragédia de Hillsborough”, com 96 mortes e 766 feridos na semifinal da Taça da Inglaterra de 1989 – anos depois foi provado que a responsabilidade maior fora da organização e da polícia, com o relatório apresentado para justificar as mudanças nos estádios tendo se baseado em questões que não existiam e o primeiro-ministro David Cameron pedindo desculpas em 2012.

Coincidência ou não, é na década de 1990 que os grupos de comunicação privados, no mercado europeu desde a abertura do setor na década anterior, passam a enxergar o futebol como excelente produto para atrair audiência e com o início das disputas por direitos de transmissão. Assim, sem possibilidade de comprar o ingresso, os torcedores tiveram que optar pelos pacotes de pay-per-view, que eram mais baratos. De público de estádio, passaram a torcedores-telespectadores.

Neste sentido, vale a comparação com a Bundesliga, o campeonato que mais cresce no mundo. O torneio faz parte de um projeto que ganhou destaque com o título alemão na Copa do Mundo Fifa Brasil 2014, que privilegia a importância social do futebol. O preço médio do ingresso mais barato lá é de 18,4 libras (cerca de 70 reais), enquanto que um clube médio inglês, como o West Ham, cobra 44 libras (166 reais).

É importante acompanhar o momento atual brasileiro, que é o de construção de arenas multiuso, em que a rentabilidade passa a ser para além dos jogos de futebol, e com a proibição de certas tradições do torcedor, como ficar em pé e a presença de bandeiras e instrumentos musicais, sob o argumento de estes poderem ser arremessados em campo ou ser usados como instrumentos de agressão.

O que interessa mais são os negócios

Ao mesmo tempo, um relatório recente da Pluriconsultoria, publicado também na semana passada, apontou que o torcedor brasileiro paga o ingresso mais caro do mundo, tendo em conta a relação do valor nominal com a renda per capita. Os ingressos no Brasil custam, em média, R$ 51,74, com valores crescendo a cada ano – e ainda com a arena do Palmeiras a ser inaugurada –, apesar do nível de competitividade do nosso futebol não vir melhorando, ao contrário dos torneios citados anteriormente.

O segundo ponto deste texto vai em direção oposta: a do novo torcedor que vai ao estádio. Teoricamente, com maior capacidade de consumo, o torcedor desejado é aquele que pode comprar nas lojas que existem nas arenas, antes das partidas, adquira os produtos oficiais dos seus clubes e patrocinadores fora dos estádios e que comentem sobre o evento.

A importância da audiência nas mídias sociais vem crescendo muito, sendo elemento importante para análise do valor de uma marca tanto para o mercado publicitário quanto para o de ações. Entretanto, o Manchester United mandou e-mail para quem comprou ingresso para um amistoso pré-temporada afirmando que não se poderia levar tabletsmaiores que 15X10cm. Os argumentos para tal proibição são que equipamentos de tamanhos maiores que esse atrapalhariam a visão da partida e o receio de que se gravem trechos do jogo e que estes sejam colocados na internet logo em seguida, o que poderia atrapalhar os negócios de direitos de transmissão. Lembramos que essa proibição também constava no material entregue aos torcedores que compraram ingressos para a Copa.

É um momento curioso, já que em meio a uma maior possibilidade de produção de conteúdo, espaços coletivos, ainda que privados, passam a restringir a gravação de imagens e, além disso, em meio a uma sociedade incentivada ao consumo, o produto deste deve ser deixado em casa especialmente para não atrapalhar outra fonte importante de recursos, que aqui também tem prevalência sobre este “novo” torcedor – o “torcedor da selfie”, de olhar para o telão e rir mesmo com o time perdendo, que foi bastante criticado durante a Copa. Ainda que o modelo de distribuição de recursos seja o mais próximo ao ideal, a Premier League traz um histórico que, sustentado pelo medo das ações dos hooligans, não tem como objetivo o torcedor dos clubes, que mantêm a paixão pelo esporte para além do período a cada quatro anos em que o mundo todo praticamente para por conta da Copa do Mundo. O que parece interessar mais são os negócios, a ponto de mesmo o torcedor com perfil mais para consumidor ter restrições a suas práticas nos estádios.

***
Texto publicado na edição 812 do Observatório da Imprensa

terça-feira, 19 de agosto de 2014

Próxima parada: Sertão!

0 comentários
"Meu nome é Anderson, tomei posse como professor assistente. Sou jornalista formado em Comunicação Social aqui pela UFAL e fiz o meu mestrado em Comunicação na Unisinos, no Rio Grande do Sul. Lembro do dia 06 de janeiro de 2011, quando colei grau, naquelas colagens coletivas, e tomei um bom tempo do professor Eurico [reitor] para falar sobre os problemas do COS. Falamos sobre o problema maior em resolvê-los e ele me disse que eu estava indo para uma ótima universidade e, quem sabe, talvez voltasse como professor. Fui, voltei a Alagoas antes do que eu imaginava e hoje estou aqui. Tive que correr atrás das coisas porque não tive quem pudesse indicar os caminhos que eu gostaria de seguir, corri muito. Ah, sou de Maceió, ainda que esteja indo para Santana do Ipanema, é uma volta. Por conta disso, o meu sentimento hoje é um misto de orgulho e responsabilidade. Orgulho por poder voltar agora sobre um outro patamar para esta universidade e responsabilidade por também querer oferecer aos colegas estudantes possibilidades que eu tive, com menos dificuldades..."

Eu vinha pensando a um tempo, especialmente nos últimos dias sobre o que falar caso a palavra fosse dada a quem tomava posse hoje. Inclusive se trataria novamente de algo que tratei 3 anos antes. Mas sem os problemas e as correrias daquela época eu não estaria neste momento oficialmente como professor de universidade federal, professor justamente da UFAL. Meus caminhos poderiam ter se facilitados, minha possível volta poderia ter sido amortecida, entretanto, nas dificuldades daqueles tempos é que aprendi a adorar a pesquisa, independente de financiamento e até de orientação; a observar e aprender tanto com os bons e ótimos exemplos quanto com os ruins. Além disso, no nível de exigência que costumo ter comigo, evitar repetir certas coisas e aprimorar outras.

Por mais que eu também tenha pensado bastante sobre como seria este texto e desde o final do concurso, lá em abril, a possibilidade de assumir já estivesse presente, um histórico cheio de pedras no caminho - por exemplo, um exame demorar 10 dias quando o normal seriam 2 -, especialmente nos últimos 2 anos e 1 mês, só poderia acreditar quando estivesse tudo assinado e mesmo assinado ainda é inacreditável.

Inclusive eu tinha pensado em citar o Fabiano e sua família de Vidas Secas - donde surgiu o nome para o meu cachorro -, o Severino de Morte e Vida Severina, Vicente e Conceição de O Quinze e Riobaldo (Tatarana) de Grande Sertão: Veredas. Afinal, estou indo para o Campus Sertão, Santana do Ipanema.

Mas os 2 anos preponderam, período em que, com exceção da dissertação e de algumas coisas derivadas dela, parecia que estava no fundo de um poço sem fundo. Foram tantas coisas que, confesso, chegou um momento que faltava forças para seguir tentando no que seria normal para a minha formação. Até mesmo porque uma das coisas que pensava que seria tranquila virou um baque sem precedentes, muito desanimadora e, o principal, fechando praticamente todas as alternativas pensadas como "o pior possível".

E foi pior, o misto de orgulho com necessidade fizeram-me percorrer outros caminhos. Pouco mais de 4 meses em que as pesquisas ficaram de lado, crises de garganta enormes vieram e até mesmo o futebol foi colocado para escanteio. Justo o futebol, que não me via sem desde provavelmente o primeiro suspiro para fora da barriga da minha mãe. Aprendi muito neste momento, ninguém poderá me dizer que eu não sei como é viver de tal maneira, sob tais condições de trabalho sem nenhuma proximidade de organização classista - ainda que eu instigasse a identificação classista -, mas com opressões de diversos níveis ali presentes, mesmo que poucas comigo.

Saí e vieram dois concursos muito em seguida. Neste, para uma disciplina como "Lógica, Informática e Comunicação", valeu bastante a formação pluralista e crítica formada entre as dificuldades daqui, que me fizeram olhar para outras ciências, e as várias opções do Rio Grande do Sul, quando optei por me focar na Comunicação. A dúvida que pairou na minha cabeça se esvaiu, ainda que seja bem mais fácil afirmar isso hoje que na época ruim, tudo valeu a pena - apesar que poderia ter sido mais leve, ao menos um porquinho mais normal, né?

Foi isso tudo que me fez ter dificuldades em falar hoje, algo incomum para mim. Apesar de tímido (ou reservado), se é algo que eu tenho conhecimento, não me imponho barreiras para expor. Entretanto, era o peso de 8 anos de caminhada por formação acadêmica, acho que em 7 envolvido em alguma tentativa de estudos paralelos ou oficializados. Especialmente o peso dos 2 anos e 1 mês que colocaram-me de uma maneira mais difícil que eu, um pessimista assumido, poderia imaginar.

Aproveito para encerrar com alguns agradecimentos em especial. Aos meus pais, por me aturarem sempre e darem uma ajuda fundamental após a volta a Maceió. A tias que tentaram me ajudar do final do ano passado para cá, especialmente para uma que além de me aturar quatro meses almoçando na casa dela, escutava as minhas várias reclamações tentando me apoiar. Além deles, à galera dessa jornada, Naara Normande na primeira etapa e os outros três de origem de tempos diferentes de COS e de caminhos posteriores distintos, Victor, Mel e Lane, todos nós concorrentes de forma oficial, mas não nas práticas daquela difícil e cansativa semana de provas e após elas. E à Lídia, pelo apoio na passagem de bastão no posto.

Ah, valeu mesmo a todo mundo que curtiu o meu "gol" pela manhã no Facebook. Pessoas de passagens na minha vida a partir de momentos diferentes e de locais diferentes que com suas palavras também confirmam que numa área que não é exatamente a que mais prezo, a de eu me relacionar com as pessoas, até que eu não estou tão mal rs.

PS: Um aviso à Sociedade Esportiva Palmeiras, tendo em vista a nossa "relação cármica", recupera aí no Brasileiro e, quem sabe, leva a Copa do Brasil de novo, vai. A minha parte para melhorar as coisas eu estou fazendo.

domingo, 10 de agosto de 2014

"Você é um homem morto"

0 comentários
Nesta semana estreou no GNT a terceira temporada de Sessão de Terapia, a primeira puramente brasileira, após a adaptação das duas temporadas da israelense Be'Tipul. Assim como na versão da HBO, o meu acompanhamento da série foi aos poucos, acompanhando uma ou outra semana todos os dias e abandonando por alguns meses. Por conta disso, só esta semana é que terminei de ver a primeira temporada.

A pessoa que me indicou In Treatment na época do lançamento de Sessão de Terapia temeu que a versão brasileira dirigida por Selton Mello pudesse "estragar" a série. Por sinal, é importante falar que a estrutura base é muito simples, dois consultórios de psicólogos e uma ou outra cena externa. Ações restritas. O principal aqui é ver como o especialista consegue fazer com que os pacientes se perguntem sobre coisas que nunca tiveram coragem para se perguntar. E isso fez o formato ser adquirido por mais de uma dezena de países. Sucesso refletido aqui no Brasil, cuja quarta temporada já estaria encomendada antes mesmo de começar a terceira.

Vou logo avisando que será inevitável para mim realizar comparações com a produção dos Estados Unidos. Além disso, por mais que o que importa nela seja a forma como os diálogos são feitos, não me preocuparei em evitar possíveis spoilers.


Quanto aos atores escolhidos, aqui o que consta na memória de determinada característica deles talvez tenha me atrapalhado um pouco na assimilação de algumas personagens. A reconhecida voz grave de Zecarlos Machado (Theo Cecatto) que na minha opinião, por características da Física, não ajuda muito na hora de demonstrar a emoção (diferenciar a raiva para além de um falar mais alto. Ou a como eu assimilo a beleza da Maria Fernanda Cândido (Júlia) num papel cuja sedução está presente.

Mas também, é preciso que eu diga que a minha impaciência com Paul Weston (IT) até meados da segunda temporada, por demonstrar certa arrogância em alguns momentos, não chegou nem perto na versão brasileira. Hei de dizer que tive mais pena dele do que qualquer outra reação, mesmo nos instantes em que ele chega a ser desrespeitoso com outras pessoas. Assim como a Dora Aguiar de Selma Egrei não me causa tanta estranheza como a Gina de Dianne West.

Claro que a variação de opiniões pode também ter mudado pelas minhas próprias experiências de quando assisti às temporadas de In Treatment para agora. Muitas águas rolaram do lado de cá do moinho, coisas que podem ter me aberto a novas perguntas ou à necessidade de não querer tentar responder àquilo que vinha à cabeça.

Creio que isso é uma das coisas que o final da temporada nos encaminha. Será que todo mundo está preparado para trazer à tona aquilo que geralmente fica no subconsciente? Será interessante deixar a emoção aparecer mesmo nos locais em que mais se sente seguro?


"O que está acontecendo na sua vida, Théo?"
A série mostra uma consulta por dia da semana, cada qual com uma necessidade de perguntas diferente e com o desenvolvimento ao longo dos 45 episódios, e a interferência no psicólogo, de maneiras distintas: a anestesista Júlia (Maria Fernanda Cândido) às segundas; o policial do batalhão especial Breno (Sergio Guizé) às terças; a ginasta Nina (Bianca Müller) às quartas; o casal Ana (Mariana Lima) e João (André Frateschi) às quintas; e a terapia de Theo (Zécarlos Machado) com Dora (Selma Egrei).

Continuo tendo como dias preferidos as sessões de segunda e de quarta. Apesar de gostar também da evolução que Breno apresenta ao longo das semanas, a personagem que consegue fazer com que Theo fuja de sua posição para uma ação mais efetiva. E segui não gostando do casal, inclusive achei a Ana até menos problemática que a Amy de IT, ainda que o casal de lá tenha me parecido mais insuportável.

Em relação às outras adaptações, trocar o oficial do Exército americano que matou uma criança no Iraque por um policial especial do Brasil (Breno) que matou uma criança porque a bala atravessou o corpo do bandido foi uma boa escolha. 

Já a escolha por manter a adolescente como ginasta me gerou momentos de dúvida. Quem conhece um pouco deste esporte sabe que a pressão é enorme desde cedo, que há uma série de restrições ao desenvolvimento da mulher por conta da prática esportiva, porém, como o esporte é entendido nos Estados Unidos e como ele o é aqui, mesmo após os sucessos dos irmãos Hypólito, da Daiane dos Santos, de Jade Barbosa e de Arthur Zanetti. A pressão por alto rendimento é muito maior lá porque há muito mais investimento nisso. De qualquer forma, não sei se teria outro esporte cuja pressão se assemelhe por aqui quando se trata de prática de mulheres desde cedo.

Mesmo conhecendo as histórias, ainda que adaptadas, à forma apresentada é diferente. Há cenas que foram feitas de maneira distinta, além da impressão de ter closes mais fechados na versão brasileira, especialmente com a aproximação do final da temporada. Além disso, uma cena que foi marcante na versão estadunidense, em outro cenário, com externa e com maior participação de parentes de um dos personagens e com a presença de outro paciente, foi trocada por uma gravação no consultório. Perdeu-se o contato maior com a perda que marca o final desta e, especialmente, a temporada seguinte; ganhou para arrefecer a transferência erótica de uma das pacientes, em que Theo responde sem se dar conta que está negando repetir a história do pai.


"E a psicologia não tem nada a me dizer sobre isso?"
Primeira sessão e a pessoa começa a falar quem indicou o psicólogo, o porquê disso. Depois de alguns minutos se dá conta que ele está cochilando no sofá. A revolta viraria paixão, por isso que ela voltou. Ainda que esse seja o primeiro encontro com Júlia, mostrava a situação de Theo até ali. Fazia o trabalho no automático, sem perceber as mudanças que ocorria nas salas ao lado do seu consultório, na sala. Se a filha já tinha crescido; se a esposa não sentia a necessidade de precisar dele; ou se o filho mais novo precisava de mais tempo com ele.

A primeira temporada de Sessão de Terapia mostra a descoberta, onde as perguntas que ele exige que seus pacientes façam aparecem para ele, especialmente com a volta às sessões com a orientadora de outros tempos, Dora, cuja provocação é visível o tempo inteiro, chegando ao ápice no penúltimo encontro, em que a direção das imagens é invertida. A esposa o trai, abrindo espaço para que aflorasse o sentimento de paixão pela jovem que se declarara para ele, ainda que sua paciente.

Como se não bastasse, um policial o provoca o tempo inteiro, fazendo com que ele parta para a agressão - esta também é diferente, mais direta que na versão da HBO. Justo quando pensa ter feito um grande trabalho, uma reviravolta com este personagem o faz ter alucinações e se questionar sobre o tanto que deveria ter interferido nas escolhas alheias.

É importante ressaltar na versão brasileira as cenas que vêm da cabeça de Theo, que chega ao ponto de ver o pai, doente, mas menos falado até então, deitado no sofá de seu consultório em vez do pai de um dos seus pacientes. Além disso, destaque para o episódio em que está apenas com João na terapia, momentos que a relação também parece se inverter, com o questionamento sobre o porquê ele tanto queria que o casal se mantivesse juntos se ambos diziam que não dava mais. Casal este que fora lá para decidir se deveria ou não ter um novo filho após anos de tentativa e a desistência de Ana para se dedicar à carreira de executiva.

Mas a frase que dá título a este texto vem de Júlia, que disse que desde a primeira vez desejara "soprar a vida" dentro dele [se alguém quiser, estou à disposição de receber ofertas assim]. Mas entre idas e vindas, o desenrolar da temporada encaminha um homem em estado vegetativo para uma espécie de morte, cheio de dúvidas sobre a sua profissão e sobre ele mesmo, marcando uma necessária reviravolta em sua vida.

terça-feira, 5 de agosto de 2014

A Globo e o futuro do futebol brasileiro

0 comentários

Depois dos 7 a 1 na semifinal da Copa do Mundo Fifa Brasil 2014, o tema para o qual o jornalismo esportivo se voltou foi a necessidade de renovação geral do futebol brasileiro. Passando das categorias de base até o pagamento das dívidas dos clubes com a União, cujo debate no Congresso já estava presente no primeiro semestre, mas que ganhou mais importância depois da Copa.

Em meio a isso, li muitos comentários sobre a responsabilidade das Organizações Globo nesta fase crítica, por ser a detentora dos direitos de transmissão dos campeonatos do país. O grupo foi um dos protagonistas da implosão do Clube dos 13 em 2011, aumentou o fosso entre o que os times recebem do broadcasting, com destaque para Corinthians e Flamengo, e mantinha a situação do futebol nacional como está por meio da dependência econômica destes e da ligação com a direção da CBF.

Incomodou-me tal situação, ainda que o que consta no parágrafo acima seja verdade – tendo eu, inclusive, escrito uma dissertação de mestrado sobre esse processo. Porém, apontar apenas um culpado, ou o principal deles, é tratar dirigentes, empresários e até mesmo os políticos brasileiros (ou ninguém nunca ouviu falar da “Bancada da Bola”?) como inocentes perante tal situação.

Se a renovação precisa ser geral, é necessário entender as condições legais em torno do assunto que proíbem, por exemplo, interferência estatal em associações privadas e dá à CBF o poder de definir o regulamento dos torneios. E a CBF tem eleições a cada quatro anos, mas para se candidatar é necessário o apoio de pelo menos oito federações e cinco clubes da Série A.

CBF lucra milhões todos os anos

Enfim, o intuito deste texto nem é discutir isso, até porque este autor concorda com a necessidade de se repensar a estrutura do futebol brasileiro e as relações de poder nela situadas, ainda que seja pessimista quanto a isso devido à prática político-boleira que se observa no país. Trataremos de como a Globo vem assumindo esta responsabilidade.

Em meio a discussões sobre as dívidas dos clubes, puxadas pelos jogadores por intermédio do Bom Senso FC a partir do ano passado, porém agora apropriadas pelos patrões que atrasam os salários, duas notícias me chamaram a atenção. Ambas publicadas na sexta-feira (1/8) com a participação do Globo Esporte, braço das Organizações Globo responsável por negociar os direitos de transmissão dos eventos esportivos.

Guilherme Costa e Vinicius Kochinski escreveram no UOL sobre uma reunião da CBF com clubes e Marcelo Campos Pinto, diretor do Globo Esporte, para discutir a Lei de Responsabilidade Fiscal do Esporte. A proposta da lei é financiar a dívida dos clubes com a União num prazo de 30 anos, só que com contrapartidas, com punições a serem aplicadas em caso de erros ou novos atrasos de pagamento numa avaliação anual das contas dos clubes.

Já seria estranha a presença de Campos Pinto nesta discussão por se tratar de dívidas dos clubes com a União. Até mesmo a presença da CBF como organizadora, já que enquanto a confederação lucra milhões todos os anos, os clubes seguem no vermelho, mesmo com a entidade organizando os campeonatos nacionais, ao contrário de outros países.

A implosão do Clube dos 13

O único argumento possível para o caso da Globo é que os recursos oriundos do broadcasting são a principal fonte de receita dos times e, geralmente, são adiantados, o que garante um respiro num futebol brasileiro perto de estourar uma bolha, com salários altos e alto volume de importação de jogadores, especialmente da América Latina, em troca de certa dependência na manutenção do status quo. Entretanto, em vez de tratar sobre a proposta de lei que tramita no Congresso, alguns times aproveitaram para pressionar o diretor sobre os valores pagos para a cessão dos direitos.

É preciso explicar que dentre os 40 clubes da Série A e da Série B, 18 negociam por valores maiores e com contratos alongados, garantindo a receita para três ou quatro anos, podendo inclusive antecipar a cota de um período seguinte. Enquanto isso, os demais ficam com um valor menor. No caso dos que estão na primeira divisão, pode-se chegar à metade do que o pior grupo dos 18 – divididos de acordo com o número de torcedores – recebe. Para quem participa da Série B, então, é mais difícil. Para a temporada atual, receberam 2,7 milhões anuais; enquanto o Vasco pode ter recebido mais que 30 vezes disso por estar entre os 18 e este ser o primeiro ano na segunda divisão – a partir do segundo ano o valor é reduzido pela metade.

Os clubes menores, então, resolveram pedir pela criação de um fórum exclusivo sobre o assunto. É preciso explicar, entretanto, que se não mudar a forma de gerenciamento do futebol nacional, como mostram os últimos anos, não adianta ter mais dinheiro à disposição se não se saberá gastar.

Além disso, os clubes brasileiros foram vanguarda no cenário mundial ao criar o Clube dos 13 e organizarem a Copa União em 1987, mas em vez de entenderem o papel de protagonismo no negócio que virou o futebol televisionado brasileiro a partir de então, perderam-se em administrações que tornaram os times tão dependentes do líder comunicacional que, quando a situação podia mudar, recebendo mais de uma concorrente deste grupo, houve a implosão da associação de times.

A negociação individual é a pior forma quando se trata de eventos esportivos. Para ficar no caso brasileiro, a EA Sports anunciou na semana passada que não terá clubes do país no Fifa 2015, um dos principais games de futebol, porque seria muito difícil negociar com cada um para a cessão dos direitos. Ainda que os valores não sejam altos, isso representa uma perda para a imagem dos clubes, já que o jogo pode ser disputado por pessoas de várias partes do mundo. Além de fazer com que os torcedores locais tenham que escolher grandes times estrangeiros na hora da diversão.

Mudança adiou o início dos Estaduais

A segunda matéria foi publicada na Folha de S.Paulo. Bernardo Itri e Dani Blaschkauer informam que a Rede Globo convocou representantes dos 20 clubes da Série A para discutir o futuro do futebol nacional em reuniões a ocorrerem a partir do dia 7. O convite assinado por Campos Pinto tem como pauta do calendário até a formação de jogadores, assuntos a serem discutidos pelos clubes, separados por grupos, com os integrantes do Comitê de Esportes da Globo: Renato Ribeiro (diretor da Central Globo de Esportes), Anco Márcio Saraiva (diretor de Marketing da Rede Globo), Roberto Marinho Neto (diretor de Projetos Esportivos Especiais), Pedro Garcia e Eduardo Gabbay.

Segundo os jornalistas, “o convite causou estranhamento em presidentes de clubes que não viram sentido em a emissora convocar uma reunião para tratar da formação de atletas”. Entretanto, não teriam visto problemas, provavelmente, para discutir com o grupo comunicacional o processo de gestão dos clubes e das entidades de organização dos esportes, a equação financeira e as oportunidades de novas receitas nos estádios. Sobre o calendário, é a emissora quem define a quantidade de datas que terá para transmitir jogos no ano, tendo que passar por ela mudanças como a deste ano, que adiou o início dos Estaduais para que os jogadores tivessem férias após pressão do movimentoBom Senso FC.

Um dos problemas que isso reflete é a mistura entre os interesses de mercado do grupo, com a preocupação com o produto que irá oferecer ao público; e o jornalismo do grupo, que se beneficia historicamente do fato de ter boas relações, e pagar pelos direitos de transmissão, para ter facilidades como a de poder ter acesso a espaços que nenhuma outra emissora de TV possui – ou fazer com que um apresentador pare um treino de helicóptero para gravar um quadro em meio à preparação para uma Copa do Mundo.

Relações de protagonismo

O aparecimento de culpabilidade ao grupo e a necessidade de melhorar o produto, que na Copa gerou boa audiência, esta vem sendo menor a cada ano na transmissão dos jogos locais, fez com que as Organizações Globo resolvessem discutir assuntos cuja chamada não lhe caberia. Assume-se como o “parceiro histórico do futebol brasileiro” para desviar-se das críticas apresentadas até aqui, tentando se mostrar protagonista em possíveis alterações do futebol nacional, perpetuando-se como um dos principais membros da organização do jogo no Brasil.

Não será a partir de um grupo comunicacional que a estrutura do futebol nacional vai mudar, ainda que este seja um dos principais atores das relações políticas que estão engendradas ao esporte brasileiro e que dificultam quaisquer avanços reais. Ampliar a “culpa” é destacar um poder que pode vir a ser bem maior. Deixar que o Globo Esporte chame a si o processo é melhorar ainda menos dentro do que deveria ser mudado e inverter as relações de protagonismo de quem faz o futebol neste país.

***
Texto publicado na edição nº 810 do Observatório da Imprensa.

sexta-feira, 1 de agosto de 2014

A Fase da Multiplicidade da Oferta na Indústria Cultural e no Futebol

0 comentários
Uma das (muitas) coisas boas do processo de construção da minha dissertação foi perceber algumas possibilidades de estudos em paralelo em relação ao que era meu objetivo. Por conta disso, consegui escrever artigos em que podia me aprofundar um pouco mais num detalhe ou outro que eu observei, mas que não necessariamente poderiam estar na dissertação. Acabou sendo bom também para este (forçado) período sabático, já que mesmo sem estar filiado a qualquer instituição de ensino ainda tenho possibilidades de publicação.

O artigo publicado na edição de janeiro-junho deste ano da Revista Mediação (UFMG-edição eletrônica Qualis B4) é um desses casos, conformando com outro artigo que deve ser publicado este ano uma dupla em que há aplicações de conceitos da Economia Política da Comunicação para analisar a relação entre futebol e meios de comunicação.

Este trabalho partiu de um texto que eu publiquei no Observatório da Imprensa que, ainda que seja um espaço para textos mais opinativos, eu costumo usar para desenvolver a base de um possível futuro artigo.

Neste caso, a proposta foi chamar um amigo para escrever junto, para ajudá-lo na produção acadêmica que, igual ao futebol, precisa de ritmo. Infelizmente, o artigo acabou sendo desenvolvido num momento muito ruim e apenas as discussões sobre como ele deveria ser e a formulação do resumo expandido para o evento que seria mandado, o encontro da ULEPICC-Brasil de 2012, puderam ser feitas em conjunto.

Como as revistas científicas não veem problemas em submissão de artigos apresentados em eventos - desde que não tenham sido publicados em outros periódicos ou livros antes -, deixei-o arquivado após a apresentação

Este ano apareceu a chamada da Revista Mediação para o dossiê "Comunicação em jogo: o esporte e o lúdico sob a lógica midiática". Até pelos dois anos passados, revisei o artigo e fiz algumas modificações, tendo ele sido aprovado e já publicado. A vantagem de mandar artigos para dossiês é que o tempo para avaliação e uma possível publicação é menor, o que nem sempre ocorre em outras seções.

A edição conta também com um texto de um dos parceiros de estudos sobre futebol na comunicação na época do Mestrado, que trata do replay nas transmissões esportivas.

Segue abaixo o resumo do artigo que pode ser lido/baixado no site da revista:
http://www.fumec.br/revistas/mediacao/article/view/2187

Resumo

Este artigo parte do conceito de Fase de Multiplicidade da Oferta, criado por Brittos e desenvolvido pelos pesquisadores da Economia Política da Comunicação no Brasil, para analisar a relação intrínseca do futebol com os meios de comunicação, não só em torno do futebol televisionado ou demais produtos oriundos da apropriação desta prática cultural pela Indústria Cultural, mas, principalmente, para observar o quanto os laços entre estas duas formas de entretenimento refletem as modificações político-econômicas vivenciadas na sociedade capitalista. Ambos tendem a possuir, a partir das últimas décadas, uma multiplicidade de agentes em torno dos seus negócios, de forma a transnacionalizar seus controles.