sábado, 19 de janeiro de 2013

[Por Trás do Gol] A democracia no futebol bate as portas alviverdes

Início da década de 1980. Dr. Sócrates e companhia entravam em campo com camisas e faixas com dizeres como "Diretas Já" e "Dia 15 Vote", além da participação ativa na campanha pela aprovação da emenda  Dante de Oliveira. O arquirrival passava a ter um sociólogo como diretor de futebol, que permitiu que os jogadores participassem das decisões que se davam nos vestiários, caso da exclusão de concentração para os jogadores casados e a melhor divisão de prêmios. Foram dois títulos paulistas seguidos, 1982 e 1983, mas a não aprovação das diretas, que gerou a saída de Sócrates para o futebol italiano, deixou este caso como uma exceção na história do nosso futebol.

Final da década de 1980. Após dois turnos, a população brasileira elege o primeiro presidente civil da República após anos de Ditadura Militar e o governo de José Sarney, vice-presidente que assumira o cargo de Tancredo Neves, eleito por meio de Colégio Eleitoral. Anos depois, os jovens vão às ruas vestidos de preto e com as caras pintadas para exigir o impeachment de Fernando Collor de Mello, envolvido com denúncias de corrupção. Casos de corrupção envolvendo políticos no Brasil se multiplicaram anos depois apesar da cassação dos direitos políticos de Collor e muito mais recursos financeiros alimentaram caixas dois, três e qualquer quantidade que fosse.

19 de janeiro de 2013, mergulhado em incertezas e dificuldades políticas, que ajudaram a gerar a situação de rebaixamento no principal torneio de futebol nacional, a Sociedade Esportiva Palmeiras pode ter começado um novo tempo da sua quase centenária história. Os sócios do Palmeiras aprovaram uma ampla reforma estatutária que, dentre outras coisas, amplia a escolha do novo presidente do clube a partir de 2014.
Será que a placa será retirada?
DEMOCRACIA NO FUTEBOL
Creio que o futebol seja um espaço que segue um passo atrás em relação a (pouca) evolução social. Nos estádios o machismo, a homofobia, a xenofobia e demais preconceitos que, ao menos no caso brasileiro, ficam mascarados no cotidiano. Além disso, se temos um avanço gigante da mercantilização na prática esportiva, com grande auxílio da Indústria Cultural nisso, a direção dos clubes seguem funcionando nos modelos arcaicos e oligárquicos característicos. Faz-se tudo por títulos e nada por uma administração que salve a associação de vexames financeiros e, consequentemente, dentro de campo, a curto e médio prazos. Alguns desses dirigentes saem mais ricos que quando entraram e ninguém sabe (será mesmo?) como.

No caso palmeirense, os tempos tenebrosos tiveram  como marca a ressaca após a parceria de sucesso com a empresa de laticínios Parmalat, responsável por montar grandes elencos e na conquista de importantes títulos da nossa história. De 2001 para cá só vieram um Paulista, em 2008, e a Copa do Brasil do ano passado, responsável tanto pela maior alegria dos últimos anos e pela vaga à Libertadores deste ano quanto pela acomodação de acreditar que o frágil elenco daria conta de sair da zona do rebaixamento no Brasileiro.

A aprovação das eleições diretas para presidente não vieram sem pressão. Conselheiros ligados à oposição, caso do economista e ex-presidente do clube Luiz Gonzaga Belluzzo, pressionaram por dentro para que a grande barreira, o Conselho Deliberativo, fosse ultrapassada. Além disso, várias foram as manifestações de torcedores para pressionar os conselheiros para aprovar a resolução. Hoje, digamos, foi apenas a confirmação de um longo e árduo processo.

10 itens foram postos para aprovação neste sábado e apenas um deles precisará de nova análise. Quanto às eleições, foi aprovado também que a posse das novas diretorias devem ocorrer até o dia 15 de dezembro do ano eleitoral ou cinco dias após a última partida do time profissional, o que evita os problemas de programação claramente vistos em 2013, cuja votação será na próxima segunda-feira. Além disso, os candidatos à presidência e às vice-presidências devem estar numa chapa, evitando coisas como em 2007-2008 quando Paulo Nobre, atual candidato à presidência, foi eleito vice-presidente mesmo não sendo da chapa de Affonso della Monica. Por fim, para se candidatar aos cargos, deve-se ter sido conselheiro do clube por, pelo menos, quatro anos.

Na parte prática, e por incrível que possa parecer isso não estava definido antes, a gestão anterior é obrigada a fazer uma transição real, com repasse de informações e dados sobre o clube, para quem assumirá para o biênio seguinte. Assim como, torna-se obrigatória a apresentação de proposta de administração pelas Chapas, no ato da inscrição para os cargos da Diretoria Executiva, com disponibilização eletrônica de seu teor aos associados, mediante solicitação.

A alteração estatutária não aprovada foi o quórum para que as chapas passem do Conselho Deliberativo para as eleições diretas. Estavam em votação não ter quórum, com 213 votos; ter quórum de 15%, que recebeu 1193 votos; e ter quórum de 20%,  que recebeu 536 votos. Apesar disso, foram aprovados os itens: Se não houver a obtenção do quórum de aprovação das chapas, será iniciado novo processo de aprovação das chapas, com os mesmos candidatos; Se houver somente uma chapa inscrita, o quórum de aprovação da inscrição da chapa será de 50% + 1 dos votos dos associados; e Havendo mais de 50% de votos brancos ou nulos, haverá convocação de nova Assembleia Geral, no prazo de quinze dias, para a mesma chapa concorrer à eleição, caso não se obtenha a votação mínima na segunda Assembleia Geral, ensejará o início de novo processo de escolha das chapas, para nova submissão a ela.

Destaco que essa questão do quórum é fundamental para um processo mais "democrático" - por mais que eu tenha problemas com a aplicação prática desse conceito. Dou o exemplo da dupla GreNal, cujas eleições pude acompanhar de perto. No caso do Grêmio, passaram para as eleições diretas três dos quatro candidatos no pleito, vencendo o experiente ex-presidente do Clube dos 13, Fábio Koff. Questionado pela torcida, o então presidente Paulo Odone recebeu a maior parte dos votos no CD do clube, mas não venceu nas eleições diretas. Enquanto isso, o Internacional, que virou exemplo de gestão na primeira década dos anos 2000, só viu o então presidente Giovanni Luigi, bastante criticado pela torcida, ultrapassar a cláusula de 25%, sendo reeleito sem a necessidade de se colocar à votação dos seus quase 100 mil sócios.

O caso palmeirense ainda não inclui os sócio-torcedores, o que, na minha opinião, poderia gerar uma maior adesão à segunda tentativa do projeto Avanti, porém, sai-se de 300 conselheiros, que denúncias surgem que negociam votos em troca de cargos na nova gestão, para milhares de sócios do clube. Um grande passo se levarmos em consideração que este clube completará 99 anos em agosto.

A reforma estatutária aprovada hoje é para se comemorar, porém, devemos seguir de olho no que deve vir por aí, para que nós torcedores palmeirenses possamos acreditar e verificar os avanços reais dessas decisões por dentro da estrutura, podendo modificá-la, por mais que se trata de uma instituição de caráter privado.

2 comentários:

  1. Em sua estrutura social e esportiva, o Palmeiras é muito parecido com o meu amado Fluminense e sempre acreditei que a estrutura de poder atrapalhava e muito os dois clubes.
    O Flu foi além, quando no final do ano passado aprovou a criação da modalidade sócio futebol com poderes para eleger o presidente do clube, mas os dois clubes estão de parabéns, pois estão de desgarrando de estruturas de poder danosas, considerando os seus potenciais.

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    1. Pois é, Alexandre, antes tarde do que nunca. E no caso palmeirense uma mudança na política do clube é essencial. Não dá para o time jogar mal em campo, enquanto os conselheiros vão às vias de fato dentro do clube.

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