terça-feira, 31 de janeiro de 2012

Veneno remédio: o futebol e o Brasil

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Havia comprado o livro em fevereiro do ano passado, em meio a uma incessante busca na internet por livros que tratam, mais de forma teórica do que literária, do que viria a ser mais que um amor eterno, o meu observável de estudo: o futebol.

Talvez pelo tamanho (450 pp.) ou ainda pela dúvida se Veneno remédio: o futebol e o Brasil (Companhia das Letras, 2008) poderia me ser extremamente útil para a pesquisa, a ponto de o ler antes de qualquer um, fato é que ele estava no meio da fila de livros que pretendo ler e que tenho em casa - fila esta que pouco anda, já que sempre aparecem outros e outros textos a serem pegos na biblioteca...

Enfim, foi preciso uma bronca sugestão na banca de qualificação, pela ausência de qualquer referência a este livro escrito pelo professor de literatura brasileira na USP (e ensaísta, músico e compositor) José Miguel Wisnik. Colocado como primeiro da fila, após a leitura das obras de "férias" e de outro livro para artigo "encomendado", eis que finalmente cheguei a ele...

... E rapidamente passei por ele. Wisnik tem um texto que flui tanto quanto uma música, um grande texto literário ou o bailar tem um dos nossos gênios futebolísticos, além de o assunto ajudar a não querer parar de lê-lo, seguir mais um pouquinho por suas páginas. Um relato que apresenta todas as discussões, pertinentes ou não, que povoam o imaginário popular e o teórico - apesar de seus preconceitos - sobre o assunto.

Wisnik se propõe a fugir os estudos de grande abrangência sobre o futebol, que analisam aspectos sociológicos, políticos e econômicos, mas que esqueceriam de analisá-lo por dentro, este jogo que foi/é capaz de apaixonar bilhões de pessoas nas mais variadas partes do mundo. Uma crítica que já havia lido  no livro Elogio da beleza atlética, do alemão Hans Ulricht Gumbrecht (Companhia das Letras, 2007), este também citado algumas vezes em Veneno remédio, e que me faz ter o cuidado de tentar não ser apocalíptico em relação a este esporte, o que seria uma tremenda incoerência da minha parte.

Por falar em citações, o autor usa, discute e abusa de sociólogos, historiadores, filósofos, músicos, cineastas, artistas, escritores, psicanalistas brasileiros e estrangeiros para tratar do esporte aqui apontado que tem a possibilidade de envenenar as pessoas na mesma proporção de ser o remédio para inferir ao Brasil, de fato, o título de uma Nação igualitária - com suas discussões sobre coisas como a "democracia racial".

Mário e Oswald de Andrade, Franklin Foer, Graciliano Ramos, Tostão, Chico Buarque, Ruy Castro, Lima Barreto, Pier Paolo Pasolini, Nelson Rodrigues, Mário Filho e tantos outros que vão tabelando ou contra-atacando músicas, comentários, defesas e pilhérias sobre o esporte de maior recepção e prática mundial - apesar da resistência do império estadunidense.

A seguir, alguns trechos dos livros e, quando eu achar necessário, alguns comentários sobre ele. Afinal, vale bem mais a pena incentivar que os quem gostam de futebol o leiam.

PRELIMINARES
"Viver o futebol dispensa pensá-lo, e, em grande parte, é essa dispensa que se procura nele. Os pensadores, por sua vez, à esquerda ou à direita, na meia ou no centro, têm muitas vezes uma reserva contra os componentes anti-intelectuais e massivos do futebol, e temem ou se recusam a endossá-los, por um lado, e a se misturar com eles, por outro" (p 11-12).

Nas preliminares, ele traz alguns dos temas que irão aparecer ao longo do livro. Além da crítica anterior ao "receio" que se tem de estudar o futebol, Wisnik traz discussões sobre a forma de se jogar, que é definida pelo jornalista italiano Pier Paolo Pasolini entre alguns tipos de prosa, caracteristicamente europeus, e a poesia, sendo o momento do gol sempre poético.

O Brasil teria desenvolvido, apropriado-se de forma antropofágica (à la Oswald de Andrade) do futebol bretão e desenvolvido da melhor maneira possível a poesia em se tratar a bola. Mais à frente, ele dedica um trecho só sobre o futebol brasileiro, mas aqui ele deixa claro que neste país "para o bem e para o mal, uma das maneiras pelas quais o país se fez ser foi o futebol" (p. 28).

2. A quadratura do circo: a invenção do futebol
O segundo trecho é dedicado à apresentação de como o futebol foi "inventado" ou, para melhor dizer frente a tantas práticas com bola, normatizado da forma aproximada com a qual conhecemos atualmente, na segunda metade do século XIX pelas escolas do Reino Unido, em meio ao mesmo presenciado vivenciado em outros esportes, como o boxe, a luta livre, o tênis e o rúgbi.

Segundo Wisnik, após muito tempo sendo renegado pela elite britânica, o esporte reaparece e vem a ser normatizado num ambiente dela, nas escolas, a partir de 1863. Todo o seu desenvolvimento, a partir do poderio do império do Reino Unido, vai gerar relações diferentes, e dialéticas, que justificam e aparecem como elementos em que o veneno e o remédio de sua utilização aparecem: violência e paz; pretos e brancos; pobres e ricos...

Diz ele:
"Assim, diferentemente daquela ideia de que, por ser alienante, o futebol impede a emancipação da vida social, pode-se arrisca a hipótese de que ele se tornou, no mundo contemporâneo, o índice oscilante e problemático da própria condição de possibilidade da vida civilizada" (p. 55).

O autor divide a história deste esporte em três momentos: 1. (... - 1900) máquina a vapor, tempo de se dar um bicão na bola para os pontas correrem atrás dela; 2. (1900-1970), com o capitalismo desenvolvido de produção, é a vez dos times-máquinas, muitos oriundos de empregados de empresas; 3. o atual processo, num capitalismo desenvolvido de consumo, o lazer está envolvido no centro de um complexo mercadológico. Giulianotti dividirá como: pré-moderno, moderno e pós-moderno.

Alguns outros temas, para mim interpretações polêmicas, são discutidas neste trecho, caso da errônea ligação entre a violência das torcidas organizadas aos pobres - quando os líderes das TOs, ao menos no Brasil, são de classe média (alta) -; a criação do comentarista de juiz, este ex-juiz-comentarista que vem a ser o árbitro do árbitro; o goleiro como representação de uma mulher, fazendo o possível para ser imaculado, enquanto o centro-avante seria o "macho", que tenta o gol a todo o custo; a relação, bem interessante, entre os donos do campo (equilibrados europeus) e os donos da bola (equilibristas sul-americanos), que teria uma ligação com as origens excludente do futebol, mas que, em meio a uma miscigenação cultural, como a apresentada na seleção alemã, não pode servir de um frio parâmetro - afinal, é uma análise sob o signo das Ciências Humanas e Sociais.

Algo que achei genial foi, em meio a uma discussão em plena Copa do Mundo FIFA 1998, o convidado artista do debate pós-jogo dá uma aula em quem pretende ver o futebol como elemento de análise científica:

"Gilberto Gil, presente, postulou então a ideia, no mínimo insólita naquele contexto, de que a objetividade no futebol é relativa à percepção possível dos fenômenos, inseparável da sua realidade no tempo e nas condições da partida, e que, portanto, uma infração não existe 'objetivamente', na realidade ou na máquina que a registra, mas somente na fração de tempo em que ela é possível de ser captada em jogo" (109).

Este jogo que é capaz de ter uma zona limiar de tempos culturais, capaz de fazer com que diferentes culturas se aproveitem do mesmo e o tenham como uma forma de admiração para além de outras relações sociais.

3. A elipse: o futebol brasileiro
Este trecho discute o futebol e suas inúmeras polêmicas no Brasil, lugar em que aparece oras como o remédio universal (de um país amadurecido), outrora como um veneno das idiossincrasias do mesmo, que o tornam o veneno desta nação (ainda imatura).

O futebol desenvolvido no Brasil, em meio a um movimento inicial de elitismo, em que os pobres e negros não podem jogar e sequer acompanhá-los nos clubes, acaba por gerar uma discussão entre vários autores durante o processo de "democratização racial" que ele passa a desenvolver a partir da década de 1920 - por mais que isso ainda não seja real até hoje nas funções de poder do esporte, cartolas, técnicos e até repórteres... Havia discussões tanto pelo fato de ser um esporte estrangeiro quanto de quem acreditava que ele poderia significar a volta da "pureza" do país, sem a participação de outras classes sociais.

Vilém Flusser, autor que passou um bom tempo no Brasil e que eu conheço parte de sua obra (mais por motivos "tecnoculturais"), também escreveu sobre o futebol aplicado no Brasil, apontando ensaisticamente nele a possibilidade de um novo tipo de homem, que não mais seria voltado ao trabalho, mas que o veria como uma forma de lazer: o "homo ludens":

"[...] anomalia que não deixa de ser o cerne do pensamento de Flusser sobre a alineação brasileira [trabalho alienado de um avesso do avesso], que lhe dá um estatuto problemático mas afirmativo: de tão funda e sem lastro histórico, a alienação brasileira converte a realidade em jogo e encarna possibilidades de autêntica libertação" (p. 108).

Neste trecho, Wisnik faz uma interessante análise sobre o percurso do futebol no Brasil, de amador às participações em Copas do Mundo, até 2006 (Alemanha). Destrinchando as mudanças do público que ficam na dúvida entre a derrota histórica universal (caso histórico e "eterno" do "Maracanazo" em 1950) à glória triunfal de ser o melhor, com necessidade de se provar isso sempre (Copas de 1958, 1962 e, especialmente, 1970), o veneno e o remédio entrelaçados o tempo inteiro. "Não é a toa que, que visto pelo prisma do futebol, o país se realiza extraordinariamente enquanto não se realiza nunca" (p. 244).

As descrições sobre a domingada de 1938, o (para mim) esplendoroso caso de 1950 - tendo como análise "psicologizante" as "Touradas em Madri" da goleada de véspera sobre a Espanha -, e, algo bem interessante, a antítese dos dois maiores gênios que pisaram no solo: Garrincha e Pelé. Dentre outras diferenciações, Wisnik apresenta esta: "Um [Garrincha] é o trabalhador amador que viveu voltando para a origem, o mato e a pelada, de onde parece nunca ter saído; outro [Pelé] é o profissional precoce, que passou já metade da sua adolescência dentro de um clube de futebol" (p. 286).

Outra diferenciação importante, que segue as mudanças no futebol, é o destaque que o treinador passa a ter, especialmente a partir da polêmica trajetória do comunista João Saldanha como comandante da seleção brasileira de 1969 até às vésperas do Mundial em plena ditadura militar. Para Saldanha, as feras tinham que jogar e, mesmo a contragosto de Zagallo, jogaram muito bem juntas em 1970 - Pelé e Tostão jogavam na mesma posição, mas o último se "sacrificou" pelo time, Rivelino e Gerson idem, Piaza saiu do meio para a defesa para abrir espaço para Clodoaldo... E poucas vezes depois se viu um time assim, talvez nunca mais veremos.

A partir de 1970 passa-se literalmente a se ver futebol, que, com grande ajuda do cartola dos cartolas João Havelange, globaliza-se e mercantiliza de uma maneira impressionante, superando qualquer tentativa ianque de se criar o espetáculo, científico e medido, no lugar da imprevisibilidade futebolística. Partindo para o intermezzo até 1994, com o time de 1982 chegando ao auge da performance técnica e de autoconsciência sobre o futebol - que, com a derrota, fez o Brasil retroceder em seu "estilo" de jogo.

A década de 1990 tem como figura simbólica Ronaldo Nazário, um dos primeiros a sair ainda menor de idade para jogar fora do país e o primeiro dentro do projeto da Nike de se mundializar - após fracassada tentativa no basquete. Do auge à queda colossal em pouco tempo, com direito às graves lesões pós-1998. Da Copa que deveria ter sido o grande jogador à redenção monumental em 2002 sob comando "paternalista" do bravo Felipão. Romário representando o elo de discórdia do malandro (Macunaíma ou Garrincha) em tempos de profissionalização e sendo protagonista, mesmo que indireto, em três convocações para mundiais.

Ronaldinho Gaúcho também é destacado, mas é Rivaldo que merece uma grandiosa importância, ao ser lembrado como um dos maiores jogadores do mundo também em duas Copas do Mundo (1998 e 2002) e pouco reconhecido: "fora de campo, Rivaldo não ostenta riqueza, não exibe intimidade, não irradia poder, não se comporta como astro pop nem se converte a um cosmopolitismo emprestado" (p. 381).

4. Bola ao alto: interpretações do Brasil
Wisnik encerra o livro com interpretações do Brasil que partem do futebol, mas vão além dele. Este esporte que, apesar de ser exposto de todas as formas:

"às manobras da publicidade capitalista, é ainda assim o lugar onde se encontra algo que 'falta ao cotidiano capitalista' [...] um código simbólico reconhecível, capaz de expressar e atravessar as diferenças culturais, a postulação e a superação da concorrência na forma de um jogo-rito, a quadratura do circo, mesmo no limite da sua inviabilização" (p. 429)

José Miguel Wisnik defende em Veneno remédio: o futebol e o Brasil a necessidade de não se questionar a relevância do futebol, em detrimento de "fatos importantes", mas que as pessoas sejam capazes de compreender o sentido desta importância para o país, o que ele tenta fazer nestas mais de 400 páginas.

Um livro essencial para quem gosta e que estuda futebol. Além de contar com inúmeras referências - apesar delas não estarem reunidas ao final -, é uma análise aprofundada e consistente sobre esse nosso veneno remédio.

FOX SPORTS & REDE GLOBO - A concorrência com conglomerados internacionais

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Os canais pagos dedicados aos esportes ganharão um concorrente de peso a partir de 5 de fevereiro de 2012. A Fox Sports, do conglomerado News Corporation, de Rupert Murdoch, monta base no Rio de Janeiro e imediatamente passa a transmitir com exclusividade na TV por assinatura brasileira o principal torneio de futebol do continente: a Copa Santander Libertadores.

Com promessa de cinco narradores e mais de 70 profissionais em sua estrutura, a Fox Sports ocupará oficialmente o espaço do Speed, que não está no pacote básico da TV por assinatura, começando com um público estimado de 3,5 milhões de espectadores. Já que a pretensão é exibir todos os jogos do torneio, o canal FX, também pertencente ao grupo, será utilizado para transmissões todas as vezes que no mesmo horário ocorrerem duas partidas.

A Fox Sports também obteve o direito de transmitir com exclusividade a Copa Bridgestone Sul-Americana no segundo semestre, retirando os dois campeonatos da SporTV, empresa ligada às Organizações Globo. Como os torneios europeus, com destaque para a Liga dos Campeões da Europa, estão há anos com os canais ESPN (Disney) – que terá que dividir a transmissão da Premier League (Campeonato inglês) na temporada 2012-1013 com o novo concorrente no Brasil –, a SporTV só poderá transmitir jogos de futebol organizados no país, aproveitando-se dos privilégios político-institucionais da Rede Globo de Televisão.

Exclusividade do Canal Combate
Além disso, apesar de apresentar dificuldades em tirar profissionais de outras emissoras, inclusive de TV aberta, a maioria dos contratados anunciados pela Fox Sports é ex-funcionária das Organizações Globo, casos do comentarista José Ilan (Globoesporte.com e ex-repórter da Rede Globo), do repórter Victorino Chermont (SporTV) e dos narradores João Guilherme e Marco de Vargas (SporTV). Já o vice-presidente do novo canal é Eduardo Zebini, que trabalhou por mais de uma década como diretor de esportes da Rede Record e participou das primeiras disputas travadas por direitos de transmissão esportiva, na segunda metade da década passada.

Cogitou-se até que a transmissão da Libertadores em TV aberta pela Rede Globo ficaria restrita a um jogo por semana para toda a rede, ao contrário do que tem acontecido, quando a emissora coloca uma partida diferente para cada núcleo (São Paulo, Rio de Janeiro, Rio Grande do Sul e Nordeste). Em nota oficial, nos últimos dias de 2011, a Globo afirmou que transmitirá os dois jogos com brasileiros na Pré-Libertadores (Flamengo e Internacional) e, a partir da fase de grupos, duas partidas por rodada, reafirmando a posse exclusiva dos direitos de transmissão do torneio em TV aberta até 2018.

A SporTV ganha mais uma concorrente de peso. Além dos torneios sul-americanos de clubes de futebol, a Fox Sports já começa com 11 campeonatos de tênis, cerca de oito competições de automobilismo – dentre elas a Nascar, principal categoria estadunidense – e um pacote de lutas. Mesmo com a parceria com o UltimateFightingChampionship (UFC) nos Estados Unidos, onde transmitiu o evento pela primeira vez em TV aberta para todo o território, em novembro de 2011, o canal ainda não se posicionou se tirará a exclusividade do Canal Combate (pay-per-view do SporTV) sobre a atração esportiva que mais cresce no Brasil nos últimos anos.

Transmissão esportiva
A curiosidade sobre esta disputa é que se presumia que existisse um acordo tácito das Organizações Globo com a News Corp. em que não haveria concorrência por pacotes de conteúdos até então pertencentes à empresa brasileira. Afinal, os dois conglomerados comunicacionais foram parceiros por muito tempo na posse da Sky (hoje Sky/Directv), na segunda onda globalizante do audiovisual brasileiro, que tem como marcas a privatização do setor de telecomunicações e sua aproximação com empresas tradicionais que operavam na televisão paga, numa associação entre oligarcas regionais e grandes empresas globais.

Além disso, os canais Globosat e a Fox são sócios nos canais Telecine que, dentre outros produtos e serviços, coproduz filmes com a Globo Filmes e demais produtoras do país, como são os casos de Assalto ao Banco Central(Marcos Paulo, 2011) e O Palhaço (Selton Mello, 2011).

Essa mudança de paradigma já é um reflexo das alterações oriundas da Lei do Audiovisual (12.485/2010), que exige 30% de produção nacional nos canais de TV por assinatura e permite maior participação das grandes empresas mundiais no setor, especialmente no que concerne à posse de operadoras, agora sem limite para o capital estrangeiro. Lembra-se que os grandes conglomerados empresariais atuam tanto nas telecomunicações quanto na produção e distribuição do conteúdo. Este caso reflete também a importância da transmissão esportiva enquanto mercadoria, a ponto de superar antigas alianças.

Filão da TV aberta
A concorrência direta de dois grandes conglomerados, no que tange aos esportes na TV por assinatura – representados pelos canais Fox Sports e ESPN –, pode representar um risco ainda maior para as Organizações Globo nas próximas negociações dos direitos de transmissão de campeonatos nacionais de futebol. Isto pode mudar o estágio atual, de monopólio do direito de transmitir na maioria das mídias, confirmado, por exemplo, no último contrato assinado com os clubes para o Campeonato Brasileiro de Futebol, válido até 2015.

Se as barreiras impostas pela Globo na televisão aberta, por conta de seu padrão tecno-estético e de suas relações político-institucionais, foram, e ainda são, difíceis de serem rompidas, elas são bem mais frágeis na TV paga, onde o confronto envolve organizações com larga experiência internacional, em termos de produção e distribuição de audiovisual, com capitais muito superiores aos dos radiodifusores nacionais.

As novas barreiras que passam a ser construídas pelos conglomerados globais podem ser intransponíveis para os tradicionais oligarcas do mercado audiovisual brasileiro. Por isso a aversão – apresentada já em 2002, quando da necessidade de se fixar em 30% a quantidade de capital estrangeiro nas empresas de comunicação mais tradicionais (TV, rádio e jornal) – em permitir a entrada desses grupos num filão como o é a televisão aberta, já que 63% dos recursos publicitários do mercado nacional vão para este meio de comunicação.

***

[Valério Cruz Brittos e Anderson David Gomes dos Santos são, respectivamente, professor titular no Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação da Unisinos e mestrando no mesmo programa]

Originalmente publicado no Observatório da Imprensa.

segunda-feira, 30 de janeiro de 2012

[Gauchão 2012] Os gritos da torcedora do Cerâmica

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Começo a escrever este texto enquanto o Novo Hamburgo (o "Nóia") vai vencendo o Santa Cruz, fora de casa, por 1 a 0. Isso mesmo, a terceira rodada do Gauchão termina com jogo na quinta-feira, iniciado às 20h. Segundo os radialistas de Santa Cruz do Sul, optou-se por esse dia/horário para fugir do calor, jamais para não concorrer com a dupla Gre-Nal...

Esta terceira rodada marca, para além de mais uma derrota do Grêmio - agora para o Juventude, em Caxias, por 2 a 1 -, a primeira vez que eu fui a um estádio "pequeno" gaúcho para ver o Estadual local. 

Das três partidas que eu havia selecionado para janeiro, como possibilidades para ir, a primeira eu não fui, como contei no último post, por conta do valor do ingresso. A segunda seria São José-POA 3X0 Veranópolis. Porém, no mesmo dia começava o Conexões Globais e teria um show do Lirinha no final do dia... Concorrência desleal.

Enfim, neste domingo ocorreria em Canoas, há algumas estações de trem daqui, o confronto entre o Canoas - favorito de dez em cada dez blogs para ser rebaixado - contra o recém-egresso Cerâmica, da cidade de Gravataí.

Para evitar os problemas que teria em Porto Alegre para o jogo do Cruzeiro, procurei durante três dias, de forma "incansável" informações básicas sobre o confronto de Canoas: valor dos ingressos e horário da abertura dos portões. Nada na sexta, nada no sábado e nada no domingo. O Canoas Sport Clube (ex-ULBRA) não tem site oficial, o perfil no Twitter não funciona há um bom tempo e os jornais locais preferem escrever sobre o Grêmio e uma coisa perdida sobre o time da cidade...

Como a única informação disponível era do jogo de quarta-feira, quando cobraram R$ 30 contra o Grêmio, e também como só precisaria pegar o trem para chegar lá, fui mesmo assim. Descida na estação São Luís/ULBRA, caminhada pelo setor canoense com ruas nomeadas com países da América do Sul e em frente à universidade. Depois de andar mais um pouco, passar pelo gado do pessoal de Veterinária, cheguei no Complexo Esportivo da Ulbra que, para minha surpresa, tinha cerca de vinte torcedores do Cerâmica fardados para o confronto.

Por mais que o ingresso (veja ao lado) marque a meia-entrada por R$ 15,00, logo o ingresso seria R$ 30,00, na verdade a inteira segundo o bilheteiro custava R$ 20, eu pagando R$ 10 por ser estudante. Vamos aos destaques sobre a diversão que um dia Graciliano Ramos disse que seria "fogo de palha"...
SILÊNCIO INICIAL
Ao acaso, acabei ficando do lado da torcida do time de Gravataí. O Complexo Esportivo da ULBRA, que me provem o contrário não tem placar algum, mas tem "cadeiras" em boa parte dele e carrinho elétrico, tinha cerca de 100 pessoas, a maioria torcedora do Cerâmica. O senhor vendedor de "tudo" ouvia o jogo do Juventude contra o Grêmio - que eu ouvia por falta de opção na FM local.

O Canoas entrou em campo vestido de branco, com detalhes de azul e vermelho na camisa; enquanto o Cerâmica vinha com a camisa tricolorida, verde, preta e amarela, com calções pretos. O sol castigava crianças, mulheres (algumas novas e lindas) e senhores de idade. Do lado de lá da simples corda que dividia as torcidas, havia uma pessoa com a camisa do Grêmio e outra com a camisa do Inter.

O primeiro tempo começou com uma chance de bola parada para o Canoas, que o zagueiro cabeceou para fora. Daí em diante, o Cerâmica passou a ter maior posse de bola e chegar com perigo, especialmente pelo lado esquerdo, com duas bolas passando por todos os jogadores dentro da pequena área!

De tanto tentar, a equipe de Gravataí acabou conseguindo marcar. Cidinho completou para o gol, para a alegria dos torcedores tricolores que estavam perto de mim, em meio a um primeiro tempo quase silencioso da pouca torcida presente, o que nos possibilitou ouvir tudo o que falavam dentro das quatro linhas.

A melhor chance do Canoas veio no final do primeiro tempo, com uma falta próxima à entrada da área, que o goleiro afastou muito bem para escanteio. De resto, 1 a 0 para o Cerâmica e uma ida à "lancheria" (traduzindo do guachês: lanchonete) para ficar na sombra e comprar mais um copo de água - ah, que custa R$ 2,00, não R$ 3,00, como no Alfredo Jacconi.

A GRITARIA
No meio, a mulher de branco, que não parou
de gritar por todo o segundo tempo
Voltando ao segundo tempo, parece que alguma coisa aconteceu de diferente com a torcida, já que a etapa final teve muitos gritos por parte das duas torcidas. E foi a do Canoas que gritou de alegria primeiro. Em bola alçada na área, Miro Bahia, que entrara no intervalo, empata o jogo. Desespero de uma senhora que não parou um segundo de gritar "vamos Cerâmica".

Como boa torcedora, tinha que sobrar para juiz e bandeirinha. O último foi apupado algumas vezes por marcar impedimentos e faltas - que existiram realmente. O primeiro teve o seu "grande" momento quando na entrada da área do ataque tricolor, Léo, na interpretação do soprador de apito, entrou solando o zagueiro canoense, que veio com um carrinho perigoso. Expulsão direta para ele e todos os xingamentos possíveis para a arbitragem...

O segundo tempo foi de apupos por parte desta senhora e uma pequena contribuição de um "guri" perto dela, que tentava a todo o custo dividir as atenções, mas não conseguia. Do lado canoense, o setor "social", um pouco acima das arquibancadas, começava a incentivar o jogo, multiplicando a quantidade de presentes no final de tarde "caloroso" do Rio Grande do Sul.

Apesar dos times com atletas que pouco pareciam produzir algo de qualidade técnica, com aposta maior em erros de alguma das defesas, a partida estava movimentada. Perto do final da partida, o número de jogadores se igualou, com a expulsão de Davi Júnior - pelo que me diz a súmula da partida. Um senhor pediu para o adversário "querer jogar bola, não bater". Um dos grandes momentos da arbitragem, que recebeu inequívocas palmas da torcida gravataiense.

Nesse meio tempo, passei a ouvir "Corre Maceió!". Opa! Descobriam-me no meio da torcida? Não, este é o apelido de Nedison Santos, atacante reserva do tricolor de Gravataí. Em meio à descrença da torcida, que pedia/gritava para Cidinho não tocar a bola para ele, que não adiantava, restou para que a defesa adversária assim o fizesse.

No último lance da partida, Maceió se aproveitou da falha do marcador e encobriu o goleiro. Golaço! A festa d@s torcedor@s do Cerâmica foi ainda maior quando perceberam que o juiz acabara a partida logo após a demarcação alagoana no território da República Rio-Grandense!

RODADA
Em três rodadas, a tabela do Gauchão nos mostra Grêmio e Internacional (com quatro partidas) longe da ponta de suas chaves. A Taça Piratini vem sendo comandada pela dupla Ca-Ju. O Caxias (chave 2) foi a Ijuí e venceu o São Luiz por 1 a 0, indo para 9 pontos e 100% de aproveitamento; enquanto o Juventude (chave 1) venceu o Grêmio por 2 a 1 no Alfredo Jacconi, no jogo da TV, e seguiu para 7 pontos.

Não posso deixar de comentar o tricolor da capital. Mesmo assinando o regulamento o presidente/deputado estadual reclamou da tabela, que não permite uma maior pré-temporada para os grandes da capital. O que foi endossado por Caio Júnior, que disse que isso beneficia os pequenos - nessas terras? Justificativa de quem perdeu 2 dos seus 3 jogos até aqui com um time recheado de contratações. Ah, e Douglas, que sem vontade de jogar, foi xingado pela torcida do Juventude ao ser substituído e devolveu mostrando 4 dedos (4ª divisão). Alguém pode me dizer o que ele fez com eles depois, porque o seu time perdeu para outro de 4ª divisão...

O rival Internacional alcançou sua segunda vitória no sábado. O time reserva venceu o Veranópolis por 3 a 1, com grande atuação do meia Tinga. No mesmo dia, o Ypiranga perdeu para o Cruzeiro em casa e viu seu técnico ser o primeira demitido do Gauchão 2012.

Mas Karmino Kolombino teve companhia já no domingo. Marcelo Estigarribia foi demitido do Canoas após três derrotas e, pelo mesmo motivo só que no Pelotas, Carlos Gavião será substituído por Beto Almeida (que "abandonou" o rival Brasil durante a Série C do ano passado). O algoz do áureo-celúrio foi a Lajeadense, que venceu em casa por 3 a 1 uma das promessas do torneio.

Ainda ontem, o São José venceu em seu gramado artificial de Porto Alegre o Avenida por 3 a 0. E, no jogo que acabou há pouco, o Novo Hamburgo venceu fora de casa o Santa Cruz por 2 a 0. Desespero da dupla Ave-Cruz de Santa Cruz do Sul, que só têm 3 pontos no torneio.

Ah, para quem leu o texto sobre os ingressos, o Bruno pediu e aqui está o link para quem os públicos da primeira rodada: http://copafutebolrs.blogspot.com/2012/01/publicos-da-1a-rodada-do-gauchao.html

* Para mais fotos de Canoas X Cerâmica: https://www.facebook.com/media/set/?set=a.142198482565720.28472.100003267082837&type=1. Para mais alguns vídeos sobre esta partida e outros produtos audiovisuais meus: http://www.youtube.com/user/AndersonDGS

A extrema beleza de Melancholia

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alguns meses um dos amigos com quem divido o apartamento aqui em São Leopoldo disse que havia visto com a namorada o filme Melancholia (2011), filme dirigido pelo Lars Von Trier. Em épocas de Megaupload na ativa, ele conseguiu pela internet e chegou até a nos mostrar a incrível cena inicial, quer dizer, o prólogo espetacular da obra e a primeira cena - a da limousine. Deixamos para vê-lo depois.

A ideia era escrever sobre o Gauchão, afinal fui ver a minha primeira partida deste Estadual neste domingo. Chegando em casa, ele perguntou se não queria assistir ao Melancholia hoje. Topei. Afinal, "cansei" de ler críticas positivas sobre o filme, a maioria delas considerando-o como obra-prima, por mais que tenha havido aquele problema com o diretor, que afirmara em Cannes ser apoiador das ideias nazistas - ou teria sido uma brincadeira?

Pois bem, há exata uma hora eu o assisti e posso dizer que entra para a lista de produções audiovisuais que fazem necessária outra recepção; no mínimo, vai gerar uma boa conversa para saber se a outra pessoa que também o assistiu entendeu alguma coisa que ficou como dúvida na sua cabeça. 

Posso estar ainda com muito de 2001: Uma Odisseia no Espaço nas minhas entranhas sensórias, mas percebi alguns elementos em comum. O primeiro é a dificuldade e o prazer de se assistir/ver/ouvir (possíveis) obras-primas; o segundo vem justamente da ideia, que virá mais descrita a seguir, da necessidade de renovação do ser humano; por fim, a música clássica, com trechos da ópera "Tristão e Isolda", de Wagner, que me lembrou o tempo inteiro de "Assim Falou Zarathustra, de Richard Strauss.

PRÓLOGO
Já tinha visto a parte introdutória do filme antes, então não achei tão cansativo. Quer dizer, já havia achado excepcional da outra vez. Adoro as imagens da super câmera lenta. Além disso, basta pensar o título do filme para fazer uma relação com o sentimento melancolia para saber que quando se está numa situação dessas parece que tudo demora muito mais para ocorrer.

As imagens, algumas delas que reveremos instantes depois, refletem vários e diversos sentimentos humanos, da morbidez de uma noiva flutuando na água ou que é presa por fortes raízes que não a deixam andar, a alegria de tratar com a natureza, ou o medo na fuga com o filho num local tão solitário, imenso e tão igual quanto um campo de golfe.

Após minutos assim, vem o título do filme, que, conforme eu li depois, é do mesmo jeito que em Anti-Cristo - que ainda não assisti.

Parte 1 - Justine
A primeira parte parece nos encaminhar para um momento feliz, totalmente oposto à sisudez do prólogo. A primeira cena é cômica ao ser um limousine que não consegue passar por uma curva, a ponto de os recém-casados tentarem andar com o carro e não conseguirem - o meu amigo disse que no cinema tod@s riram muito desta cena.

Porém, assim que chegam à festa, vemos que não é bem assim. O cunhado da noiva, John (Jack Bauer Kiefer Suntherland), cobra a esposa pela demora de duas horas. Justine (Kirsten Dunst) chega com aparência de felicidade ao lado do noivo. Na hora dos discursos, vemos a realidade que faz deste primeiro trecho uma das maiores representações de depressão já vistos.

Os pais dela se separaram. Enquanto ele parece muito feliz com a nova situação, e sua inúmeras namoradas Betty; a mãe faz um discurso pesado, justificando sua ausência no casamento por não acreditar nele, desejando que "aproveitem enquanto podem"; o chefe de Justine, numa empresa criadora de slogans publicitária anuncia o emprego de diretora de arte da agência, mas a força a criar um slogan para uma nova campanha até o final da festa, a ponto de colocar um novo funcionário (Tim) para persegui-la até que ela crie algo; o cunhado John odeia tod@s, exigindo que Justine o compense após todo o dinheiro que ele gastou com a festa; a irmã, Claire (Charlotte Gainsbourgh), é alguém com mania de perfeição, a festa tem que seguir todos os horários pré-definidos.

Em meio a esse turbilhão, Justine não está nada bem. Só o filho de Claire e, em determinados momentos, o seu pai, dão-lhe alguma alegria sincera. Fora isso só são fugas, até aparecer após ser cobrada pela irmã ou pelo cunhado, numa sensação de que algo está acorrentando suas pernas. A namorada do meu amigo interpretou que Justine já havia previsto o que ocorrerá na segunda parte e não queria se casar por conta disso. Eu já acho que ali ela já percebera o quanto "a Terra é má" - algo que justificará sua tranquilidade no final do filme.

Traição, demissão, separação,... Tudo numa mesma noite. A parte 1 termina com o cavalo, que "só ela" conseguia montar, não passando por uma ponte no meio da mata, após sair com Claire para cavalgar em meio ao "campo de golfe com 18 buracos", como faz questão de destacar o seu cunhado. Ela percebe que a constelação de Antares não está mais no mesmo lugar...

Parte 2 - Claire
A tia "steelbreaker", capaz de qualquer coisa na visão da criança, acaba chegando de táxi na mansão numa situação deplorável, sem querer sair da cama nem mesmo para comer seu prato predileto: rocambole de carne.
O foco neste trecho acaba sendo na perfeccionista Claire, que é casada com um cientista, mas que não confia nele sobre os boatos que dão conta que o planeta Melancholia - que dá o nome ao filme - iria se chocar com o planeta Terra dali a alguns dias, após ter passado pelo Sol, Mercúrio e Vênus.

O filme indica em Claire alguém com um medo exagerado sobre o que poderia ocorrer, com o filho dela estando muito mais empolgado com a possibilidade de ver no telescópio o planeta azul passar perto da Terra do que sentindo medo. John não estava tão confiante assim, chegando a guardar suprimentos no estábulo e com a sua aparição final indicando ser ele um homem muito fraco, como provou no primeiro trecho o seu apego ao dinheiro, como se pudesse comprar a alegria da cunhada.

Justine vai se recuperando ao longo desta parte em proporção à aproximação do planeta com a Terra. Uma das partes mais irritantes ocorre quando ela maltrata bastante o cavalo por não querer, novamente, passar pela ponte. Admito que torci para que o animal a derrubasse... Ela diz que prevê coisas, como a quantidade de feijões que tinham numa garrafa no dia do aniversário, a calma dos cavalos na estribaria, servindo como um ponto de tranquilidade em meio ao desespero daquele coletivo, numa espécie de simbiose com Melancholia, demonstrada numa magnífica cena em que ela fica prostrada no solo perante a iluminação azul - que nas noites disputa espaço com a iluminação clara da Lua.

O filme tem um final bem interessante, bem longe de qualquer outro que trata das relações mais graves sobre (o fim d) a vida humana na Terra, seja no aspecto interior, com uma excelente representação da depressão, ou no exterior, com o eterno medo do extermínio "natural" do planeta.

Paro por aqui para não contar (ainda mais) spoilers. Basta terminar com a descrição de Lars Von Trier: "um belo filme sobre o fim do mundo".

sábado, 28 de janeiro de 2012

[Conexões Globais 2.0] Os "Occupy" e a liberdade na rede

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Para encerrar os meus relatos sobre o Conexões Globais 2.0 - Festival Internacional de Cultura Livre, escrevo sobre os dois últimos dias, quinta-feira e sexta-feira. Hoje optei por ficar em casa, para dar conta de algumas leituras, acabei por não acompanhar o último dia do evento - e por causa do acompanhamento do futebol, não pude ver toda a transmissão pela internet, só um trecho do diálogo final. Então, vamos, rapidamente, às discussões assistidas na Casa de Cultura Mário Quintana.

O primeiro Diálogo Global da quinta-feira tratou das ferramentas sociais para ativismo e militância política, com a participação via web do espanhol Javier Toret, que, dentre outras coisas, foi articulador do movimento 15M em Barcelona. Não pude acompanhar este debate porque aproveitei para ver um filme numa das salas de cinema da CCMQ - que, em breve, terá comentários por aqui.


#OCCUPYWallStreet: uma economia a serviço das pessoas
Mas o diálogo seguinte eu acompanhei por completo: "#OCCUPYWallStreet: uma economia a serviço das pessoas", que teve o relato da jornalista e ativista brasileira Vanessa Zettler, que direto dos Estados Unidos falou sobre todo o processo de ocupação no berço do capitalismo financeiro. Explicando que, apesar do final dos acampamentos por não se poder ter estrutura alguma no parque Zucotti.

Ainda assim, há assembleia todos os dias às 19h e o movimento de ocupação gerou mais de 120 centros de trabalho e comitês que continuam a se reunir. O Occupy Wall Street acabou virando um movimento social, sem liderança de nenhum grupo político, partidário ou ideológico, a partir dessa ocupação.

A seguir, Renato Rovai, editor da Revista Fórum, colocou que o que aconteceu em Nova Iorque foi importante porque ocorreu um espaço que não via manifestações há muito tempo. "Quando eles decidem ocupar Wall Street, eles dizem que o adversário é o sistema financeiro internacional". Um confronto entre os 99% de cidadãos contra os 1% dos que utilizam o poder e que nos impedem vários direitos.

O Occupy Wall Street e demais movimentos congêneres colocam algumas contradições - como a falta de uma maior definição ideológica - e nós precisaríamos confrontá-las. A questão principal é saber como os movimentos "tradicionais" podem se apropriar dos novos meios e como os novos movimentos não podem esquecer do histórico de lutas anteriormente estabelecido.

A sul-africana Wilheumina Trout, coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres, fez uma série de apontamentos sobre a participação das mulheres contra o neoliberalismo, num mundo que incentiva a pobreza e em que há a necessidade de os movimentos não atuarem de forma isolada, sendo necessário um maior acesso deste gênero às novas formas de difusão de comunicação.

Por fim, o jornalista italiano Emiliano Boss fez um importante diálogo sobre outros tipos de conexões que geralmente são esquecidos. Com trabalho nos grupos que emigram de seus locais de origem, ele trouxe informações sobre o decorrer das manifestações na Líbia, em que civis forma mortos e outros fugiram após a "ocupação" da OTAN. O que teria ocorrido em países como Tunísia e Egito, em que o único "voto" delas é escapar, surgindo "foot-voters".

Há uma lacuna nestas revoluções após o acirramento delas, já que os grupos não se organizam o suficiente para propor uma tomada de poder alternativa e acabam por ver "velhos" grupos tomando o posto de comando.

Painel.gov
Na sexta-feira a minha ideia era acompanhar um painel que ocorreria na Assembleia Legislativa, que teria a presença, dentre outros, de Ignácio Ramonet e Boaventura de Souza Santos, mas acabei saindo atrasado de cabeça e optei por ficar na CCMQ mesmo. 

Vi o painel "Transparência e dados abertos: o desafio de transformar o Estado em um espaço de gestão compartilhada", que apresentou várias possibilidades de cidadania participativa, seja por parte de ONGs estrangeiras, Banco Mundial e o próprio Governo do Rio Grande do Sul. No fim, houve a assinatura por entidades, Governo do RS, Banco Mundial e algumas universidades do país para a formação de um Observatório neste sentido.

#OCCUPYLONDON - Novas mídias e novos paradigmas
Seguindo os "Diálogos Globais" anteriores, este começou com comentários do pesquisador gaúcho Matheus Lock, que estuda as novas formas de mobilização popular a partir das mídias sociais, e participa do #Occupy London. Lock falou também que os movimentos occupy significam a utilização das novas mídias de forma mais orgânica, substituindo os meios de comunicação enquanto produtores de conteúdo; um engajamento que criou uma interconexão global imensa.

Vera Spolidoro, secretaria de comunicação e inclusão digital do Rio Grande do Sul, começou destacando os problemas de acesso à internet que o país ainda vive. Precisa-se entender a internet como possibilidade de inclusão social, mais que simples "panfletos virtuais". Além disso, Vera fez o repasse dos projetos do Governo local para diminuir as carências sobre o assunto por aqui.

Da Agência Carta Maior, Marco Weissheimer destacou a necessidade de se ter uma mentalidade de mudanças reais para além do processo de deposição de políticos/ditadores, como prova o que ocorreu nos países árabes, em que fundamentalistas ou elementos de direita continuaram com muita força. Segundo ele, e concordo plenamente, não se é possível mudar o mundo sem tomar o poder.

Rita Freire que, dentre outras coisas, é do Ciranda e da Comissão de Comunicação do Conselho Internacional do FSM. afirmou que os movimentos de ocupações surgiram da necessidade de não se aceitar que a população pague pelos erros do sistema; além de refletir também o desespero frente aos problemas sociais; numa geração que está testando e se apropriando de recursos próprios desta geração.

#SPANISHREVOLUTION - Direitos autorais na era digital
Direto de "Copiad, malditos!", o cineasta Stéphane M. Gruesso destacou que os protestos sobre propriedade intelectual tiveram forte presença com o intuito de se criar a Lei Sinde, que pretendia criar regras para os direitos autorais na rede - a SOPA/PIPA deles. Além disso, ele falou que com um simples smartphone se tem a possibilidade de documentar a realidade.

O diretor da Campus Party, Mário Teza afirmou que a difusão via redes sociais ainda não é hegemônica e questiona qual seria o problema, em relação aos direitos autorais, com um mídia que pode difundir o material para mais pessoas em todo o planeta. A luta hoje é contra quem não quer que se compartilhe informações. Além disso, fez uma provocação: "se os clássicos da esquerda estivessem vivos, estariam aqui".

O realizador multimídia Rodrigo Savazoni disse que se acreditava que no Brasil se pudesse usar conteúdos alheios para a produção de novos conteúdos (mixagem), num tempo em que a propriedade intelectual é a grande questão do capitalismo atual, ao menos no campo simbólico. Porém, a mudança no comando do Ministério da Cultura mudou o paradigma de vanguarda que o país tinha nesta questão, criando um retrocesso inimaginável. Savazoni questiona o porquê da mudança de paradigma.

Por fim, o secretário-adjunto da Cultura Jéferson Asumção fez uma apresentação contando a mudança de paradigma no entender a cultura, entendendo o compartilhamento como uma das fontes para o estabelecimento de novas diretrizes sobre o copyright. Com isso, apresentou a Política de Cultura Digital RS, cujas bases são a cidadania digital, a Economia da Cultura e a Estática.

CONEXÕES GLOBAIS 2.0
Para encerrar, não deixar de dizer o quanto o evento foi bem feito, com a necessária articulação com o Fórum Social Temático, e com várias possibilidades de conscientização e capacitação sobre um assunto tão importante para os dias atuais, com importante diálogo com problemas sociais que não esmoreceram e que ainda necessitam de lutas e mais lutas para um avanço real da sociedade.

Dentre tantos outros pontos positivos, a possibilidade de acesso praticamente ininterrupto do evento pela internet - quase 100%, já que faltou energia por alguns minutos na quinta-feira -, com direito à instalação definitiva de uma rede de acesso a banda larga num espaço cultural tão importante/fundamental quanto a Casa de Cultura Mário Quintana.

Além disso, até mesmo as escolhas artísticas forma muito bem feitas, trazendo músicos que defendem a causa da liberdade de informação na rede, como foi o caso do espetacular show de sexta-feira com o Anitelli Trio, com participação do Leoni, que teve claras defesas dos artistas para a liberdade na rede, negando a alcunha de piratas para quem baixa música/vídeos na Internet. Além disso, Anitelli fez questão de criticar a nossa principal mídia, cantando "Xanel 5", que vocês podem ouvir abaixo (em sua apresentação pelo O Teatro Mágico).

Parabéns a tod@s que construíram e compartilharam deste evento ao longo desses quatro dias!


quinta-feira, 26 de janeiro de 2012

[Conexões Globais 2.0] Antônio Martins e a ação rotineira

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Como contei no primeiro texto sobre o Conexões Globais 2.0 - Festival Internacional de Cultura Livre, das apresentações de ontem do Diálogos Globais, a que mais gostei - e acredito até que não só eu, mas todos que o aplaudiram algumas vezes - foi a do "jornalista por um mundo pós-jornais" Antônio Martins.

Antes de escrever sobre a sua fala no debate "Da primavera árabe à internet na construção da democracia 2.0", faz-se necessário apresentar o seu currículo. Antônio foi um dos criadores do Le Monde Diplomatique Brasil, que para mim é o melhor, e mais crítico, periódico que circula no Brasil. Entre ótimas edições regulares, com textos produzidos aqui no país tanto pelos jornalistas que fazem parte da equipe quanto por pesquisadores e manifestantes sociais, e dossiês temáticos que elaboram um raio-x de um grande problema social (como foi o de nº 8, sobre a crise econômica) a representação da revista opinativa francesa, em meu ver, cumpre com o que tem no setor "Quem somos":

"Com independência político-econômica, autonomia editorial e densidade analítica, Le Monde Diplomatique Brasil é uma publicação apartidária, pluralista e democrática, que busca ocupar um espaço que não foi até agora devidamente contemplado pelo jornalismo brasileiro".

Além disso, ele também foi um dos criadores do Outras Palavras, plataforma que eu não conhecia e que tem no seu subtítulo uma atividade muito boa mais difícil: "Comunicação compartilhada e Pós-capitalismo". É isso, inclusive, que, pelo que pude entender, justifica o "jornalista pós-jornal". Não que isso ocorrerá por um fim de jornal impresso ou qualquer coisa do tipo, mas que acabe-se com a intermediação no ato de se comunicar. Então, vamos aos meus relatos sobre o que ele disse.

Por Ramiro Furquin (Sul 21)
REINVENÇÃO DA DEMOCRACIA
É justo sobre essa ideia que ele começou a sua apresentação, com uma crítica (velada ou não) que eu concordo plenamente sobre o jornalismo escrito em vias de esquerda. Para ele, mais importante que criticar o PIG, Partido da Imprensa Golpista (Globo, Folha, Estadão como representantes principais), o principal é pensar uma comunicação que ofereça elementos para a compreensão da sociedade.

A atual crise - ou, como dizemos no NIEG, e lá na Espanha também, a farsa com o nome de crise - apresentaria os sinais de miséria da democracia e a possibilidade de sua reinvenção, seja para algo melhor ou pior.

Antes de continuar, Antônio lembrou do massacre realizado na desocupação do Pinheirinho, no último domingo, em São José dos Campos. Ele citou um vídeo em que o juiz de São Paulo, Rodrigo Carpez, teria justificado a decisão, dentre outras coisas, para retomar o prestígio da Justiça paulista (veja aqui http://www.r3noticias.com.br/videos.php?idc=7977, a partir de 2:45).

Voltando ao tema do debate, a reinvenção da democracia, ele destacou que não é a tecnologia em si que possa fazer uma transformação para algo melhor, mas a apropriação da tecnologia para criar relações humanas que dispensem as questões do poder estabelecido que acabam por criar situações desumanas, como a citada acima, seja pela crise econômica ou no que ocorreu/ocorre no Pinheirinho.

Vivemos uma forte hegemonia do capital, que permitiu que se chegasse na atual situação num processo que durou três décadas. Num ponto em que a cidadania não encontrou formas de debate possíveis, num momento com forte poder do capital, para além dos Estados-Nação.

Para reverter este quadro é necessário uma mudança no pensamento sobre a política, e o Fórum Social Mundial deveria ser essencial para isso. Antônio nos relembrou que uma verdadeira transformação social não virá em algumas gestões de executivo, já que política são atitudes diárias, cotidianas. Antes de mais nada, de ação social, e não de representação, já que a transformação social não se delega.

Claro que, segundo ele, como não se trata de um processo repentino - interpretando aqui a própria necessidade das pessoas aprenderem a compreender a sociedade por conta própria -,  é necessário a pressão sob a estrutura atual de democracia, com grande destaque para a representação. Precisa-se ir na esfera contraditória do Estado, atritar e incidir sobre ela. Dentre as alternativas elencadas, está a reforma da política, não a que se pretende fazer no Congresso Nacional, que tende a ser inócua na prática, mas que isso se dê através das mobilizações sociais.

Falar isso num espaço tão abrangente, e com uma "preferência" pelas mobilizações via rede, num momento tão próspero para manifestações populares, mas ao mesmo tempo ainda muito paralisado pós e durante governos com origem de esquerda no Brasil, é muito importante. Provocações assim deveriam ser mais rotineiras do que o normal em espaços assim.

Conexões Globais - Rápido diálogo sobre o primeiro dia

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Dado o adiantado da hora, rápidos comentários sobre o Conexões Globais 2.0 - Festival Internacional de Cultura Livre, que teve início nesta quarta-feira, na Casa de Cultura Mário Quintana (Porto Alegre-RS). O evento faz parte do Fórum Social Temático 2012, realizado pela Associação Software Livre.org e pela pelas Secretárias de Inclusão Digital e Comunicação do Rio Grande do Sul.

Gosto bastante da CCMQ, o espaço é um paraíso cultural numa metrópole (tão cultural) quanto Porto Alegre. O espaço do vão, a Travessa dos Cataventos, foi bem arrumado para receber os painéis, Diálogos Globais, show auxiliar e show principal. Com um pouco de paciência, em especial nos Diálogos, consegue-se trafegar e se acompanhar bem as apresentações. No caso do show, como o palco está na Rua 7 de setembro, foi super tranquilo.

Além disso, internamente, estão ocorrendo outros eventos da programação, caso das oficinas, desconferências - onde qualquer um poderia apresentar algo, desde que se inscrevesse na internet - e outras atividades relacionadas ao FST, que também utiliza diariamente uma das salas de cinema para mostrar vencedores de festivais realizados no Rio Grande do Sul.

A internet como direito humano
Algumas pinceladas, por conta da hora, sobre o primeiro Diálogo Global: "A internet como direito humano":

Javier de la Cueva, advogado espanhol especialista em direitos digitais, falou de algo importantíssimo quando tratamos do potencial "revolucionário" das mídias sociais. Ele nos alertou para ter cuidado com o lugar em que realizamos nosso ativismo, já que se tratam de plataformas privadas e, em sua maioria, situadas nos EUA, tendo que atender à legislação daquele país. Assim, de uma hora para outra podem impedir nosso ativismo.

Giuseppe Cocco, professor da UFRGS, fez uma análise sobre o novo processo socioeconômico em que vivemos, e a necessidade de ampliação dos direitos, pensando a produção dos mesmos para além da luta entre o estatal (público) e o privado, já que hoje cada vez mais a gente encontra o mercado do lado do Estado e vice-versa. A crise atual sendo justamente na estrutura dos direitos.

Quem mais eu esperava para ouvir era a secretária de Direitos Humanos do Gabinete da Presidência, a deputada federal Maria do Rosário, já que vários assuntos importantes (Comissão da Verdade, Marco Civil da internet, Pinheirinho,...) passam por sua pasta. Ela fez fortes críticas às ocupações bélicas de outros países e destacou que "o Brasil não quer que os direitos humanos sirvam aos poderosos como instrumento de intervenção a outros países". 2012 será o ano de reafirmar os resultados das discussões estabelecidas sobre o Marco Civil da Internet no Congresso Nacional.

Além disso, e o mais importante na atual conjuntura, Maria do Rosário falou sobre o Pinheirinho. Primeiro para destacar a necessidade de não se separar a luta por direitos humanos. Afinal, a inclusão digital também é uma questão para as pessoas que ainda lutam, como no Pinheirinho, para ter o direito a um teto. Confira a seguir o trecho que ela admitiu como declaração pública sobre o ocorrido em São José dos Campos:

MariadoRosarioioconexoes.wav

Por fim, o engenheiro mecânico e ex-presidente da Telebras Rogério Santanna afirmou a importância de o Estado tomar para si o processo de implementação da banda larga. O mercado já teria provado que não vai fugir dos grandes centros para aumentar a difusão do serviço. Santanna criticou também a agência reguladora (Anatel), que parece atender aos interesses dos regulados e não da população.

Da primavera árabe à Internet na construção da democracia 2.0
Esta eu gostaria de escrever mais quando voltar das atividades desta quinta-feira, especialmente a apresentação do jornalista "por um mundo pós-jornais" Antonio Martins, que, em meio à presença do cantor, compositor e ex-ministro da Cultura Gilberto Gil, acabou sendo o destaque do Diálogo, ao ser incisivo em suas opiniões referentes às ações sociais na contemporaneidade. O espaço teve presenças de membros do governo gaúcho, com destaque para o governador Tarso Genro.

Só para registrar o relato ainda nesta postagem, a jornalista Olga Rodriguez fez uma retrospectiva de como se deram as ações da primavera árabe a partir de mídias sociais, mas destacando a necessidade de outras formas de ação. Sendo que o novos meios possibilitaram uma difusão internacional de lutas e verdades.

Gilberto Gil optou por fazer uma espécie de confronto entre o que poderia ser chamada de velha cultura e esta nova cultura, criticando a partir da dualidade tradiçãoXglobalização (ocidentalização) vivida no Oriente Médio o olhar ocidental que temos do mundo. A internet não é só ocidental; parte de um modelo de repressão para um instrumento de uma construção democrática, sem totalitarismos (imperiais ou comunistas), que se faz em escala mundial. Uma revisão de conceitos que podem nos levar a uma governabilidade global no lugar da "nossa" democracia.

Já o coordenador do Gabinete Digital do Governo do Rio Grande do Sul, Vinícius Wu, afirmou que estaríamos diante de novas configurações sensoriais e que a democracia parece uma gaiola rígida para prender um poder que seria líquido. Assim, precisaríamos juntar a democracia e o poder de uma outra forma, já que estaríamos caminhando para uma esfera pública global, em que o poder não está mais ligado a um território.

Como disse, pretendo tratar da apresentação de Antonio Martins, responsável pela criação do excelente Le Monde Diplomatique Brasil e pelo Outras Palavras, num post em particular. Ele conseguiu abordar algumas questões de novas tecnologias da maneira que estou mais "acostumado". Só para deixar um gostinho especial, já no início ele deixou clara a necessidade de menos criticarmos o Partido da Imprensa Golpista e mais produzirmos conteúdo que ofereçam elementos para que as pessoas possam compreender a sociedade.

...
Ah, só para finalizar, o show entre os Diálogos foi muito bom, com direito a apresentações circenses do Circo Híbrido. Sem falar na maravilha que foi o show do Lirinha!!! 


Fiquem com "Futurível", citado por Gil como algo que dá sinais do clarão no horizonte, algo protutópico e pós-utópico:



segunda-feira, 23 de janeiro de 2012

[Gauchão 2012] Ingressos, ingressos, ingressos...

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Eu tinha preparado uma programação especial para acompanhar nas arquibancadas, pelo menos, um jogo nas três primeiras rodadas do Campeonato Gaúcho de Futebol. Tudo certo para ir ao Estádio Estrelão, em Porto Alegre para assistir a Cruzeiro X Santa Cruz. Na véspera, fui conferir o valor do ingresso e tomei um susto: o mais barato estava a R$ 30,00.

Espera aí. R$ 30,00 para ver um jogo de Estadual e entre os super-times de Cruzeiro e Santa Cruz? Justiça seja feira, o Cruzeiro, que ano que vem arte para Cachoeirinha, conseguiu resgatar boa parte do elenco do ano passado, que chegou nas semifinais dos dois turnos. 

Até imagino que nos jogos contra Grêmio ou Internacional o valor do ingresso seja mais caro. Afinal, na maior parte do Estado (talvez não em Pelotas e em Caxias do Sul), a tendência é que a torcida adversária seja maioria no estádio e nada anormal que eles paguem mais e ajudem ao clube local com um acréscimo da renda.

Quanto você pagaria?
Mas R$ 30,00 num jogo entre times "pequenos"? Era o valor de inteira dos jogos do Brasileirão da Série A que eu vi em São Paulo no ano passado - seja no Morumbi, Pacaembu ou no Canindé (Palmeiras).

Pensei de um dia ao outro se iria ou não. Afinal, por mais que seja estudante (e pudesse pagar R$ 15,00), ainda teria o trem, o transporte até a parte final da Av. Protásio - que corta Porto Alegre quase que de ponta a ponta - mais o lanche durante ou depois da partida. Dentro do meu orçamento, caminhando para o final do mês e com outras atividades durante a semana na capital, ficaria complicado.

Perguntei a alguns amigos o quanto eles estariam dispostos a pagar num ingresso em seu respectivo Estadual. Dos que responderam, quatro (em Alagoas) estariam dispostos a pagar de R$ 10 a R$ 15, sendo que um deles pagaria também de R$ 15 a R$ 20. Outro, um xavante, disse que pagaria qualquer valor para ver o Brasil de Pelotas...

Tabela de ingressos
Por curiosidade, resolvi olhar o valor do ingresso em todos os jogos da primeira rodada, mais Novo Hamburgo X Internacional, realizado na quarta-feira. Vamos a eles:

- Novo Hamburgo 0X1 Inter (18/01) - R$ 30,00 (antecipado) e R$ 35,00 (no dia do jogo);
- Cruzeiro 3X1 Santa Cruz (21/01) - R$ 30,00 (arquibancada) e R$ 50,00 (cadeira);
- Cerâmica 2X2 Juventude (21/01) - R$ 30,00
- Novo Hamburgo 3X1 São José-POA (21/01) - R$ 20,00
- Grêmio 0X2 Lajeadense (21/01) - R$ 35,00 (arquibancada), R$ 45,00 (cadeira lateral) e R$ 60,00 (cadeira central);
- Avenida 3X2 Internacional (22/01) - R$ 40,00 (geral - antecipado), R$ 60,00 (geral - no dia do jogo);
- Veranópolis 2X1 Universidade (22/01) - R$ 15,00 (antecipado) e R$ 20,00 (no dia do jogo);
- Pelotas 1X2 São Luís (22/01) - R$ 30,00 (arquibancada) e R$ 40,00 (área social);
- Caxias X Ypiranga (22/01) - R$ 20,00 (arquibancada) e R$ 40,00 (cadeira).

Temos algumas coisas para observar. A primeira é que a média do valor do ingresso mais barato é de R$ 25,00. O mais caro foi justamente quando o visitante era o Internacional, R$ 40,00 em Santa Cruz do Sul. O mais barato foi o do Veranópolis, a R$ 15,00, mas no site do clube havia a informação de que para o confronto contra o Grêmio o valor, antecipado, será de R$ 50,00 (!). Essa diferença fica clara quando pegamos o único time com dois jogos como mandante, o Novo Hamburgo: R$ 30 (Inter) X R$ 20 (São José-POA).

Por fim, vale a pena destacar é que o Grêmio também cobrou caro para que a torcida visse o seu time de "gladiadores" perder para a Lajeadense. Como referencial, o Inter pegará o Cerâmica no Beira-Rio na quinta-feira e o valor do ingresso mais barato é de R$ 20. Acho que agora já dá para saber quem vai ajudar a pagar tantos grandes salários no lado do Olímpico...

Comparação
Provavelmente alguns gaúchos se chatearão com esta comparação. Mas costumo dizer que o nível do futebol alagoano atual está melhor que o do interior do Rio Grande do Sul e temos um estádio como o Rei Pelé e a presença de jogadores campeões do mundo com São Paulo (Aloísio Chulapa no CRB), com Internacional (Adriano Gabirú no CSA) e de campeões nacionais (goleiro Flávio no CSA e Túlio Maravilha no CSE).

Enfim, para o "clássico das multidões", CRB X CSA, o valor do ingresso antecipado foi de R$ 15,00 (arquibancada baixa), R$ 30,00 (arquibancada alta) e R$ 100,00 (cadeiras), dobrando no dia do jogo da primeira rodada do Alagoano. Os valores foram considerados altos pelo presidente do CSA, Jorge VI.

Para a rodada seguinte, o CSA enfrentou o CSE de Túlio e cobrou R$ 10,00 (arquibancada baixa), R$ 15,00 (arquibancada alta) e R$ 30,00 (cadeiras). Por conta de um problema na entrega dos ingressos o valor não mudou, mas iria provavelmente para R$ 15, R$ 20 e R$ 45.

Fica a sugestão para que o torcedor gaúcho fique de olho no valor dos ingressos cobrados por seus dirigentes. Afinal, há dinheiro da televisão para pagar os custos, ao menos durante o Estadual, e não deveria ser quem gosta de futebol a bancar de forma tão cara sua paixão.