sábado, 28 de janeiro de 2012

[Conexões Globais 2.0] Os "Occupy" e a liberdade na rede

Para encerrar os meus relatos sobre o Conexões Globais 2.0 - Festival Internacional de Cultura Livre, escrevo sobre os dois últimos dias, quinta-feira e sexta-feira. Hoje optei por ficar em casa, para dar conta de algumas leituras, acabei por não acompanhar o último dia do evento - e por causa do acompanhamento do futebol, não pude ver toda a transmissão pela internet, só um trecho do diálogo final. Então, vamos, rapidamente, às discussões assistidas na Casa de Cultura Mário Quintana.

O primeiro Diálogo Global da quinta-feira tratou das ferramentas sociais para ativismo e militância política, com a participação via web do espanhol Javier Toret, que, dentre outras coisas, foi articulador do movimento 15M em Barcelona. Não pude acompanhar este debate porque aproveitei para ver um filme numa das salas de cinema da CCMQ - que, em breve, terá comentários por aqui.


#OCCUPYWallStreet: uma economia a serviço das pessoas
Mas o diálogo seguinte eu acompanhei por completo: "#OCCUPYWallStreet: uma economia a serviço das pessoas", que teve o relato da jornalista e ativista brasileira Vanessa Zettler, que direto dos Estados Unidos falou sobre todo o processo de ocupação no berço do capitalismo financeiro. Explicando que, apesar do final dos acampamentos por não se poder ter estrutura alguma no parque Zucotti.

Ainda assim, há assembleia todos os dias às 19h e o movimento de ocupação gerou mais de 120 centros de trabalho e comitês que continuam a se reunir. O Occupy Wall Street acabou virando um movimento social, sem liderança de nenhum grupo político, partidário ou ideológico, a partir dessa ocupação.

A seguir, Renato Rovai, editor da Revista Fórum, colocou que o que aconteceu em Nova Iorque foi importante porque ocorreu um espaço que não via manifestações há muito tempo. "Quando eles decidem ocupar Wall Street, eles dizem que o adversário é o sistema financeiro internacional". Um confronto entre os 99% de cidadãos contra os 1% dos que utilizam o poder e que nos impedem vários direitos.

O Occupy Wall Street e demais movimentos congêneres colocam algumas contradições - como a falta de uma maior definição ideológica - e nós precisaríamos confrontá-las. A questão principal é saber como os movimentos "tradicionais" podem se apropriar dos novos meios e como os novos movimentos não podem esquecer do histórico de lutas anteriormente estabelecido.

A sul-africana Wilheumina Trout, coordenadora da Marcha Mundial das Mulheres, fez uma série de apontamentos sobre a participação das mulheres contra o neoliberalismo, num mundo que incentiva a pobreza e em que há a necessidade de os movimentos não atuarem de forma isolada, sendo necessário um maior acesso deste gênero às novas formas de difusão de comunicação.

Por fim, o jornalista italiano Emiliano Boss fez um importante diálogo sobre outros tipos de conexões que geralmente são esquecidos. Com trabalho nos grupos que emigram de seus locais de origem, ele trouxe informações sobre o decorrer das manifestações na Líbia, em que civis forma mortos e outros fugiram após a "ocupação" da OTAN. O que teria ocorrido em países como Tunísia e Egito, em que o único "voto" delas é escapar, surgindo "foot-voters".

Há uma lacuna nestas revoluções após o acirramento delas, já que os grupos não se organizam o suficiente para propor uma tomada de poder alternativa e acabam por ver "velhos" grupos tomando o posto de comando.

Painel.gov
Na sexta-feira a minha ideia era acompanhar um painel que ocorreria na Assembleia Legislativa, que teria a presença, dentre outros, de Ignácio Ramonet e Boaventura de Souza Santos, mas acabei saindo atrasado de cabeça e optei por ficar na CCMQ mesmo. 

Vi o painel "Transparência e dados abertos: o desafio de transformar o Estado em um espaço de gestão compartilhada", que apresentou várias possibilidades de cidadania participativa, seja por parte de ONGs estrangeiras, Banco Mundial e o próprio Governo do Rio Grande do Sul. No fim, houve a assinatura por entidades, Governo do RS, Banco Mundial e algumas universidades do país para a formação de um Observatório neste sentido.

#OCCUPYLONDON - Novas mídias e novos paradigmas
Seguindo os "Diálogos Globais" anteriores, este começou com comentários do pesquisador gaúcho Matheus Lock, que estuda as novas formas de mobilização popular a partir das mídias sociais, e participa do #Occupy London. Lock falou também que os movimentos occupy significam a utilização das novas mídias de forma mais orgânica, substituindo os meios de comunicação enquanto produtores de conteúdo; um engajamento que criou uma interconexão global imensa.

Vera Spolidoro, secretaria de comunicação e inclusão digital do Rio Grande do Sul, começou destacando os problemas de acesso à internet que o país ainda vive. Precisa-se entender a internet como possibilidade de inclusão social, mais que simples "panfletos virtuais". Além disso, Vera fez o repasse dos projetos do Governo local para diminuir as carências sobre o assunto por aqui.

Da Agência Carta Maior, Marco Weissheimer destacou a necessidade de se ter uma mentalidade de mudanças reais para além do processo de deposição de políticos/ditadores, como prova o que ocorreu nos países árabes, em que fundamentalistas ou elementos de direita continuaram com muita força. Segundo ele, e concordo plenamente, não se é possível mudar o mundo sem tomar o poder.

Rita Freire que, dentre outras coisas, é do Ciranda e da Comissão de Comunicação do Conselho Internacional do FSM. afirmou que os movimentos de ocupações surgiram da necessidade de não se aceitar que a população pague pelos erros do sistema; além de refletir também o desespero frente aos problemas sociais; numa geração que está testando e se apropriando de recursos próprios desta geração.

#SPANISHREVOLUTION - Direitos autorais na era digital
Direto de "Copiad, malditos!", o cineasta Stéphane M. Gruesso destacou que os protestos sobre propriedade intelectual tiveram forte presença com o intuito de se criar a Lei Sinde, que pretendia criar regras para os direitos autorais na rede - a SOPA/PIPA deles. Além disso, ele falou que com um simples smartphone se tem a possibilidade de documentar a realidade.

O diretor da Campus Party, Mário Teza afirmou que a difusão via redes sociais ainda não é hegemônica e questiona qual seria o problema, em relação aos direitos autorais, com um mídia que pode difundir o material para mais pessoas em todo o planeta. A luta hoje é contra quem não quer que se compartilhe informações. Além disso, fez uma provocação: "se os clássicos da esquerda estivessem vivos, estariam aqui".

O realizador multimídia Rodrigo Savazoni disse que se acreditava que no Brasil se pudesse usar conteúdos alheios para a produção de novos conteúdos (mixagem), num tempo em que a propriedade intelectual é a grande questão do capitalismo atual, ao menos no campo simbólico. Porém, a mudança no comando do Ministério da Cultura mudou o paradigma de vanguarda que o país tinha nesta questão, criando um retrocesso inimaginável. Savazoni questiona o porquê da mudança de paradigma.

Por fim, o secretário-adjunto da Cultura Jéferson Asumção fez uma apresentação contando a mudança de paradigma no entender a cultura, entendendo o compartilhamento como uma das fontes para o estabelecimento de novas diretrizes sobre o copyright. Com isso, apresentou a Política de Cultura Digital RS, cujas bases são a cidadania digital, a Economia da Cultura e a Estática.

CONEXÕES GLOBAIS 2.0
Para encerrar, não deixar de dizer o quanto o evento foi bem feito, com a necessária articulação com o Fórum Social Temático, e com várias possibilidades de conscientização e capacitação sobre um assunto tão importante para os dias atuais, com importante diálogo com problemas sociais que não esmoreceram e que ainda necessitam de lutas e mais lutas para um avanço real da sociedade.

Dentre tantos outros pontos positivos, a possibilidade de acesso praticamente ininterrupto do evento pela internet - quase 100%, já que faltou energia por alguns minutos na quinta-feira -, com direito à instalação definitiva de uma rede de acesso a banda larga num espaço cultural tão importante/fundamental quanto a Casa de Cultura Mário Quintana.

Além disso, até mesmo as escolhas artísticas forma muito bem feitas, trazendo músicos que defendem a causa da liberdade de informação na rede, como foi o caso do espetacular show de sexta-feira com o Anitelli Trio, com participação do Leoni, que teve claras defesas dos artistas para a liberdade na rede, negando a alcunha de piratas para quem baixa música/vídeos na Internet. Além disso, Anitelli fez questão de criticar a nossa principal mídia, cantando "Xanel 5", que vocês podem ouvir abaixo (em sua apresentação pelo O Teatro Mágico).

Parabéns a tod@s que construíram e compartilharam deste evento ao longo desses quatro dias!


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