terça-feira, 22 de janeiro de 2013

Inovação e segmentação na Copa do Nordeste

Campeonato regional de futebol de maior sucesso no início deste século, a Copa do Nordeste retorna em 2013 após quase uma década de briga judicial com a Confederação Brasileira de Futebol (CBF) e a Rede Globo de Televisão, que romperam em 2003 o contrato com a liga responsável pelo torneio. Para além da volta de um torneio que deve incentivar o futebol de sete estados do Nordeste, ele representa também uma aposta de uma TV voltada aos esportes.

Criada em 1999 pela Top Sports, não à toa a TV Esporte Interativo passou a trazer como lema “Nordestino de coração”. Acompanhando os clubes da região em suas mídias desde a segunda metade do ano passado, quando estava confirmada a volta do Nordestão, desta vez com o aval da CBF – em 2003 e 2010, esta já com a transmissão do canal, foram realizadas edições esvaziadas pelos principais clubes da região –, o EI adquiriu todos os direitos de mídia, exceto os radiofônicos, e de propaganda em todos os estádios por 10 anos.

Além de se tratar de um canal segmentado para a transmissão de torneios esportivos, cerca de 700 por ano são exibidos, o Esporte Interativo tem um histórico de pioneirismo na utilização de outras ferramentas para transmitir os campeonatos. Foi a primeira no mundo a usar o Facebook para streaming de um evento ao vivo, é o canal de TV brasileiro mais visto no Youtube, com mais seguidores no Facebook e desde o ano passado tem o EI+Plus, serviço de venda do canal de forma individual pela internet (ver, nesteObservatório, “As mudanças da transmissão televisiva“).

Inclusão no pacote das TVs fechadas*

Para a Copa do Nordeste, a principal aposta é voltada para a denominada “segunda tela”, especialmente com aplicativos para as plataformas móveis, em iPhones, iPads e as que utilizam o Android. O aplicativo do torneio permite ao consumidor uma câmera exclusiva de cada partida, estatísticas e dados atualizados no decorrer dos jogos e a promessa de num canal chamado “Torcidômetro” ouvir a torcida de determinado clube dentro do estádio.

A rede Esporte Interativo pretende transmitir todas as 62 partidas do torneio, realizado do dia 20 de janeiro ao dia 17 de março. Para isso, a emissora conta com transmissões diferentes para a TV, a transmissão via parabólica e o novo canal Esporte Interativo Nordeste. Este pode ser adquirido pelos consumidores da Claro TV, da TCM e da Cabo Telecom, as duas últimas, distribuidoras do Rio Grande do Norte, sem qualquer pagamento extra, apesar de funcionar como se fosse o pay-per-view dos torneios nacionais com os direitos adquiridos pelas Organizações Globo.

Até o início do torneio, o Esporte Interativo aumentou a campanha para que os seus espectadores ligassem para as programadoras de TV fechada para que elas incluíssem o canal no pacote ofertado. Ainda que de forma menos agressiva, um movimento parecido com o realizado pelo Fox Sports no ano passado. Com um produto menos “vistoso”, ao menos por enquanto, o canal só foi incluído, de forma nacional, na Claro TV.

Telas “paralelas”

Para além disso, o EI contratou repórteres, comentaristas e narradores de Pernambuco, da Bahia e do Ceará para trabalhar em algumas partidas, de forma a garantir o sotaque local de transmissão. Neste caso, procura-se desenvolver um padrão tecno-estético para se alcançar um público específico, regionalizado, de forma a atingir uma camada de torcedores que acaba não sendo o foco dos grandes grupos comunicacionais. Assumidamente, como o novo lema do canal já expõe, pretende-se ser o canal de esportes dos nordestinos, que passariam a conhecê-lo e voltaria para acompanhar outros programas.

Esta tentativa de estratégia de regionalização não é nova na TV brasileira. No início da década de 1980, Walter Clark, um dos responsáveis pela formatação do “Padrão Globo de Qualidade”, foi contratado para dirigir a Band e um dos seus intuitos era a produção de programas que mostrassem outras regiões do país, fugindo do eixo Rio-São Paulo. Por vários problemas, que exigiriam discussões que não são objeto deste texto, a proposta para a emissora não foi adiante. Porém, com o sucesso de “Pantanal” na TV Manchete, anos depois, mesmo a Rede Globo adaptou o seu padrão tecno-estético e, ainda que de forma bastante tímida, passou a contratar diretores e produtores de outros Estados brasileiros para a produção de ficção audiovisual, casos de Guel Arraes e Jorge Furtado.

No que tange à estratégia de segmentação, além de se tratar de um canal voltado aos esportes e que não possui uma abrangência nacional por ainda não ser transmitido em VHF em TV aberta, esta proposta é reflexo de um movimento que se refere à própria evolução da venda de conteúdo audiovisual, a partir da década de 1990 no Brasil. Reflexo este de uma mudança da conjuntura político-econômica mundial, com o neoliberalismo abrindo mais e novos mercados para entes privados. Assim, há uma maior oferta de bens culturais através das mais diversas novas formas de transmissão do audiovisual. Além de contar com as mudanças no que se entendia como televisão, agora com a preocupação em gerar mais informações através de telas “paralelas”, que garantem mais informações e tendem a garantir mais recursos para o emissor.

Agora, a Copa Norte

No caso do Esporte Interativo, há de se acrescentar que é um canal nascido com a proposta de parcerias com outros grupos comunicacionais. No início, a compra dos direitos de transmissão de campeonatos europeus fez com que a Top Sports assinasse parcerias com canais de TV aberta, casos da Band, da TV Cultura e da Rede TV! Ainda que com emissora própria, cuja rede já comporta dez emissoras em UHF e tem um grande público que sinaliza o canal por antenas parabólicas, os direitos da Copa do Nordeste foram repassados para as afiliadas da Rede Globo nos Estados da região, de forma que se pode transmitir até três jogos por rodada – padrão de transmissão do Brasileiro e do principal canal do Esporte Interativo para este torneio.

Em outubro do ano passado, foi oficializada uma parceria com um gigante das telecomunicações, o Yahoo! O intuito era a unificação das redações que produziam conteúdos para a editoria de esportes do site no Brasil e do site do EI, sem vínculo com a produção de conteúdo para a TV. Assim, houve a união das ofertas para plataformas móveis e produtos online (redes sociais, sites e aplicativos) de maneira que o novo canal se torne vice-líder em mídia digital no Brasil antes da Copa do Mundo de 2014. O Globoesporte.com liderava com 22 milhões de visitas únicas, enquanto o Yahoo! ocupava o quinto lugar no Brasil com 4,1 milhões e o Esporte Interativo só possuía 500 mil visitantes únicos. No caso da multinacional, reflete o intuito de expandir os negócios de produção de informação, algo já verificado com parceria semelhante assinada com o Eurosport na Europa, em 2008.

Enquanto os torcedores nordestinos esperam que o sucesso de outrora retorne ao torneio, garantindo, no mínimo, a aposta do Esporte Interativo de sua repetição por 10 anos, a emissora espera dar um salto importante enquanto exibidora de eventos esportivos. Neste sentido, inclusive, já sinaliza com a pretensão de retomar a Copa Norte, envolvendo os clubes da região Norte do país, mais Maranhão e Piauí, em situação muito pior quando comparados aos times nordestinos.


[Texto originalmente publicado no Observatório da Imprensa.]

*Texto que pode explicar a recusa de algumas empresas em fechar com o Esporte Interativo, também publicado no OI: Interesses escusos e transmissão exclusiva. 

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