domingo, 6 de janeiro de 2013

Documentários musicais para ouvir e aprender

Imagina só poder conhecer a história de um grande músico através de um documentário permeado de músicas, com comentários de especialistas em música, cujo foco de pesquisa é determinado cantor, cantora ou compositor, e isso com toda uma contextualização em termos de história do Brasil e história da própria música. Você vai me dizer que há vários documentários cinematográficos por aí que fazem isso, alguns dos quais eu já comentei neste espaço. Mas e só em áudio?

Eu trabalhei em rádio e estudo televisão e posso dizer que se para a produção jornalística é mais difícil construir uma história que as imagens se encadeiem com os textos - assim como em qualquer outra produção audiovisual -, o texto especial em rádio precisa chamar a atenção, fazer com que o ouvinte desenhe aquela história na sua cabeça.

O rádio evoluiu e muitos dos formatos que exigem mais da imaginação acabaram ficando perdidos no tempo, com jornalismo direto ou só músicas sendo as responsáveis pela distração. Ah, é claro, ainda tem o futebol para estimular imaginações, apesar do aumento da presença das TVs pagas. Por isso que a iniciativa que me fez ter vontade de destacar é muito importante.

Não lembro exatamente quando, mas li no site do jornal Gazeta de Alagoas uma matéria publicada no Caderno B sobre um especial que o Instituto Moreira Salles fizera sobre Jorge Ben (Jor). Sem link, por se tratar de reprodução de um texto do impresso, rapidamente procurei e achei na internet a página com o documentário "Imbatível ao extremo: assim é Jorge Ben Jor!", com roteiro, apresentação e edição de Paulo da Costa e Silva. Esta última com Filipe Di Castro, que também faz a sonorização.

Ouvi em partes, por conta do tamanho, mas gostei da forma que foi produzido: prólogo, Capítulo 1 – Um novo esquema; Capítulo 2 – Bidu; Capítulo 3 – Charles, irmão de cor; Capítulo 4 – Ecos do Oriente; Capítulo 5 – O império do ritmo; Capítulo 6 – Mitologia negra; Capítulo 7 – Futebol; Capítulo 8 – Imaginário; Capítulo 9 – Gil e Jorge; Capítulo 10 – Alquimia sonora. O programa é costurado com músicas, comentários do narrador e de convidados do nível de, dentre outros, Caetano Veloso, Gilberto Gil, Jorge Mautner, Luiz Tatit, Tárik de Souza e Zico.


Olhei mais um pouco da Rádio Batuta, que contém estas séries, e achei "Sabiás, pardocas e feitiçarias", sobre Noel Rosa - cujo filme sobre ele comentamos ontem. Em mais oito partes (Capítulo 1 – Viver como poeta, Capítulo 2 – Samba da Cidade Nova, Capítulo 3 – Samba do Estácio, Capítulo 4 – O pulo do gato
Capítulo 5 – O primeiro moderno, Capítulo 6 – Feitiço decente, Capítulo 7 – Todos os sambas num só e
Capítulo 8 – O poeta e o filósofo), conhecemos a história de Noel, do samba e da produção de música naquele momento importantíssimo para o samba na era Vargas.


Com pesquisa, entrevistas, texto, supervisão e apresentação de Francisco Bosco, sonorização de Filipe de Castro e edição dos dois citados com Carla Paes Leme, temos outra aula de história, de música e de samba, com comentários de, dentre outros, Caetano Veloso, João Máximo e Sérgio Cabral.

Andei mais um pouco e cheguei na primeira das séries produzidas - ou, ao menos, disponibilizada. "Tim Tim por Tim Tim: a música de João Gilberto" apresenta a voz, com seu violão, que apresentou a primeira mudança no que vinha sendo tocado a partir da segunda metade do século XX: a bossa nova. Além de ser João Gilberto uma figura ímpar e controversa até hoje, após seus 80 anos.

Dentre os entrevistas, estão José Miguel Wisnik, Luiz Tatit, Roberto Menescal e Ruy Castro. Uma produção e roteiro de Francisco Bosco e Paulo da Costa e Silva, que edita com Filipe Di Castro, responsável pela sonorização, mas apresentado pelo músico Romulo Froes - cujas músicas escutei neste domingo.


COM LUIZ GONZAGA, O SERTÃO BATEU ASAS E VOOU
Hoje voltei ao site da Rádio Batuta e encontrei a mais nova série: "Luiz Gonzaga: o sertão é ele!". Produzido em homenagem ao rei do baião, acabei por escutar por completo as cerca de duas horas de apresentações, comentários e músicas, cada qual com sua contextualização de período histórico, de diferenciação da letra e melodia produzida por Gonzaga e da cultura de um Nordeste que se mostra ao Brasil rico.

Admiro a produção e o texto do IMS ao apresentar a constituição musical que diferencia cada músico que é descrito em relação ao que era produzido até então. Podemos ouvir, assim, o quanto Gonzaga transforma a forma de tocar a sua sanfona e, inclusive, na prática de um dos comentaristas, como seria tocada determinada música no ritmo do samba-canção e no ritmo do representante de Exu-PE.

Inspirado por Pedro Raimundo, um gaúcho que cantava a música da sua terra vestido como na sua terra, Gonzagão resove tomar coragem e usar gibão de couro, a sandália e a cartucheira. Momento arriscado, afinal Lampião havia sido morto em 1938 e na década seguinte ele entrava nas rádios da capital Rio de Janeiro para "afrontá-los" com um fora da lei que deu muito trabalho.

Conhecia a história também como uma forma de a cultura do eixo Rio-São Paulo se apropriar das identidades de outros locais de maneira a se atingir a tal integração nacional através da cultura, que Vargas já tenta com a profissionalização do futebol e a estatização dos desfiles das escolas de samba na década de 1930 - com tentativa de se fazer isso com a capoeira.

Enfim, fato é que o documentário apresenta algumas das histórias que já conhecemos por conta do filme "Gonzagão - de pai para filho", mas amplifica o potencial de Gonzaga para a representação nordestina contando a sua história, a história dos dois Nordestes (o do litoral e o do sertão), a história do Brasil e a história da nossa música.

Esta série é apresentada por Clarisse Pinheiro (e um sotaque nordestino?), com roteiro e produção de Paula Scarpin e Paulo da Costa e Silva, que editam com Filipe Di Castro (aqui também responsável pela sonorização), e cometários de Bráulio Tavares, Bené Fonteles, Carlos Sandroni, Dominguinhos, Dominique Dreyfus e Marcelo Caldi.

Como terminei o texto de ontem em relação ao samba, quem gosta de música brasileira deve passar pela Rádio Batuta e conferir as séries rapidamente descritas neste texto. Vale muito a pena conferir esse excelente trabalho que confirma o potencial criativo de produções sonoras.

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