quinta-feira, 17 de outubro de 2013

E se em 1938...

1938, a Europa vive um clima politicamente pesado. Se a preocupação de países capitalistas era com o avanço do "ideal" soviético (stalinista) que se espalhava, o nazi-fascismo crescia sob as suas barbas. A Copa do Mundo a ser realizada na França seria a última antes de uma lacuna causada pelos desastres da Segunda Guerra Mundial.

A seleção italiana era a maior prova que o clima já estava tenso. Com a permanência de apenas dois jogadores da campanha da Copa anterior, os atacantes Giuseppe Meazza e Ferrari, e o técnico Vittorio Pozzo. Azzurra foi vaiada em todas as partidas pela torcida francesa, o que deve ter sido ainda maior na quarta-de-final contra os donos da casa, quando jogaram de preto, cor símbolo do fascismo.

Já a Alemanha jogou com o reforço de jogadores austríacos, cujo território havia sido incorporado pelo Reich de Hitler, num processo que foi chamado de "Aunschluss". Não adiantou muito, já que a Alemanha foi eliminada ainda na primeira fase, no jogo desempate contra a Suíça. Mesmo assim, a "decisão" entrou para a história, já que a Áustria é o único país que, classificada para o torneio, não foi. A Suécia ganhou a partida por W.O.

Ainda assim, deu tempo para esta imagem na partida da eliminação alemã...
Após uma péssima campanha no Mundial anterior, o futebol brasileiro acabou com as brigas de direção e começou a mostrar que viria a ser multi-campeão do mundo, através de craques como o marcador Domingos da Guia (pai do ídolo palmeirense Ademir da Guia) e o diamante negro Leônidas da Silva.

O primeiro mundial de futebol transmitido pelo rádio para o Brasil, através da Rádio Club do Brasil, a PRA-3, teve de tudo: gol descalço, vaias aos italianos, goleiro que quebrou partes do corpo num jogo, artilheiros numa partida, W.O., zebra...

* Antes de ir a 1938, aquela velha notinha: os textos da série E Se... não tem nenhuma intenção de se tornar referência histórica, ou seja, não adianta comentar, como fizeram no outro espaço, que eu estava errado. Eu não só sei disso, como afirmo que a intenção é esta. Sejamos criativos, amig@s! Como disse no primeiro texto, a coluna E se... não chegou para mudar a história do futebol, mas para contar o seu principal evento de uma forma diferente. Assim, veja como a Argentina ganhou em 1930 e a Checoslováquia em 1934.

>> E SE EM 1938...
Foram 16 escolhidos num processo eliminatório que envolveu 36 seleções. Apenas 15 países, como vimos acima, disputaram a Copa do Mundo de 1938, que teve uma fórmula das mais simples: mata-mata até a final.

Os destaques das oitavas-de-final vieram do continente americano. Cuba, única representante da centro-América, classificou-se no jogo desempate contra a Romênia com um 2 a 1 - empate de 3 a 3 na primeira partida.

Já os do Sul, o Brasil, mostraram já no primeiro jogo que cada partida seria uma verdadeira batalha. Mesmo sofrendo quatro gols de Wilimowski - o homem que mais marcou contra o Brasil em Copas -, venceu a Polônia por incríveis 6 a 5!

Nesse jogo ainda houve um fato mais incrível ainda. Há uma "lenda", confirmada por seu protagonista, que Leônidas da Silva fez um gol descalço. Como estava chovendo bastante, a visibilidade era péssima e o bico da chuteira direita dele abriu, imediatamente o Diamante Negro jogou para o banco para lhe darem outra. Foi o tempo de uma bola sobrar para ele marcar o quarto gol do Brasil de forma irregular, já que faltava uma peça do vestuário.
O árbitro da partida foi o sueco Ivan Eklind, o mesmo da final entre Itália e Tchecoslováquia, na Copa anterior - e que fora expulso de seu país por beneficiar os donos da casa.

Mas a história do Brasil na Copa de 1938 não parou por aqui. Nas quartas-de-final, uma "batalha campal" contra a Tchecoslováquia a ponto de o jogo terminar empatado em 1 a 1. Além das duras entradas, num chute do botafoguense Perácio, o goleiro tcheco Planicka se chocou na trave e quebrou braço e clavícula. Na partida desempate, o Brasil venceu por 2 a 1.

Os jogos das semifinais eram Brasil X Itália, o confronto do fascismo e rigor técnico italiano/europeu contra a ginga da maioria negra brasileira, e Hungria X Suécia, que vinham de goleadas - 6 a 0 dos húngaros sobre as Índias Holandesas e a de 8 a 0 dos suecos sobre os cubanos.

Enquanto a Hungria venceu a Suécia com mais uma goleada, desta vez por 5 a 1, o confronto entre sul-americanos e brasileiros foi emocionante. Até que alguns jogadores brasileiros tentaram comemorar antes do jogo com muita champanhe, mas os líderes do grupo proibiram até a CBD de comprar as passagens de avião para o jogo da final. A Itália era a única seleção com jato particular.

Na dúvida se deveria poupar Leônidas da Silva para uma possível final, o técnico Ademar Pimenta resolveu escalar o homem que "inventou" a jogada da bicicleta. Pimenta só não esperava que em meio à pressão brasileira no segundo tempo, após um primeiro tempo sem gols, o zagueiro Domingos da Guia fizesse um pênalti estúpido num jogador italiano, que não tinha chances de arrematar - foi daí que surgiu o termo "domingada" para qualquer lance assim no futebol e que foi muito famoso naquelas décadas.

Quando a partida no Estádio Parque dos Príncipes - utilizado em seis partidas na Copa ocorrida na França 60 anos depois - ia se encaminhando para a vitória italiana, Romeu marcou aos 42 minutos do segundo tempo. O jogo ficava nervoso e a torcida francesa era toda do time vestido de branco - uma boa contraposição aos fascistas, numa curiosa oposição quando se leva em consideração os ideais puristas e a ideia que cresceria nas décadas seguintes no Brasil do mestiço como fundamental para o desenvolvimento do seu povo. Num cruzamento da esquerda, Leônidas da Silva deu um voleio espetacular para marcar o gol da classificação para a final.

Assim como ocorrera nos Jogos Olímpicos de Berlim, em 1936, um negro calou o xenofobismo europeu. Após tantas partidas difíceis, o Brasil partiria para a final com um moral incrível. Já a Hungria vinha de uma campanha com 13 gols a favor e apenas um contra, um futebol espetacular décadas antes da turma de Puskas e cia.

Uma curiosidade, o árbitro da final e da decisão de terceiro lugar foi o mesmo, o belga Langenus. A decisão começou com tudo. Logo aos 7 minutos, Pal Titkos marcou para os húngaros. Após bate-rebate na área, a bola sobrou livre para ele colocar os encarnados na frente.

Já no final do primeiro tempo veio o gol brasileiro. Aos 43 minutos, a zaga húngara falhou e Romeu recebeu bola cruzada da entrada da área para apenas empurrar ao gol. A população brasileira vibrava ouvindo a partida pelo rádio!

O homem que virou marca de chocolate - até hoje existente - e de cigarro, o artilheiro desta Copa, apareceu no segundo tempo. Aos 18, após uma jogadaça de Romeu, que limpou o zagueiro na grande área e tocou para Leônidas. O craque daquele Mundial virou o marcador para o Brasil!

Não contente com isso, aos 28, Leônidas recebeu bola num rápido contra-ataque da seleção brasileira, adentrou na área e tocou no canto do goleiro húngaro. Brasil 3 a 1 e as ruas do Brasil, naquele 19 de junho, já viviam um carnaval fora de época.

Mas como final de Copa do Mundo tem que ter muita emoção, ainda mais se tratando de um adversário de alto nível, como a Hungria, o resultado ficou novamente apertado. Foi a vez de Savosi, aos 35 minutos, receber passe no meio da área e dar chances ao seu país. 

No Brasil, a tensão só aumentava, todos querendo tanto dentro de campo, quanto no banco de reservas, e para os que ouviam com segundos de atraso no país, apenas uma coisa: o fim da partida. E ele veio antes do apito do árbitro.

Leônidas da Silva partiu para a ponta e confundiu a zaga húngara num contra-ataque surgido logo após o segundo gol adversário, aos 37 minutos. O Diamante Negro, autor de oito gols naquele mundial, não foi fominha e tocou para trás, para a chegada do "quebrabraço" Perácio marcar o tento que colocava de vez o nome do Brasil na história do futebol mundial.
BRASIL, CAMPEÃO DO MUNDO DE 1938!

Vídeo com gols da final "original"

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