segunda-feira, 8 de junho de 2009

Como "tratar" a música?

Apesar de não ser um expert em música, uma questão sempre povoou a minha cabeça através de conversas sobre o assunto, especialmente com quem a faz: como o “fazer música” deve ser tratado?

De um lado há a paixão pela boa música, que muitas vezes, devido à falta de condições financeiras, faz com que o artista não possa multiplicar seus ouvintes pois não tem como produzir e não atende a certos interesses da indústria da mídia. Do outro, há a possibilidade de se chegar à fama e ao sucesso, só que tocando ou cantando estilos que podem não o agradar.

O rap no Brasil passa por um momento de transição. Seguindo o exemplo do glamour e da fama dos rappers americanos, os brasileiros começam a “sair do movimento” para poder viver de música. As letras que até então traziam a realidade do subúrbio ou das prisões, começam a tocar romances ou a se misturar com estilos musicais mais populares.

O filme L.A.P.A. (Cavídeo/Virtual Filmes: 2008), codirigido por Cavi Borges e Emílio Domingos, busca mostrar a realidade de MCs brasileiros que tocam no famoso bairro da Lapa, no Rio de Janeiro; o quão difícil é se manter através da música, que tem que ser dividida com a carga horária de outros trabalhos e com o preconceito oriundo da própria família.

Esse é o caso de MC Chapadão, que durante a semana trabalha através de uma empresa de eletricidade terceirizada num dos campus da Universidade Federal do Rio de Janeiro. Enquanto que no final de semana atua com seus raps.

O documentário mostra a família dele, em que a mãe se destaca ao dizer que apoia tudo o que o filho faz, apesar dos parentes, sua maioria médica, tratarem com desdém a veia artística do rapaz, principalmente em relação ao estilo musical escolhido. Pai, mãe e irmã só criticam o nome artístico optado.

Já MC Funkero também trabalha em bailes funk e mistura as duas batidas sonoras e nos diz surpreso que já viu batalhas de funkeiros em bailes cariocas, apesar deles não saberem que o fazem. Funkero fala aliviado que depois de alguns anos de trabalho na área consegue se manter. Ele é o apresentador dos duelos de rap, algo que costumamos ver em filmes estadunidenses.

FESTA - Um dos pontos interessantes, só que pouco tem a ver com música, é o encontro entre MCs com o local que ocorria uma das maiores festas anuais da Lapa. O lugar que deveria ser um salão de festas foi substituído por uma das sucursais de uma igreja cristã protestante - como crescem!

Assim como o festival, todos os rappers contaram que o movimento na Lapa começou com cada um achando que era o único ali que fazia rap. Até que arranjava amizade com outro e este dizia que também fazia. E assim foi aumentando a quantidade de pessoas envolvidas, a ponto do local também ser uma referência nesse estilo musical.

O festival de rap acabou após poucas edições pela falta de patrocinadores e, como os organizadores disseram, pelo fato de “chegar alguém que achava ser amigo e não dá para cobrar dos chegados”. Assim o dinheiro não cobria as despesas.

CASO D2 - Logo no início do filme aparece um rapper que lança sua rima criticando Marcelo D2, pelo fato de esquecer o “movimento” e se vender à fama e ao dinheiro. O ex-integrante do Planet Hemp, entre as várias coisas que fala, admite que faz música sim para ganhar dinheiro, para a sobrevivência da família e critica quem acha errado: “Ficam falando que traí o movimento, mas nunca vi esse tal de movimento. É como se fosse algo superior”.

D2 também conta como se deu a formação da banda, só não fala das prisões seguidas que o grupo tinha por encontrarem drogas com os integrantes. Se bem que não é esse o tema do doc, que em momento algum toca no assunto.

O MC Black Alien é outro que entra no tema das músicas que falem sobre a realidade do subúrbio. Aparentemente em outro estado de espírito, o MC reclama dos brasileiros que querem imitar os rappers americanos no estilo de se vestir e de esbanjar dinheiro:

“Muitas vezes o cara não tem nem o que comer, mas anda com uma corrente de ouro no pescoço só porque vê o 50cent, ou o Snoopy Dog usando na televisão. Encontrei o 50cent em frente à loja da Virgin [de CDs e DVDs] em Nova Iorque há cinco anos atrás pedindo para que os caras ouvissem a demo dele. A gente tem que entender que as realidades são diferentes”.

Ao continuar sobre o assunto ele trata de um tema polêmico e pouco visto na mídia nacional quando da passagem dessas estrelas estadunidenses no Brasil: “E ainda tem mais, ficam puxando o saco desses caras aí e eles vem aqui para pegar nossas mulheres, inclusive menor de idade, muitas, e ninguém faz nada!”.

PERGUNTAS - Mais uma vez deixo perguntas para uma reflexão final. Mesmo para nós que tanto criticamos as formas de alienação cultural e que achamos que ali ninguém sabe tocar nada, será que não deveríamos olhar de forma menos preconceituosa para certas coisas? Será que o guitarrista de banda C, ou P não está tocando ali por causa do dinheiro, mas sabe tocar estilos musicais melhores?

E uma coisa que serve para todas as profissões: e no dia que lhe pedirem para fazer algo que vai de encontro ao que você acredita, mas você TEM que fazer para se manter no emprego? Com música, caso você não seja “achado” por um influente e bom produtor musical, a situação pode ser parecida.

Um comentário:

  1. Eu tenho minhas considerações à coisa do comercialismo das bandas e artistas musicais.
    Esse comercialismo passa mto pela discussão da indústria cultural.
    Nunca gostei de campanhas feitas por fãs de bandas do underground tipo: "Salvem o Nightwish do modismo!".
    É até egoísmo querer que a banda não estoure. Já ouvi gente dizer: "Ah! Virou sucesso, nem escuto mais." Sou só eu que acho isso frescura de quem escuta estilos "alternativos"?
    Acho hipocrisia a banda que fala que não quer ver as músicas tocando em rádio, que não gosta do sucesso.
    Só não gosta pq possivelmente nunca o atingiu.
    Não acho que grande execução pela mídia banaliza a mensagem da música.
    O que falta é educação musical e isso com certeza influencia para um mau gosto generalizado.
    E tem a relatividade do gosto musical de cada um.
    Isso é apenas a minha opinião. Porque o cara não pode fazer música comercial para colocar comida em casa?
    É tudo muito mais complexo quando o cara vem da periferia. Gosto do rap, não gosto do funk.
    Mas isso não quer dizer que não sejam legítimas as tentativas de sair de uma situação miserável, como nas favelas do país.
    Se fosse fácil fazer música comercial, todo mundo faria sucesso.
    É isso. E respondendo a primeira das perguntas feitas, já ouvi muita gente que conhece músicos dizer. "O cara toca uma guitarra da porra, mas está no Gatinha manhosa por falta de valorização ao rock regional".
    E aí, o q fazer? Desempregado tocando rock'n'roll na garagem é lasca tb.

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