quinta-feira, 13 de janeiro de 2011

Mestre Graça na terra dos meninos pelados


Já li alguns livros escritos por Graciliano Ramos, já vi filmes baseados em algumas de suas principais obras, já vi um monólogo baseado num dos seus contos e vi alguns episódios de uma série cujo ponto de partido é um dos seus trabalhos. E ainda falta muito a ler do autor nascido na cidade alagoana de Quebrangulo e o nosso maior expoente das letras. Nos últimos dias, já li dois outros livros, e o que destaco hoje é o de um ramo que não estamos acostumados: o infanto-juvenil A terra dos meninos pelados.

O que se esperar de um autor que fez parte da geração regionalista do modernismo brasileiro, a partir da década de 1930, que sempre destacou e refletiu, inclusive na sua linguagem, a dureza e rispidez da região do semi-árido nordestino, num local com ainda mais dificuldades como Alagoas, quando o mesmo resolve escrever literatura infanto-juvenil? 

Com A terra dos meninos pelados, Graciliano ganhou em 1937 o prêmio de literatura infanto-juvenil do Ministéio da Comunicação.

Este livro representa uma viagem através da imaginação muito fértil de Raimundo Pelado, "um menino diferente dos outros meninos: tinha o olho direito preto, o esquerdo azul e a cabeça pelada".

Como os vizinhos mangavam dele, ficava a desenhar nas ruas e calçadas coisas do país de Tatipirun, onde todos são crianças que não têm cabelos e têm um olho azul e outro preto, fora as características geográficas inigualáveis. 

Num dia, após escutar as zombarias tradicionais, ele foi atraído por algo. Atravessou a rua, foi para trás da casa e descobriu ainda mais: um monte que baixava e se aplanava para que pudesse andar sem esforço, uma laranjeira que saía do caminho e falava, um carro com um olho preto e outro azul, o Rio das Sete Cabeças que se junta para atravessá-lo num pulo só,...

Raimundo conhece crianças que não crescem, num lugar que o Sol nunca descansa e ninguém fica doente. Todas elas têm as cabeças peladas e um olho preto e o outro azul, assim como ele. Mas cada um apresentava outras características físicas que os diferenciava, como o anãozinho e o ruivo, que queria pintar pintinhas em todo mundo.

Além deles, o destaque é a "vossa princesência", a princesa Caralâmpia, que aparace e desaparece e nunca foi coroada princesa porque não há reinado, nem principado. Raimundo acha estranho ela ainda com bichos no corpo: um broche de vagalume no peito e pulseiras de cobras de coral nos braços. Tudo diferente do seu mundo, onde a maioria dos bichos, especialmente as cobras, é perigoso.

Ele escutou histórias, quer dizer, até onde podiam contar a história do menino que virara mosquito... Viu a importância das diferenças e do tratamento de pessoas que respeitam isso, mas ele tinha que voltar. Havia uma lição de geografia a fazer e, quem sabe, depois não voltaria com o seu gato medroso e ainda sem nome. Eles iriam gostar dele.

Em A terra dos meninos pelados, Graciliano exacerba em criatividade para mostrar de maneira exagerada que as diferenças precisam existir e ser respeitadas. "Mestre Graça" deixa sua contribuição em mais um setor literário. Pode ser até estranho, quando comparado a outras obras, mas criatividade não lhe falta para criar Raimundo e recriar um mundo de meninos carecas, com um olho azul e outro preto com várias características geográficas que mais facilitam do que atrapalham a vida. Um país com o curioso nome de Tatipirun.


Referência Bibliográfica:
RAMOS, Graciliano. A terra dos meninos pelados. 40. ed. São Paulo: Record, 2010.

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