sexta-feira, 28 de março de 2014

Um ano e nada de clarão azulado


Pouco mais de 30 dias decorridos e era o domingo dos principais jogos do ano até ali. Importantes por conta do meu sentimento particular de rivalidade. De um lado, o arquirrival de toda uma vida, a pedra que apareceu várias vezes no meu caminho e que parece que nunca tardará a desaparecer. Do outro, um ódio que vem dos meus primeiros jogos em Maceió.

Palmeiras X Corinthians e CSA X Sport num mesmo dia. E eu me dividindo assistindo a um jogo pela transmissão da TV local e ao outro pelo rádio, algo que me acostumei a fazer desde criança (dividir rádio num jogo e TV noutro). Não.

Trabalho em pleno domingo à tarde. Ao menos uma TV ligada na partida do local. Dava para passar por ela e dar uma olhada, passar alguns segundo em frente. Torcer calado. Enquanto isso, a cabeça se preocupava na manutenção da invencibilidade num lugar bem mais distante.

Mas não demorou muito para a única fonte de informação ser desligada. Não adiantava nada. Só restava esperar. Resposta irônica de um torcedor local rival e a "vitória por 0 a 2" deixava ainda mais preocupado. É que até ali, por incrível que pareça, o CSA sempre vencera sob meus olhos e/ou ouvidos na Copa do Nordeste. Sem meus olhos e ouvidos, nada feito.

Do outro lado, restou perguntar a um torcedor com a camisa do arquirrival, resposta triste de 1 a 1, mas informações sobre como tinha sido a partida só chegando em casa - e cheguem mais junto do Romarinho logo na primeira jogada no próximo clássico!

Após tentativa de contato com o máximo de pessoas da área que conhecia por aqui e só ter uma resposta, de distribuir currículos por vários locais, esperei. E que espera difícil. Apertar os cintos de uma maneira drástica ao menos para garantir recursos suficientes para chegar ao final do ano. Algo que não via parecido há praticamente 10 anos, quando os problemas na família chegavam a um ápice que quase faltava dinheiro para passagem para ir estudar e quase faltava dinheiro para o mais básico.

É bem verdade que recebi ajuda de parentes e familiares, mas odeio isso. Ainda mais sabendo o tanto que ralei para não precisar disso. Não sei realmente se as pessoas que me conheceram já perceberam efetivamente isso, mas acho até que é óbvio. Prefiro milhões de vezes ajudar as pessoas que ser ajudado, mesmo que numa coisa de menor proporção.

Mais de um mês passado e nada de respostas, nada de contatos. Resolvi seguir em frente no tempo que faltava. Comuniquei a quem na área acadêmica tinha alguma atividade para informar que estava me afastando por questões de sobrevivência. Respondi a duas pessoas que neste período eu teria de esquecer as formações acadêmicas e partir para coisas muito menores.

Por coisas assim que nunca "cuspi para o alto" para dizer coisas como preferir vender água de coco na praia que trabalhar em determinadas empresas de comunicação. Nem todo estudante de Jornalismo vem de uma família de classe média, classe média alta, apesar de estatísticas e comportamentos indicarem isso.

Lá fui eu, arrastando ego, engolindo o orgulho. Na primeira tentativa, em meio a livros, a chateação desde o primeiro dia. Não daria certo. E as duas semanas indicaram o porquê. Promessas não cumpridas e algumas mudanças de opinião sobre contratar ou não. Só no último dia uma resposta negativa travestida de proposta (totalmente recusável) para pegar algo parado e colocá-lo para andar. Jamais!

Foram duas semanas aturando arrogância, mentiras aos montes para enganar clientes e um fumador inveterado que me gerou uma gripe no final. E eu lá carregando um monte de coisas, aturando conversas cansativas inclusive de outras pessoas e torcendo para acabar logo, por mais que a necessidade me indicasse, ao menos, dois meses de paciência. Nem as duas semanas a mais inicialmente acordadas. Pouco dinheiro recebido e tempo perdido

Esperei mais uma semana depois, mais tentativas de contatos e nada de respostas. Num caso, a promessa de que talvez pudesse haver algo, numa faculdade local. Restava esperar ainda que o tempo não fosse meu amigo naquele momento. Hora de optar por outra coisa que não gosto, que é indicação de parentes e foram duas.

Numa, correria para saber que teria que chegar num determinado local às 13h sabendo disso ao meio-dia. Correria e chegar a tempo. "Está pronto para começar hoje?". Na cabeça, um não, já que não tinha comido nada ainda. Mas a necessidade respondeu que sim. Saí para almoçar horas depois, saí dali às 9 da noite.

Chegando em casa, proposta por e-mail para uma velha tarefa, mas para um dia. Com palavra acordada por um mês no outro - e este, sim, sem preocupação com possível mau caratismo. Não dava, por mais que fosse tentar empurrar a folga para os sábados. Nada. Contato um turno antes e eu teria topado já que me seguraria, ao menos, por dois ou três meses. Além de poder não continuar nos cursos de língua que tinha reiniciado e poupar um pouco mais.

O quadrinho da Mônica publicado no texto de ontem explica tudo.

Outro contato de parente me empurrou para um período de testes, acompanhamento ou seja lá o que tenha sido, num grande meio de comunicação local. Não tinha confiança alguma naquilo por conhecer como as coisas funcionam na área. Mas, fresta de janela aperta, de repente abririam uma porta. Sabe-se lá. Além disso, não havia nada mais à frente.

Ainda tentei um acordo com o trabalho anterior, mas vários ruídos se colocaram na comunicação. Enquanto isso, acordava às 4 da manhã, trabalhava de 6h às 14h30. Corria para chegar no outro o quanto antes. Super cansado. Um verdadeiro zumbi. O cérebro só entrava em ação duas horas depois. Não tinha como exigir. Ambiente estranho, mas nada longe do que se imaginava. Pouquíssima força para apostar naquilo.

Passaram-se semanas assim. Acho que mais uma perda de tempo. Enquanto isso, a saúde apresentava o saldo dela. Mais um resfriado logo no início de dezembro e coisa bem pior para o ano seguinte.

Mas antes de adentrar em 2014, uma possibilidade de teste para dar aula. Não eram bem as disciplinas que me sinto apto, mas era uma janela se abrindo. Falta de tempo para preparação adequada e uma das minhas piores apresentações da vida acadêmica. Chateação-mor por não ter tido um bom desempenho. Dia seguinte, notícia de que o professor que sairia do curso desistira disso. #coisasquesóacontecemcomigo


De domingo a domingo, com uma folga no meio disso, só que em data mais incerta que sorteio de Mega e o dia inteiro de segunda a sexta. Cansaço até a unha. Dores em tudo que é lugar e a percepção de que tudo sempre pode piorar ainda mais.

A carteira foi assinada rapidamente. Mas num lugar que nunca imaginei trabalhar, nem nos meus piores pesadelos, por conhecer as dificuldade do trabalhador do pior tipo de profissão para serviço no capitalismo contemporâneo brasileiro. Sem feriado, com direitos trabalhistas esquecidos e cobranças ao extremo e várias contradições em meio a hierarquias esquisitas. Uns trabalhando demais e outros de menos para um chefe só preocupado em ganhar mais dinheiro, independente do que fosse necessário para isso.

A frustração pesava ainda mais. Mudei de área no voluntário e passei a aprender mais. Descobria uma área que me interessava num meio que, por mais que sempre o tenha estudado, nunca trabalhei para valer. Ainda assim, o meu jeito de ser, mais de fazer do que de falar, foi fundamental para não andar mais. Faltava proatividade, faltava que notassem que era graduado e não mais um estagiário.

Mudou um pouco quando já não esperava. Podia voltar para casa, tirar um cochilo, quer dizer, dois. Um no ônibus, com direito a ser acordado por colega de trabalho com medo de eu passar do ponto e por uma senhora com medo de eu cair no ônibus. O outro, em casa. Dali em diante era das 6h às 22h. Tempo para quê?

Já tinha largado quase tudo o que gosto de fazer. Só não abandonei o Campeonato Alagoano porque sempre vinham notícias deste para editar e era preciso, ao menos, mostrar que em meio a tantos jornalistas que olham meio torto para o futebol, havia ali alguém que entendia do assunto. Fora isso, até o Palmeiras, que é uma marca da minha vida, eu não pude acompanhar.

É verdade que o CSA eu ainda pude ver em dois jogos em janeiro. Não foram quaisquer jogos, mas dois dos mais impressionantes que já ocorreram aqui em Maceió. 4 a 1 no Bahia, com direito a olé no intervalo pela estreia da Copa do Nordeste - acrescido de um "só vejo o Bayern à minha frente para este time" na arquibancada. E o mais sensacional dos sensacionais. A vitória por 2 a 1 sobre o Conquista e o show da torcida até uns 30 minutos depois da partida.

Ainda tentarei escrever sobre aquele dia. Tive uma crise de garganta logo no início do ano, no segundo dia. Imunidade baixa por faltar tempo até de beber água no trabalho da manhã e muito contato com várias coisas que tenho alergia. Bastou uma arrumação de livros no primeiro dia do ano para no segundo acordar com a cabeça fora do corpo.

Nunca havia sentido algo parecido. Não havia catarro, não era resfriado, não era gripe. Era uma reação alérgica. A garganta que doía um pouco foi piorando e só quatro ou cinco dias depois é que vieram as secreções. Até aí, dias de ir zonzo ao trabalho, a ponto de não conseguir ficar em pé. Como não sou de reclamar, tinha de até limpar coisas nojentas para alguns e que ampliavam a minha alergia.

Logo em seguida tive outro problema de garganta. Do mesmo jeito, a mesma dor e a mesma sensação. Desta vez, um pouco provocado. Precisava ir ao Rei Pelé. Necessidade psicológica mesmo. Fui e o CSA me brindou com um 4 a 1. Gritei como nunca na vida. Fiquei rouco até o dia seguinte. A garganta parecia que aguentaria, mas deu o recado dias depois. Nova crise. Duas em 21 duas do ano, quando estou acostumado a ter problemas, com gripe, duas vezes nos 365 ou 366 dias!

A partida contra o Conquista foi depois desta segunda. Ainda estava me recuperando e jogaram a partida para iniciar às 20h30 de um domingo, sendo que eu trabalhei naquele domingo até às 16h20 e teria de estar 6h no dia seguinte de novo no trabalho. Fui porque era o jogo da classificação e porque se era para ficar doente que fosse por algo bom, não por trabalhos desgastantes e cujo reconhecimento passa longe. Repito, o que importa para o burguês era explorar o operário e aumentar sua mais valia. Posso dizer que entendo na prática a teoria marxiana.

Segurei-me o quanto pude (o primeiro tempo) para não gritar. Mas o segundo tempo foi tão espetacular que não tinha como. Enfim, em outro texto, que espero ter tempo para escrever conto isso melhor.


Em fevereiro, retornaram as aulas de Espanhol e Francês. A minha torcida era que não me perguntassem o que eu era. Eu sabia só o que eu não era e tinha vergonha disso, do local em que tinha ido parar. Escutar coisas como "ele estudou tanto e está aqui trabalhando pra caramba, enquanto o fulano não faz nada" não me animava em nada. Ou coisas como "o que você está fazendo aqui" quando aparecia alguém que tinha noção do que era ao menos uma graduação. O que dizer da única pessoa, cliente, quando soube que eu era mestre? "Eu só sou especialista e você trabalhando nisso aqui?".

A paciência com as contradições de trabalho estavam a mil. Cheguei a trabalhar 17 dias seguidos por conta de uma falta por estar doente, enquanto outro ficou 8 dias sem trabalhar e só foi mandado embora porque praticamente implorou para isso, ainda que todos soubessem que esse outro não trabalhava nada. Mas eu não tinha nada.

No voluntário, passei a editar mais e, ao menos, aprender muito mais do que é um jornalista crítica num grande meio. Existe, pode acreditar, pessoas que trabalham além da técnica. Além disso, pude ver o resultado do meu trabalho para um grupo de pessoas maior e, especialmente, trabalhar com futebol, que foi o grande motivo para eu querer ser jornalista desde criança. Era muito bom, mas, como sempre, não consegui aparecer o suficiente para ter chances remuneradas. O que era um mês durou três, mas saí em busca de tempo.

No de manhã, cheguei a ter a explicar o que era mais valia ao tentar demonstrar que era possível que todos trabalhassem menos se todos trabalhassem. E ainda estimulei - e estimulo - que os meus colegas não aceitem fazer o que não são pagos a fazer. Desvio de função não pode ocorrer. Mas o medo se sobrepõe e as pessoas preferem falar mal uma das outras que se unir por mais direitos... Já reclamei disso numa das situações, mas não sei se vai adiantar.


Tinha planejado sair em fevereiro, caso tivesse passado na seleção para professor, ou em junho, por conta do período mínimo necessário para o seguro desemprego. Nem uma coisa nem outra. Após uma semana em que o corpo não queria se erguer da cama e mais uma situação em que senti vergonha do que eu não me tornei, resolvi sair.

Em fevereiro, tive uma terceira crise de garganta - foram 3 em 45 dias. No primeiro trabalho do dia, vi o mundo girar e estava sozinho naquela atividade, sem poder sair. Trabalhei o período inteiro e os outros dias, o final de semana,... Sem reclamar.

Além disso, vi em cima da hora dois concursos para professor por aqui e sei o quanto chego cansado para ter tempo e paciência para estudar. O quanto trabalhar ali não só não estava servindo em termos financeiros - afinal mal chega a um salário mínimo com os descontos - como estava me esgotando física e mentalmente.

Quantas vezes, com reclamação de cliente, ou falta de educação de colegas não me vi pensando o que estava fazendo ali. Afinal, não faz tanto tempo que escutei da banca de defesa de mestrado que o meu trabalho estava acima do que normalmente era visto. E tinha ralado tanto, sempre buscando oferecer 200% às minhas múltiplas atividades era para ter algo que eu gostasse de fazer.

Resolvei sair sem ter nada certo. Maluquice? Talvez. Mas se é para morrer, que seja passando os últimos meses fazendo minimamente o que gosto. Para se ter uma ideia, no ano passado li uma média de 3 livros por mês. De novembro para cá só li dois. E os textos por este blog? Quase nenhum. Não vale a pena.

Consegui ser aluno especial num doutorado por aqui, mesmo sem saber se a AD voltará ao meu horizonte como proposta de estudo, mas, como disse no primeiro dia de aula, é um recomeço após 5 meses.

Acabado este primeiro ano em terras caetés, resta esperar pelo que acontecerá pelos próximos meses. Até julho tenho obrigações que me prendem a Maceió, ainda que não saiba como conseguirei sobreviver depois de maio. De repente o clarão azulado aparece no fundo deste poço sem fundo.







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