terça-feira, 19 de fevereiro de 2013

[Por Trás do Gol] Para a Polícia vale o mesmo que para o árbitro

Menos de dois meses concluídos no ano e a polícia vai conseguindo aparecer no noticiário esportivo mesmo com a primeira fase do Campeonato Alagoano muito disputada e o sucesso do ASA na Copa do Nordeste. Mesmo de longe, já soube de três casos em que este agente (repressor) surgiu no ano. Tudo bem, metade dos casos é por conta de outro problema: certos torcedores (?) organizados.

30 de janeiro
União e CSA disputaram naquela tarde de sábado mais um jogo do Alagoano, em sua 6ª rodada. Enquanto o time azulino vinha de goleada por 6 a 0 contra o Sport Atalaia, a equipe da terra do Quilombo dos Palmares também vinha de goleada, mas sofrida, para o Corinthians por 4 a 1.

Ao contrário do que se imaginava naquela tarde, o CSA sofreu para arrancar um ponto no Estádio Orlando Gomes, com Mendes empatando aos 44 minutos do segundo tempo. Acompanhei a partida pela internet e depois segui com as minhas atividades rotineiras. Só depois é que soube e vi do que houve após a partida.

Integrantes da maior organizada do CSA pularam o alambrado e foram retirar e rasgar a faixa da torcida organizada do União - sim, elas existem mesmo para clubes tão novos e no interior. Membros desta também pularam o alambrado e partiram para a briga.

Após algum tempo, policiais do BOPE aparecem e, com a singeleza de costume, saíram batendo em todos que apareciam pela frente, mesmo aqueles que não esboçavam nenhuma reação. Chutes, cacetadas, socos, intimidação. Pessoas jogadas ao chão. Torcedores nas arquibancadas até tentaram protestar, mas nada mudou a atitude dos policiais - será que a gente usa aspas ou interrogação aqui também?

Tanto Ministério Público quanto o comandante da Polícia Militar indicaram abertura de procedimento administrativo par averiguar a responsabilidade tanto dos torcedores quanto dos policiais. A esperar...


06 de fevereiro
CRB e Santa Cruz se enfrentavam pela última rodada da fase inicial da Copa do Nordeste. De um lado, o Santa Cruz já estava classificado, lutando para manter a primeira posição do Grupo D. Do outro, o CRB já estava eliminado, tentando vencer mais uma partida no Estádio Rei Pelé. Intervalo de jogo e o clube alagoano estava alcançando este feito, 2 a 1.

Integrantes de organizadas de Santa Cruz e CRB pularam para o anel inferior, a arquibancada baixa, e se encontraram no meio do caminho para protagonizar mais uma de suas batalhas de socos e pontapés. Quem conhece minimamente as torcidas organizadas sabe que a do Santa é parceira da do CSA e, consequentemente, "inimiga" da arquirrival local. Basta ver que no meio das bandeiras em jogos azulinos haverá uma coral e, se não me engano, no meio da torcida do Santa haverá uma da azulina.

Essa parceria entre torcida percorre o Brasil inteiro - veja matéria do Yahoo! de anos atrás explicando essas divisões, parcerias e recolocações. Eu já fui a estádio em dia de CSA X Santa Cruz, com Rei Pelé dividido quase metade-metade e não ter problema algum. Assim como já tive a desagradável experiência de estar dentro de um carro no estacionamento do estádio e ver torcedores de CSA e ABC brigando assim que o ônibus da torcida potiguar chegou, com a polícia também sendo pega de surpresa.

No caso do dia 06, creio discordar de qualquer justificativa para a polícia demorar tanto a aparecer. Não é surpresa para ninguém não só a rivalidade entre estas torcidas, até mesmo pela proximidade de Pernambuco e Alagoas, como também que pessoas pular para o anel inferior mesmo quando este está fechado ou fazem o caminho inverso, subindo para a arquibancada alta.


A foto acima, de Caio Lorena, para o Globoesporte.com AL, chega a ser inacreditável. Policiais olhando a bagunça abaixo. Depois de muito tempo é que policiais apareceram ali. Por conta disto, algumas pessoas ficaram machucadas, tiveram que ser levadas a campo para tratamento dos médicos do estádio e a ambulância precisou sair para o Hospital Geral - que fica em frente ao estádio. Resultado: a partida ficou paralisada por mais de dez minutos porque não havia ambulância.



Rodada adiada
A tabela do Campeonato Alagoano já não trazia jogos para o fim de semana de Carnaval. Apesar de a capital ter a festa na semana anterior à data, algumas cidades do interior promovem festejos. A 9ª rodada teria um jogo na quarta-feira de cinzas, CSA X União, e as demais partidas na quinta-feira.

A Polícia Militar alegou ainda estar acompanhando o final das festas e a volta da população para as cidades de origem para dizer que não teria efetivo para a partida de quarta-feira, no Rei Pelé. Por conta disso, a Federação Alagoana adiou a rodada para que tivesse dois jogos na segunda-feira seguinte (18) e outros dois na terça (19). Além disso, criaria-se uma "monstruosidade" na tabela, já que a 10ª rodada que ocorreria com um jogo no sábado (16) e outros três no domingo (17), foi recolocada toda para o sábado, com a 10ª rodada vindo antes da 9ª.

No sábado, enquanto me preparava para acompanhar a segunda derrota consecutiva do CSA no torneio, contra o Sport, em Atalaia, vi um tuíte da assessoria do clube informando que a partida marcada para a segunda-feira teria sido adiada para a segunda-feira seguinte (25).

A Polícia Militar informou à FAF no dia anterior que não teria como garantir efetivo para o jogo do dia 18 em Maceió. O presidente da federação informara que não podia fazer nada, já que qualquer alteração contrariaria o Estatuto do Torcedor, já que os ingressos teriam sido colocados à venda pela diretoria azulina. Até agora não sei qual a justificativa para a falta de efetivo ontem - quer dizer, há os índices alarmantes da segurança pública no Estado, mas isso é, infelizmente, cotidiano.

Pela quarta vez, temos o futebol alagoano tendo a participação com destaque da polícia. A tabela ficou mais estranha ainda, já que o CSA agora jogará três partidas seguidas em casa e se ganhou maior folga, junto ao União, após o final de semana, perderá dias na semana que vem.

Problemas
Se após o primeiro problema do ano com as torcidas organizadas tentamos estabelecer um debate apresentando certo contraditório, aqui não será diferente. Um torneio de futebol profissional é organizado por uma entidade paraestatal, com associações privadas em disputa. Do mesmo jeito que a presença da ambulância nos estádios não é um compromisso de órgãos governamentais - em alguns casos o que ocorre é parceria com secretarias de saúde -, a segurança nos estádios também não é, como pode se perceber com seguranças de empresas sendo contratados para prestarem a proteção a árbitros.

Os policiais geralmente não ganham nada a mais para trabalhar nestas partidas. Indiretamente, trata-se de um trabalho com presença de funcionários públicos para garantir a segurança de um evento privado, que o Estado não ganha e não perde recursos, independentemente de se ter 100 ou 10 mil pessoas presentes. Pelo que sei, o que ocorre na prática é que policiais têm acesso livre às partidas quando estão de folga e ainda tentam colocar familiares e amigos de graça para dentro do estádio. Além disso, alguns responsáveis por estádios podem dar lanches antes das partidas.

O próprio Estatuto do Torcedor diz que cabe ao promotor da partida a responsabilidade pela segurança, não só para combater a violência de integrantes de organizadas, mas também no que tange à estrutura do espaço e de forma geral e irrestrita, ao "torcedor comum" - a quem sobra a rispidez na hora de passar pela revista antes do jogo e algum cacetete "desenfreado" em algumas partidas.
Quando fui ao Beira-Rio, ano passado, lembro que a segurança nas arquibancadas era privada. Cabendo à Brigada fazer a vistoria antes do acesso às rampas e a presença do batalhão especial dentro do campo.

Seguindo ao Estatuto, ele determina no Artigo 14 que cabe ao promotor do evento:

"I – solicitar ao Poder Público competente a presença de agentes públicos de segurança, devidamente identificados, responsáveis pela segurança dos torcedores dentro e fora dos estádios e demais locais de realização de eventos esportivos."

Além disso, este artigo ainda afirma algumas necessidades sobre o quesito segurança, que é direito do torcedor (e de todo "cidadão") antes, durante e depois da partida:

"§ 1o Os planos de ação de que trata o caput serão elaborados pela entidade responsável pela organização da competição, com a participação das entidades de prática desportiva que a disputarão e dos órgãos responsáveis pela segurança pública, transporte e demais contingências que possam ocorrer, das localidades em que se realizarão as partidas da competição. (Redação dada pela Lei nº 12.299, de 2010).
I - serão elaborados pela entidade responsável pela organização da competição, com a participação das entidades de prática desportiva que a disputarão; e
II - deverão ser apresentados previamente aos órgãos responsáveis pela segurança pública das localidades em que se realizarão as partidas da competição.
§ 2o Planos de ação especiais poderão ser apresentados em relação a eventos esportivos com excepcional expectativa de público".

Como comentamos ironicamente em outro momento deste texto, somos cientes dos elevados índices de violência no Estado, mesmo com alguns programas pela paz propagados recentemente e da presença da Força Nacional. Exigir que a polícia foque a sua atuação em determinado evento em detrimento ao resto de uma cidade de cerca de 1 milhão de habitantes, como é Maceió, seria esquecer dos problemas cotidianos.

Os casos relatados aqui mostram, no essencial, a necessidade de uma maior preparação dos policiais, para que tenhamos neles não o medo corriqueiro ao vê-los, mas a garantia de que podemos apenas torcer nos estádios, sem ter que nos preocupar em atitudes violentas contra nós ou outras exageradas contra quem realmente mereceria ser detido ou advertido - por mais que sejam torcedores organizados.

No futebol para a Polícia vale o mesmo que para o árbitro: quanto menos aparecer nas notícias após as partidas melhor.

2 comentários:

  1. Quanto aos policiais da confusão entre as torcidas de CRB e Santa, é claro que eles estão ali pra proteger a população. Mas, imagine-se no lugar dos policiais. 20, 30 marginais indo uns em direção aos outros para trocar porrada. Sinceramente, é melhor deixar a porrada comer, eles estão procurando isso, deixa eles terem o que querem.

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    1. Mas a porrada deles foi responsável pela paralisação do jogo por mais de dez minutos para que fossem atendidos pela ambulância do estádio...

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