quarta-feira, 14 de dezembro de 2011

O que já mudou e o (muito) que ainda precisa mudar II

O segundo dia da etapa estadual de "Seminários Comunicação em Pauta: o que já mudou e o que precisa mudar" continuou com a presença de poucas pessoas presentes no Auditório da CEF, no Centro de Porto Alegre (quem quiser ver minha crítica a isto, ver post anterior). A parte boa disso foi que os palestrantes desceram e falaram conosco no mesmo nível, sem a necessidade de usar o palco.

O segundo dia foi dedicado a diferentes análises sobre os meios de comunicação, com a presença dos seguintes palestrantes: Conceição Oliveira (Blog Maria Frô), Marcelo Branco (ativista pela liberdade do conhecimento/Software Livre), Rachel Moreno (coord. do Observatório da Mulher) e Laurindo Leal Filho (prof. da USP/apresentador do Ver TV).

Confesso que pelo espaço em que estava, com o Governo, do PT, organizando o evento e com a participação de algumas pessoas e entidades sociais que imaginava que tinham grande proximidade ao partido, imaginava que ouviria mais daquelas histórias de que "não está bom, mas está melhor" - slogan de certo governo estadual, de partido "oposto" em sua primeira gestão. Surpreendi-me que não. Não é a toa que optei por fazer questões mais objetivas na minha colocação após as apresentações.

- Conceição Oliveira
Formada em História e blogueira do Blog da Frô, um dos mais acessados do país, concordei com toda, ou quase toda, fala dela durante o evento. Ela lembrou de casos recentes, como a promessa de autorregulação da RBS (e a criação de seu Guia de Ética) e a afirmativa do Boni de que não só manipularam a edição do debate de 89 para o JN, como também preparam o candidato Collor para ele, para destacar o seu pessimismo perante um cenário pouco animador.

Conceição disse que o Governo não só não tem coragem para tal, como o ministro de Comunicação seria o mais subserviente que já se teve. Segundo ela, o Paulo Bernardo teria dito que a prioridade do Governo era saneamento básico quando pressionado por ações mais efetivas na área. Além disso, ele sequer participou do seminário do próprio PT sobre o marco regulatório (!).

Além disso, ela lembrou que a Anatel fecha rádios comunitárias, enquanto igrejas utilizam esse tipo de concessão em todo o país e nada acontece. Assim como, não vê esperanças no PNBL, ainda mais com o BNDES "emprestando" R$ 3 bilhões para a Vivo, enquanto que a Telebras não recebe investimento algum.

Para mudar a situação só há uma solução: ir às ruas!!!

- Marcelo D'Elia Branco
Marcelo explicou a evolução da tecnologia midiática que, de certa forma, reverte o esquema de produção de conteúdo. Porém, é necessário evitar qualquer forma de intervenção/perseguição sobre o uso da internet.

Uma das propostas em pauta no Congresso neste ano foi a neutralidade da rede. As teles querem cobrar para a utilização e garantir a segurança de portais, ou seja, este blog teria que pagar a uma das grandes redes que controlam a estrutura da internet para não ter problemas de segurança, por exemplo. E isso vale para mim e para a Globo e seu Globo.com e derivados, não é a toa que as Organizações dos Marinho já anunciaram ser contrárias ao fim da neutralidade da rede. Além da "clássica" filtragem de conteúdo, presente no "AI-5 Digital" do Azeredo.

No dia 25 de agosto, o Governo federal enviou ao Congresso uma proposta de Marco Civil da Internet, com a necessidade de se entender a internet como um direito. Porém, não se pode responsabilizar os provedores por determinado conteúdo. Primeiro, porque isso abre espaço para que eles controlem o conteúdo; segundo, alguém culpa empresas como Toshiba ou Philips pelo conteúdo produzido pela Rede Globo?

Além disso, como adepto da liberdade do conhecimento, Branco destacou as leis de direitos autorais no Brasil são "draconianas", em que até emprestar livro é proibido!

A importância desse tipo de discussão seria perceptível com a quantidade de informações que circulou na rede durante as eleições do ano passado, sem o predomínio dos grandes grupos de comunicação. Entretanto, apenas 1% veio de movimentos sociais, o que sugere a necessidade deles utilizarem bem mais os novos meios - desde que tenham como fazê-lo, tanto em termos de estrutura quanto de tipo de produção.

Outra coisa que achei interessante foi ele apontar um possível erro. Mídias sociais são Twitter, facebook,... Redes sociais necessitam de pessoas para formá-las e é necessário ampliá-las, não bastando um Governo ou movimento social tê-los, mas estabelecer ligações e diálogos com outras pessoas.

- Rachel Moreno
Rachel fez um apanhado muito bom sobre como a mídia vem retratando a mídia. O Observatório da Mulher fez uma excelente pesquisa, com a divisão por etapas da mesma, com conclusões também de como a lei brasileira, em comparação com a de outros países, trata o assunto.

Ela lembrou o julgamento da proibição da classificação indicativa, em trâmite no STF. Falta o entendimento de que o que se chama de autorregulação é, na verdade, o que atende mais aos patrocinadores dos programas e das emissoras.

Na análise, anotei algumas coisas ainda mais interessantes. A pesquisa mostrou que a mulher que aparece na televisão é de forma absolutamente seletiva (18%). Geralmente, aparece nos telejornais como testemunha anônima, nunca como especialista. Um dos poucos momentos em que a mulher é destaque, na verdade, é o seu corpo que está no foco da câmera, não sua capacidade intelectual.

No terceiro ponto da apresentação, "Manifestações", Rachel destacou a existência da Plataforma de Beijing, dos Objetivos do Milênio e de outros acordos que têm a assinatura do Governo brasileiro.

Por fim, Rachel Moreno apresentou alguns pontos problemáticos a serem discutidos e (re)vistos: a concentração e a dependência financeira, que "garante" a invisibilidade seletiva; determinação da violência midiática como violência simbólica, na Argentina; necessidade de se trabalhar no sentido de se conscientizar os telespectadores para que eles também participem das mobilizações; e que nós estamos atrasados tanto na autorregulação, como também na regulação dos meios de comunicação.

Ela lembrou que o ex-secretário de Comunicação Social Franklin Martins não defende a regulação do conteúdo. Porém, ela lembrou do caso dos Toddynhos contaminados aqui no Rio Grande do Sul, que passaram pela autorregulamentação da empresa, mas que foi necessário uma agência externa, a Anvisa, para perceber.

- Laurindo Leal Filho
Lalo teve um discurso um pouco mais otimista. Ele destacou o nosso atraso, ainda mais se considerarmos os recentes avanços dos vizinhos sul-americanos, mas que já se melhorou muito, quando comparado à época que ele voltou ao Brasil após ter estudado a BBC (Reino Unido).

Para ele, o problema é que a radiodifusão e a mídia em geral é pensado como um modelo de negócio, não como um serviço público. Até mesmo na Academia se via muito este tipo de pensamento, algo que mudou consideravelmente nas últimas décadas. Isso fez aumentar a quantidade de debates sobre o assunto, mais ainda não garantiu um avanço significativo na legislação, com a classificação indicativa podendo cair por defesa dos interesses midiáticos por parte da maior instituição de Justiça.

Sobre o Conselho Estadual de Comunicação, sobre o qual comentamos ontem, ele disse que "você tem que desconstruir o que estava antes [conceitos negativados] par depois construir o Conselho". Primeiro há a difusão de que a criação desse órgão auxiliar significará a censura, naquele discurso, repetido pela presidenta Dilma Rousseff, de que "o melhor controle é o controle remoto". Lalo lembra que há um grave erro na aplicação dos conceitos, afinal regular é sempre a posteriori, enquanto que censura é prévia.

No que tange à legislação, ele lembra a importância do setor de comunicações, que "faz a cabeça das pessoas". Muda-se o apresentador, o canal, mas o conteúdo continua o mesmo. Isso num país em que o Código Brasileiro de Telecomunicações não serve mais para as telecomunicações e que mesmo para o setor de audiovisual ele é retrógrado, por se tratar de algo que completará em 2012 50 anos, ou seja, ele foi criado quando a Rede Globo, líder do oligopólio nacional não usava suas concessões - algo que começa em 1965. 

Enquanto isso, a Inglaterra revisa a sua legislação a cada quatro ou cinco anos - para o "bem" ou para o "mal" - e o exemplo do capitalismo, os Estados Unidos, tem um órgão regulador (FCC) desde a indústria do cinema, na década de 20!

Questões
Dentre as participações para questionamentos, deixou-me intrigado as reclamações quanto à divisão do bolo publicitário estatal, vinda de Cláudio Calmo e do Alan, um dos diretores da Abraço-RS. Por mais que se tenha começado a dividir, são 65% para as grandes mídias e 35% para o que sobra, entre pequenos empresários e mídias comunitárias e/ou blogs.

O responsável pelo Cloaca News disse que no Clic RBS, portal do grupo, eles não se responsabilizariam pelo conteúdo ali publicado. Eu procurei pelo site, mas não consegui confirmar esta informação, já que é um absurdo. Com um noticiário não se responsabiliza pelo que seus profissionais produzem?

Por fim, uma frase final de Conceição Tavares: "Qual a tática deste governo para a comunicação? Se for para aparecer na Ana Maria Braga é uma tática suicida!".

(Por conta de outras atividades não pude ficar para a parte da tarde, que teve uma audiência pública sobre as rádios comunitárias, com a participação de representantes do Ministério das Comunicações, do Governo do Rio Grande do Sul e da Abraço)

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