Nesta quinta-feira foi o último dia da Semana da Imagem, evento realizado pelo grupo de pesquisa TCav daqui da Unisinos e que é parceiro do Cepos na linha de pesquisa 1, Mídias e Processos Audiovisuais, do Programa de Pós-Graduação em Ciências da Comunicação. Conheço o pessoal da linha, professores e estudantes por conta do convívio em disciplinas comuns e posso dizer que já estou "acostumado" à maneira de se observar a comunicação por parte deles.
Eles vêem o comunicacional na perspectiva da "tecnocultura audivisual", uma espécie de ambiência em que vivemos na contemporaneidade, ou que estejamos caminhando para, em que os meios de se comunicar são entendidos como máquinas de visão, não enquanto novas linguagens, por isso que costumo dizer que eles utilizam da questão técnica mesmo, numa visão benjaminiana.
Enfim, explicações à parte, o assunto deste post é algo que já havia discutido durante o Lusocom, no GT de Comunicação e Política: a Internet, ou mundo digital, como garantidor de relações comunicacionais horizontalizadas já no espaço contemporâneo.
LUSOCOM
No Lusocom, devido a questão de atrasos dos apresentadores, um pesquisador português que desenvolveu um trabalho sobre a comunicação institucional da cidade do Porto pediu para apresentar no de Política e, como viajaria, foi o primeiro. Em seguida, apresentou um doutorando de Educação da UFSCar sobre a visão de Gramsci sobre a imprensa. Ou seja, dois pólos diferentes de análise sobre a comunicação e que, consequentemente, tenderiam a gerar uma baita discussão. E deu.
Pinto Teixeira, acho que este é o sobrenome dele, questionou se poderíamos aplicar conceitos tão duros, como no que se considera um consumidor de mídia passivo, para os dias atuais, em que, "todos podem produzir informação e difundi-la, com democracias firmes que possibilitam ter uma representação igualitárias nas câmaras políticas". Mais ou menos isso, já que foi há duas semanas.
Escutei alguns comentários de colegas e não tive como deixar de discordar dessa realidade sobre redes sociais e produção na Internet que apaga qualquer existência de indústrias culturais estabelecidas. Lembro de ter respondido que no Brasil o poderio da comunicação "tradicional" ainda era pesado - especialmente após uma colega de EPC, da Unesp, ter dado o exemplo do Sind. dos Professores de SP, que ainda se "informam" com o JN.
Além de lembrá-lo que a realidade comunicacional brasileira é bem diferente da europeia. Aqui a televisão, a principal mídia massiva, começou e sempre foi comercial, enquanto lá começou e foi até um bom tempo estatal, com a concorrência e disputa, posterior à abertura do mercado no setor, permitir variações nas posições em termos de audiência. Em território brasileiro, por mais que perca audiência e share, a Rede Globo de televisão continua muito forte, mesmo que não tanto quanto antes.
Como o GT tinha que andar, inclusive eu tinha que apresentar um trabalho sobre o "Valerioduto" e como são estabelecidas as relações político-econômicas dos grandes grupos midiáticos brasileiros, a discussão não prosseguiu.
SEMANA DA IMAGEM I
Nas aulas de Audiovisualidades nas Mídias, no semestre passado, realizada com professores do PPGCC do TCav, num momento específico questionei um dos autores quanto à afirmação que "nunca se produziu tantas informações quanto hoje". Em que pronto fui respondido que isso é verdade, porém, nunca tantas produções foram tão irrelevantes.
Enfim, durante a Semana da Imagem, o assunto de mídias digitais como a "alternativa" voltou, e em dois momentos, mesmo que sob perspectivas um pouco diferentes.
Na terça-feira, o professor Celso Cândido (UNISINOS) participou da mesa "Impacto das novas mídias no estatuto da imagem: McLuhan 2.0". Antes de adentrar no que o professor falou em específico, já aviso logo que McLuhan, que completaria 100 anos em 2011, não está na minha lista de autores sobre Comunicação por uma postura teórica que, apesar de ter diminuído meus ranços nos últimos meses, não concordo por conta de certo exclusivismo sobre a técnica em contraposição ao exclusivismo ao conteúdo.
Voltando ao tema base deste texto, durante a apresentação do prof. Celso, que não anotei por completo e nem pretenderia resumir, logo dou aqui a minha interpretação, ele falou no poder da comunicação contemporânea, em que se sai de uma produção de "um para muitos", para "muitos para muitos". As novas mídias possibilitariam novas formas de produção, em que os indivíduos podem ser narradores de suas próprias histórias.
Cândido dá o conceito de "intercriatividade", que representa um avanço quanto a interatividade (associada a algo mais responsivo que dialógico - expressão bakhtiniana que fica por minha conta). Não se tem apenas uma capacidade de escolher, mas de se criar, de forma que estaríamos num momento em que se tem cooperação e criação coletiva, num "empoderamento molecular" que define as formas de vida da nossa época.
Confesso que fiquei inquieto desde quase o início da apresentação dele, mas a minha questão foi a "pergunta clássica" - como ele mesmo disse ao responder - se estaríamos mesmo numa sociedade assim na contemporaneidade. Para mim, não podemos esquecer que determinadas relações sociais, políticas e econômicas continuam aí e, além disso, o fato de que em países como o Brasil o acesso à Internet não ser "massificado" grande, por exemplo. Além disso, imagino que, como possibilidade, poderíamos estar numa época de transição para uma comunicação horizontal efetiva.
Um dos argumentos dele, até mesmo porque é assunto "para um debate maior", foi que muitas pessoas utilizam a Internet. Se quando ele iniciou essas discussões se falava em 200 milhões de pessoas com acesso, hoje seriam 2 bilhões. Além do fato de os brasileiros estarem entre os primeiros nas listas de redes sociais e, principalmente, acesso por horas/mês de Internet.
Volto ao ponto inicial deste sub-tópico, podemos acessar mais, porém o que se pode considerar relevante, ou da mesma relevância que um telejornal, por exemplo, viaja pela web e é de tal forma popularizado? Para mim, e um conceito de direito à comunicação ou socialização oriunda disto, não basta o acesso, mas se precisa de um processo de aprendizado tanto no que tange à melhor utilização técnica das máquinas de visão, agora audiovisuais, quanto numa socialização de conteúdos culturais que, ainda não temos da melhor forma - para alegria de adornianos.
SEMANA DA IMAGEM II
(Com sono, mas terminarei o texto...)
Na quinta-feira foi a vez do professor da UFSC Massimo Canevacci se apresentar em duas mesas, na de "Tecnocultura Audiovisual" e numa apresentação denominada "Carpe-codex". Em ambas ele tocou em temas que me trouxeram curiosidade, caso de uma "divisão comunicacional do trabalho" no lugar da "divisão social do trabalho" marxiana, e na importância da internet enquanto direito fundamental do ser humano.
Pelo que eu entendi do que foi proposto pelo professor Canevacci, ele ainda considera a comunicação atual verticalizada, em que a internet seria fundamental para horizontalizar, e entende que se deve desenvolver um tipo de democracia outra, uma "cidadania transitiva", em que se pudesse transitar por vários países, sem ter uma nacionalidade que o defina. Além disso, não haveria hoje mais indivíduo, mas multivíduo.
À noite, numa apresentação mais voltada a uma composição de "metrópole comunicacional", ele voltou ao tema da "divisão comunicacional do trabalho" e finalmente pude perguntar se isso não seria uma proposta na tentativa de centralizar a resolução dos problemas no comunicacional, ao contrário da proposta de Marx que considerava como formador do campo do trabalho, questões sociais, econômicas e políticas - faltando o quesito cultural nele, acrescido a partir dos frankfurtianos.
A resposta dele foi que horizontalizando a comunicação se pode criar um conflito político, já que a política depende muito da comunicação e sua alteração. Cada indivíduo, inclusive com as mídias digitais, tem a preocupação em produzir seu conteúdo, numa situação que conflitua com a hierarquização vertical da atual política.
CONCORDÂNCIAS E DIVERGÊNCIAS
De forma geral, quem me conhece antes da vinda à Unisinos sabe o meu posicionamento sobre o Twitter, em específico, e alguns destes já riram de mim após a utilização desta rede social e o quanto eu a utilizo. É uma ferramenta importante e interessante a se ocupada, mas não pode se a única.
O exemplo atual das manifestações árabes e inglesas mostram que as redes sociais foram importantes para a difusão, mas se não fosse a luta diária, com manifestações da população, pouco teria mudado, até mesmo porque a primeira atitude dos governos ditatoriais foi fechar os caminhos de comunicação via rede. Se uma coisa fosse tão ligada à outra, as manifestações teriam se encerrado. Além disso, o quanto sabemos do processo nesses países hoje a não ser o mínimo que é/foi oferecido pelas indústrias culturais tradicionais?
Já defendi as redes sociais noutra aula no semestre passado. Não vejo essas novas mídias como revolucionárias, a salvação da sociedade desigual que continuamos a viver, mas não deixo de admitir que podemos falar algo. Este blog, o site Estratégia & Análise, o Sururu Fresco e o Observatório da Imprensa, espaços que alguns dos meus textos são publicados, são provas disso.
Porém, um dos problemas da difusão um-um ou muitos-muitos é que não se tem "fórmula" para que um assunto importante vá parar, por exemplo, no Trending Toppics do Twitter, espaço que continuo achando com possibilidade de informações mais efêmeras. O filósofo esloveno Slavoj Zizek parou lá por conta de conversas com a cantora pop Lady Gaga, não por sua análise filosófica, que é muito interessante, por sinal.
Mesmo com a crise que reflete a "Fase da Multiplicidade da Oferta" de bens culturais, um assunto para se tornar público, de forma geral, tem um maior alcance na mídia hegemônica "tradicional" que numa nova mídia - que até possui uma via de mão-dupla, após muito "sacrifício", com as mídias sociais, que não a balizam totalmente.
No Chile, os protestos dos estudantes geraram uma rede de rádios comunitárias no país que transmitem o assunto de forma a contrapor às informações da "grande mídia local". Um velho meio de comunicação que ainda tem maior amplitude de recepção que as webrádios - que não devem deixar de existir por conta disso.
Tragamos o exemplo do presidente da CBF, há 22 anos no cargo, Ricardo Teixeira. O #foraricardoteixeira ficou alguns dias nos TTs do Twitter, mas as manifestações públicas contra ele levaram, por enquanto, no máximo 500 pessoas às ruas de uma cidade como São Paulo! Ainda muito pouco, por mais que seja "algo", perante o que (não) se tinha antes.
O próprio Teixeira, numa soberba "sinceridade sanchezniana", disse à revista piauí que só se preocuparia quando aparecesse no Jornal Nacional, como apareceu indiretamente no último sábado. Porém, o motivo não foi a marcha organizada pela Frente Nacional dos Torcedores em São Paulo, mas uma divergência quanto à mudança de horários sem consulta dos jogos do Brasileirão deste ano.
Concordo também, e plenamente, que a informação atingiu um patamar de fundamental importância para o modo de produção capitalista na sua fase contemporânea, em que é isso que movimenta os mercados financeiros mundiais. Porém, pensar que resolver este problema pode resolver tudo é esquecer que este problema, o da comunicação, deriva de outros, e não o contrário.