segunda-feira, 29 de julho de 2013

Considerações sobre "Introdução à filosofia de Marx"

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Ainda que tenha lido ou relido um ou outro livro com trechos da obra de Marx, até mesmo por opção individual, não me ative muito à sua obra, ou de seus seguidores teóricos, durante os últimos 2 anos. Precisando retomar as leituras mais amplas que as de comunicação - ainda que as coisas que venho estudando dialoguem com outras áreas do conhecimento -, resolvi ler "Introdução à Filosofia de Marx", escrito pelos professores de Filosofia da UFAL Sérgio Lessa e Ivo Tonet.

Conheci ambos por conta da vivência de movimento estudantil e por entender a necessidade de se estudar sobre a sociedade, para além da militância pura e simples. Devo ter lido muito mais artigos de Tonet e muitas das coisas que estão no livro já conhecia de outros debates e/ou leituras. Ambos são grandes especialistas na obra marxiana - de Marx propriamente - no Brasil. Sérgio, por exemplo, é um dos tradutores de "Para além do Capital", obra importante escrita pelo húngaro István Mészaros.

Além da necessidade de ler outras coisas, preciso retomar alguns conceitos mais clássicos da Crítica à Economia Política, tendo em vista algumas considerações que realizei no capítulo inicial da dissertação, assim como, por conta de outros questionamentos mais amplos, que acabaram surgindo através de outras leituras, específicas sobre esportes, ao longo dos últimos dois anos. Assim, para resgatar, por assim dizer, o mais básico da obra de Marx, resolvi ler dois marxistas.

Antes de iniciar algumas considerações sobre o texto, explicar o porquê de ter utilizado "marxiano" e "marxista". Não são dois sinônimos. A diferença serve para evitar erros de dizer que Marx pensava tal coisa, quanto trata-se da interpretação de outro autor sobre sua obra. Daí que marxiano seja o pesquisador que opta ir direto à fonte e escrever a partir de então; e marxista aquele que opta por analisar outros autores, que se baseiam em Marx, mas já com o seu olhar particular, que é reflexo de seu tempo. 

O LIVRO

Por mais que sejam defensores de se ir diretamente à obra de Marx, ao menos assim o era especialmente Ivo Tonet, "Introdução à Filosofia de Marx" compreende análises a partir do autor alemão, mas também tem forte participação de releituras de Gyorg Lukács. Além de uma ou outra consideração baseada em Mészaros.

Quem chegou até aqui, portanto, saiba que o livro é de autoria de dois marxianos, acima de tudo, que acreditam na possibilidade de transformação social apenas de forma radical, de maneira a se constituir uma sociedade comunista, algo que deixam claro tanto no prefácio: "estamos convencidos de que o resgate da teoria marxiana é a condição fundamental para compreender a crise e os rumos do mundo atual, bem como para orientar revolucionariamente a luta social” (8); quanto nas conclusões: “Nossa intenção foi auxiliar na introdução ao estudo do pensamento de Marx e lançar o leitor em um percurso próprio de investigação que contribua para a revolução comunista” (125).

Dito isto, o livro é escrito em poucas páginas, praticamente sem citações diretas, e nos atendeu bem a quem interessa uma revisão mais prática de alguns dos principais conceitos de Marx ou quem pretende enveredar nos estudos a partir deste filósofo marxista.

Destaco a estrutura com exemplos mais práticos e a forma como a narrativa é construída, tendo questionamentos comuns à obra ou aos reflexos das ideias de Marx na realidade que surgiu depois dele sendo respondidos no encadeamento de ideias do autor, interpretados aqui pelos dois filósofos. Além disso, cada capítulo de "Introdução à Filosofia de Marx" possui um "Resumo do capítulo", onde são expostos tópicos do que mais importante se discutiu ali.

No final do livro há ainda a "Indicação bibliográfica para aprofundar os estudos", dentre livros de Marx e de autores posteriores a ele, com a explicitação do quanto e para quem cada obra passa a ser interessante, de acordo com o conteúdo apresentado.

Ao lê-lo, algumas coisas me chamaram mais atenção, tendo em vista certos questionamentos que venho tendo nos últimos anos, inclusive por conta do que a realidade material nos apresenta no atual momento histórico. Acabei estabelecendo três pontos de aglutinação: 1. Prévia-ideação X causalidade; 2. O entendimento sobre o trabalho, mais especificamente quando se trata do trabalho intelectual; e, por fim, algo mais específico, que não será debatido aqui, mas que muito me interessa para um aprofundamento futuro, que é entender o jogador de futebol enquanto trabalhador no que se refere a conceitos como força de trabalho e mercadoria.


TRABALHO


Iniciarei pela questão do trabalho porque esta questão da prévia-ideação é a que resgatei mais elementos para o debate e creio ser de profunda importância para o momento atual. Porém, friso que o livro foi publicado em 2008, ou seja, no ascender de revoltas populares no mundo e, é claro, trata-se de questionamentos meus sobre conceitos trabalhados/explicitados pelos dois autores neste livro, mas não necessariamente por conta deles.

A categoria trabalho é fundamental para o entendimento da teoria marxiana (e marxista), já que é a partir da transformação da natureza que o homem evolui, transforma-se e passa a produzir mais do que o necessário para que determinado grupo social se desenvolva, de forma que abra-se espaço para as relações de troca para a acumulação privada e, consequentemente, a exploração do homem pelo homem.

Lessa e Tonet contam a história das sociedades até a atual, lembrando algo que é importantíssimo, e que antes não tinha percebido: há uma quebra no processo evolutivo da forma que se dava com o modo de produção feudal. Após a implosão de sistemas baseados na conquista de povos e territórios alheios, que exigiam muitos gastos para a manutenção de repressão que garanta a posse da terra, o feudalismo representa uma espécie de associação entre o senhor feudal e o servo, que, ao contrário dos escravos, possui parte da terra e da produção. O senhor passará a querer acumular mais, enquanto que não haverá terra suficiente para tantos servos, que seriam expulsos, partindo para saques e a venda do que era roubado em mercados, que darão origem aos burgos.

Voltando à questão primordial do tópico, os autores definem desta forma a categoria trabalho:

“O trabalho é o fundamento do ser social porque transforma a natureza na base material indispensável ao mundo dos homens. Ele possibilita que, ao transformarem a natureza, os homens também se transformem. E essa articulada transformação da natureza e dos indivíduos permite a constante construção de novas situações históricas, de novas relações sociais, de novos conhecimentos e habilidades, num processo de acumulação constante (e contraditório [...]). É esse processo de acumulação de novas situações e de novos conhecimentos – o que significa, novas possibilidades de evolução – que faz com que o desenvolvimento do ser social seja ontologicamente (isto é, no plano do ser) distinto da natureza” (26).

Isto sempre foi algo que me afetou de alguma forma. Enquanto jornalista, não há a percepção de alteração da natureza a partir da prática profissional, havendo reflexos de nossa atuação sobre quem altera diretamente a natureza.

Porém, se as relações de classe são estabelecidas através da opressão do homem pelo homem, um jornalista, apesar de não trabalhar, poderia estar na classe oprimida por ter sua situação de trabalho cada vez mais piorada mesmo com o aprimoramento técnico, que Lessa e Tonet apontarão como um grande problema para o operário. Sob o reino da individualidade burguesa, o homem luta contra o homem por mais capital, e apesar de haver a possibilidade de se ter mais "tempo livre" por conta dos aprimoramentos da produção, ocorre o inverso, pois o burguês sempre quererá incrementar sua mais-valia. Isso para ficar num ponto em específico.

Não digo aqui que o "nosso" trabalho seja essencial à humanidade, que sem jornalistas o mundo não sobrevive, mas uma ampliação da análise, ou melhor destrinchamento desta, pode ajudar a entender melhor a realidade do século XXI, dado que as condições materiais vivenciadas por Marx eram muito piores que a atual, no que tange às possibilidades de produção e desenvolvimento interno de determinados grupos sociais. Mas um exemplos geralmente é o mais frequente nesta discussão: como tratar da grande quantidade de pessoas que trabalham no setor de serviços?

Tudo isso porque realmente, "para Marx, nem toda atividade humana é trabalho" (21), e realmente não o é. Não devemos também cair no erro de admitir tamanha amplificação. Porém, um trecho em específico me chamou a atenção:

“É aqui que tem seu fundamento a separação entre o trabalho manual e o trabalho intelectual: este último é a atividade organizadora do Estado, da política, de todas as formas de ideologia (filosofia, religião, artes, etc.), que são complexos sociais necessários para as classes dominantes criarem e reproduzirem seu domínio sobre os trabalhadores. A estes, agora, cabe exercer na produção os ditames da classe dominante: esta última ‘pensa’, os primeiros ‘trabalham manualmente’” (38-9).

“[...] embora sejam as classes dominantes que exerce o controle, também as sociedades de classes apenas podem se reproduzir pelo trabalho daqueles que convertem a natureza nos meios de produção e de subsistência. E que o fato de a classe dominante exercer a atividade imprescindível de controle do trabalho para que a sociedade de classes possa existir significa, apenas, que aquela vive da exploração dos trabalhadores – e não, como se acreditou por tantos anos, que as ideias gerassem as sociedades” (39).

É importante que se ressalte a pertinência das afirmações, ainda mais quando os exemplos de práticas ditas socialistas no século XX basearam-se em burocracias estatais que privilegiavam quem comandava o Estado, com a separação entre os que "pensam" e os que "trabalham" ficando clara. Além disso, é esta a estrutura de gerenciamento das empresas, com o aumento de cargos de mando, até a escala menor possível, para estimular a luta entre os homens e também como forma de reduzir o trabalho manual ao intelectual.

Esta minha preocupação aparece para a definição de outras profissões ligadas às Ciências Sociais e Humanas, em particular, mas que atinge profissões mais gerais, como a dos professores, de nível infantil ao superior. Há partidos de esquerda que não temem em considerá-los como trabalhadores, mesmo os que ganham salários de 10 a 20 vezes o mínimo e sejam empregados da burocracia estatal.

Lessa e Tonet têm outras considerações que podem ser aplicadas a este caso em particular, ainda que não considerem tais atividades humanas como trabalho: 

“IV) O fato de ideia e matéria serem ontologicamente distintas não impede as ideias de exercerem força material na transformação do mundo dos homens. Ao se converterem em ‘força material’, as ideias jogam um papel objetivo na história” (33).

“Em outras palavras, ideia e causalidade, consciência e objetos produzidos pelo trabalho são ontologicamente distintos e, por isso, os produtos resultantes do trabalho humano têm consequências inesperadas para a história. O mesmo podendo dizer de todas as ações humanas que não são trabalho. Ao não transformarem as relações sociais, elas alteram o mundo dos homens, dando origem a novos processos sociais que possuem consequências futuras que, em alguma medida, são casuais” (32).

A questão da alteração do mundo dos homens é essencial, especialmente se levado em consideração o conceito de materialismo histórico e dialético, que é um avanço frente a materialistas e idealistas anteriores justamente por considerar a atuação do homem numa natureza que é mudada ao mesmo tempo que transforma o homem, que cria novas necessidades a partir das experiências históricas registradas na sociedade e como novas ideias para o futuro.

Assim, dirão os autores:

“Nossa capacidade individual de produção, ou seja, se alguns são professores, outros operários, outros banqueiros etc. é ‘também’ a expressão material de como nos conectamos, enquanto indivíduos, com a própria história da humanidade. Um operário só pode ser operário porque parte de uma história que tornou os operários necessários. [...] é ao exercermos cada uma dessas atividades que nos conectamos com a reprodução material da sociedade na qual vivemos e, portanto, nos objetivamos como personalidades, como indivíduos da classe dominante, da classe trabalhadora (os operários e outros assalariados etc.). A força de trabalho de cada um de nós é, portanto, a expressão mais condensado do que temos de mais humano como indivíduos: a nossa relação com a história da humanidade, como nos articulamos com ela, o que somos, o papel que jogamos no complexo processo de desenvolvimento da humanidade e assim por diante” (69).

Há a consideração dos operários em particular, provavelmente mantendo a ideia de ser esta a classe revolucionária, em particular, mas também a de outros assalariados como pertencentes ao conjunto de trabalhadores, o que representa um avanço para o entendimento mais geral e, especialmente, para perceber o conjunto de relações presentes no desenvolvimento da sociedade capitalista.


PRÉVIA-IDEAÇÃO X CASUALIDADE

Nos meus estudos sobre a estética a partir da análise de Lukács uma das coisas que me incomodou foi a prévia-ideação, ao menos quanto à arte, numa sociedade comunista. Parecia natural que com mais "tempo livre" para fazer o que se pretende, as pessoas poderiam produzir mais grandes obras de arte. Incomodava-me porque não é por conta da sociedade capitalista, ou de outras com uma evolução material ainda menor, que grandes obras de arte não surgiram.

Não concordava com a afirmação automática porque se a arte tem a capacidade de ir além, de revelar as contradições sociais de dado momento histórico tão alienante quanto o promovido pelo modo de produção capitalista; e de aparecer enquanto tal apenas séculos depois, por conta do avanço do próprio homem que permite vê-la de tal grandeza, porque afirmar tão cabalmente de como será a arte produzida posteriormente? (Isso não abriria espaço para discussões de formatos revolucionários, como ocorreu com o realismo soviético?)

Lessa e Tonet citam numa nota que "a personalidade do artista é determinante" para a obra de arte, ainda que também assim sejam as demais atividades, só que em menor potência para gerar consequências futuras causais.

Os autores afirmam que para Marx, seguindo a ideia do materialismo histórico e dialético é "uma síntese de ideia e matérias que apenas poderia existir a partir da transformação da realidade (portanto, é material) conforme um projeto previamente ideado na consciência (portanto, possui um momento ideal)" (43). Assim, ideias e ações revolucionárias dependem umas das outras para serem objetivadas e, para isso "é necessário que elas [ideias] reflitam adequadamente as necessidades e possibilidades de cada momento histórico" (43).

Dado o momento anterior de "crise" econômica nos Estados Unidos, seus reflexos na Europa e a série de manifestações populares na região árabe, o movimento Occupy e os recentes aqui do Brasil, muito se falou da necessidade de um projeto para o futuro, que não havia - por vários motivos que não descreverei aqui. Um dos questionamentos plausíveis e que imagino ser comum em quem defende a revolução social seja a de como saber qual o momento para isso? Por exemplo, com tantas pessoas nas ruas protestando no Brasil, ainda que não um "país central", seria uma dessas oportunidades históricas construídas pelos homens?

Há um problema de que “é a existência social dos homens que determina as suas consciências e não o inverso” (44). Quer dizer, entramos na história de que para ter noção do quanto se é oprimido é, primeiro, sê-lo de forma grave, sentir na pele diariamente a exclusão social, e, segundo, para outros casos, saber se a existência de determinado grupo de pessoas permite observar a exclusão do outro, em meio a uma sociedade que estimula o individualismo. “Por isso a reprodução da sociedade e a do indivíduo são dois polos do mesmo processo, isto é, são momentos distintos, porém sempre articulados” (77), com as realidades objetivas e subjetivas caminhando sempre juntas.

Os autores dirão, já para o final do livro que:


“Isso significa, imediatamente, que todas as ações humanas são historicamente condicionadas. Significa, também, que todas as ações humanas, todos os processos sociais, são desenvolvimentos das possibilidades históricas em cada situação. Tanto do ponto de vista de um indivíduo, quanto do ponto de vista coletivo, uma objetivação só pode ocorrer se for possível naquele momento histórico” (117).



O que ocorre é que há uma prévia-ideação de qualquer atividade humana, mas esta está sujeita a consequências não imaginadas, situações causais, que podem mudar o contexto de atuação mesmo depois de muita análise e certeza de como fazê-lo. Repete-se que a natureza é transformada pelo homem momentaneamente que o vai transformando, aumentando os seus conhecimento para atividades futuras. Porém isso só pode ocorrer com o ato passado decorrido. Lukács chama, segundo os autores, este momento de alterações como "período de consequências", em que o ato retroage sobre a conciência por meio dos efeitos que provoca.


“Por isso a reflexão da realidade pela consciência é um constante processo de aproximação das deias em relação à realidade em permanente evolução” (51); uma apropriação das propriedades da realidade segundo necessidades e objetivos do momentos, sendo o reflexo historicamente condicionado.


Assim, "o futuro não poder ser previsto pela consciência. Como ele ainda não aconteceu, como ele não está todo contido na situação presente, não há como a consciência determinar a priori todos os possíveis desdobramentos dos nossos atos cotidianos” (95).

O incômodo sobre como saber quando se tem o "conhecimento adequado da realidade a cada momento histórico" é negado a priori, em que no caso revolucionário, por exemplo - e essa colaboração para a práxis vem a ser bastante interessante - "apenas depois de concluída a objetivação poderemos saber qual grau de conhecimento era mais ou menos adequado para as objetivações que estavam na ordem do dia” (118).

Neste contexto, vi um autor, não marxista, afirmar sobre a necessidade de se ter feito a Revolução Russa mesmo não sendo um país desenvolvido industrialmente. Na conjuntura dada, foi a opção escolhida por quem estava na luta cotidiana em meio a uma região devastada pela guerra. Os desdobramentos futuros não foram como o imaginado até mesmo porque as análises sobre o que estava dado, e as novas disputas, levaram a outros caminhos - também de exploração do homem pelo homem numa burocracia estatal e altamente repressiva.

Acreditando na possibilidade histórica, faz-se necessário para uma transformação radical uma crítica mais completa e radical para abrir o caminho da realidade e, em seguida, determinar tendências históricas predominantes e as reais necessidades e possibilidades históricas da humanidade. Isso, na prática de várias lutas contra perdas que acabam sobrepondo a questão maior, que quem vivenciou minimamente uma prática de militância sabe que é a regra cotidiana.

Neste sentido, Lessa e Tonet afirmam o que vem a seguir, de maneira a tirar a naturalidade do processo revolucionário frente às constantes crises do capital, e reafirmar a necessidade da explosão revolucionária:


“Por isso, a revolução comunista não é uma realização necessária e inevitável no processo histórico (como tanto afirmaram o ‘marxismo vulgar’ e o estalinismo), mas sim um ato de afirmação do ser humano que se emancipa e se liberta; que se emancipa porque está se livrando das alienações capitalistas; que se liberta porque objetivará uma finalidade essencialmente humana e, ao mesmo tempo, possível no quadro histórico atual” (120).


Por fim, destaco duas colocações para o entendimento sobre a democracia (burguesa). A primeira bem que se aplica a tantos casos corriqueiros, cujo maior foco (alvo) acaba sendo para os proprietários de conglomerados comunicacionais até mesmo por conta do grande desenvolvimento do setor especialmente a partir do século XX com a televisão:


“Para que a sociedade capitalista funcione é necessário que todos sigam os costumes e as leis; por isso, o burguês defenderá intransigentemente que as leis devem ser respeitadas por todos, mas, no seu comportamento, pessoal, as violará sempre que lhe for lucrativo” (82).


Já a segunda apresenta uma análise sobre a democracia, após um tanto de destaque sobre a criação de Estado e Direito, dentre outras coisas, para garantir a manutenção do capital e maquiar a existência da luta de classes:


“Ela [democracia] se caracteriza pela concepção de que todos os homens são iguais e que, portanto, as leis não devem proteger um indivíduo na sua disputa com o outro. Para a ordem política burguesa, o capitalista e o operário são absolutamente iguais. Mas como, na realidade, o burguês é muito mais poderoso do que o operário, a igualdade política afirmada pela democracia significa, de fato, a máxima liberdade para o capital explorar a força de trabalho. Dizem os conservadores, defensores do capitalismo, que a lei não deve dar privilégios a ninguém, que deve tratar todos da mesma forma. Contudo, ao proceder assim, a lei garante não a igualdade entre os homens, mas sim a reprodução das desigualdades sociais” (88).


Para não terminar com a citação, friso que uma versão do texto está disponível na internet (http://www.ivotonet.xpg.com.br/arquivos/Introducao_a_Filosofia_de_Marx.pdf) e que se nele há muitas outras coisas a se observar, fora dele há um tanto ainda maior para se conhecer de categorias marxianas e marxistas desenvolvidas.


REFERÊNCIAS
LESSA, Sérgio; TONET, Ivo. Introdução à filosofia de Marx. São Paulo: Expressão Popular, 2008. (Debates & Perspectivas)

sábado, 27 de julho de 2013

E se em 1930...

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Uma Copa do Mundo cuja marca foi um goleiro defendendo uma bola chutada no ângulo. Impensável nos dias de hoje, quando todos nós sabemos que o mais importante é ver a gorduchinha no fundo das redes.

Mas, como já contamos no início desta série, ter chegado em 1930 à promoção de um torneio mundial de futebol é bem mais importante que a primeira representação comunicacional deste esporte - que contava somente com as publicações impressas e uma coletânea cinematográfica que viria a ser recuperada bem depois.

Entretanto, o amadorismo presente ia além disso. Neste torneio que deveria ter sido mundial, foram apenas 13 seleções presentes, dos continentes americano e europeu. Dentre as ausências, a dos inventores do futebol, a Inglaterra, que, assim como outros países, prefeririu não participar por causa da grande distância para o Uruguai. Seriam 15 dias para ir, 15 para jogar e mais 15 para voltar para casa.

Deixemos de lero-lero e contemos, da nossa forma, como um motivo tão banal pôde ter tanta importância para a primeira edição da Copa do Mundo.

>> E SE EM 1930...
Chegou o dia que Jules Rimet, presidente da Fifa, tanto esperava... O dia em que um país bicampeão olímpico poderia mais uma vez mostrar sua supremacia num esporte bretão... O dia em que o mundo começou a perceber o fenômeno globalizante do futebol.

93 mil pessoas ocupavam o Estádio Centenário na capital uruguaia, Montevidéu, esperando que a comemoração de 100 anos de independência do país fosse consolidada com mais um título da Celeste Olímpica. Não importava que oficialmente no estádio só coubessem 80 mil.

O dia 30 de julho de 1930 daria ao mundo uma das primeiras rivalidades sul-americanas numa final de Mundial. Separados pelo Rio da Prata, Argentina e Uruguai só pensavam em levantar aquele troféu dourado, que no futuro chamariam de Jules Rimet.

As duas seleções, coincidentemente, vinham de duas goleadas pelo mesmo placar nas semifinais: 6X1 (contra Iugoslávia, para os atletas da casa; e contra o Estados Unidos, para os vizinhos).

Dentre tão poucos países, o Brasil ficou no caminho. Numa intriga formada pela Confederação Brasileira de Desportos, que optou por não chamar nenhum dirigente paulista, os times de São Paulo não liberaram ninguém no Estado. A única exceção no selecionado carioca foi Araken, jogador do Santos, que brigado com a diretoria do clube resolveu se juntar à delegação que viajaria a Montevidéu.

Em dois jogos, uma derrota na estreia para a Iugoslávia por 2 a 1 e uma goleada sobre a Bolívia, 4 a 0. O primeiro gol brasileiro em Copas foi marcado por João Coelho Neto, o Preguinho, jogador do Fluminense.
Será que SE fosse uma Seleção realmente brasileira o resultado poderia ser outro?

Enfim, fato que na final estavam dois vizinhos do nosso país. Com sua tradicional camisa celeste, o Uruguai; do outro lado do campo, com listras verticais em azul e branco, a Argentina.

Só que o árbitro belga Jan Langenus encontrou um grande desafio antes do início da partida. Diferentemente de hoje, não havia bola oficial do torneio, assim, ambas as seleções faziam questão de atuar com as bolas fabricadas em seus países.

Sem ter como resolver o problema - nem sei se ele falava castelhano -, o árbitro resolveu fazer um sorteio: num tempo a bola seria de um país, noutro a do adversário.

Mesmo com a bola argentina para o primeiro tempo, Dorado abriu o placar para os anfitriões, aos 12 minutos. Porém, com melhor domínio da redonda, a Argentina virou. Aos 20 minutos Peucelle empatou e aos 37 foi a vez de Stabile virar o marcador e se firmar como artilheiro do Mundial, até o momento com oito gols.

Só que aos 12 minutos da segunda etapa, a posse da bola uruguaia deixou o placar igual no segundo tempo, com gol de Cea. A alegria da torcida só não foi maior que a que veio aos 23, com o gol de Iriarte, virando o marcador.

Em meio a tanta festa dos rivais, um dirigente argentino decidiu "resolver" o jogo: entrou em campo de forma sorrateira e jogou outra bola para ser reposta pelos seus jogadores no meio de campo.

Os uruguaios estavam tão empolgados com a virada e com a festa da torcida que não acharam estranho. Só não esperavam que Stabile recebesse sozinho um lançamento direto da intermediária, claramente a defesa não soube onde a bola chegaria, e batesse na saída de Ballesteros, aos 35 do segundo tempo.

Aos 44, o golpe fatal para a alegria uruguaia, cuja torcida já estava preocupada. O técnico Francisco Olazar pediu para que o artilheiro da Copa recuasse para a marcação, de forma a confundir a zaga adversária. E deu certo. Aos 44 minutos, Stabile deixou o capitão Manuel Ferreira livre para chutar na entrada da área. Foi o gol que calou o Centenário.

Fim de jogo. Festa dos argentinos e um tremendo silêncio no estádio uruguaio. Algo parecido talvez só tenha ocorrido em 2009, com a derrota da Celeste por 4 a 0 para o Brasil nas Eliminatórias.

* Relembrando, caso apareça algum desavisado: os textos da série E Se... não tem nenhuma intenção de se tornar referência histórica, ou seja, não adianta comentar, como fizeram no outro espaço, que eu estava errado. Eu não só sei disso, como afirmo que a intenção é esta. Sejamos criativos, amig@s! Como dizia no primeiro texto, a coluna E se... não chegou para mudar a história do futebol, mas para contar o seu principal evento de uma forma diferente.

sexta-feira, 26 de julho de 2013

As TICs no esporte

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2013 marca uma nova etapa na participação das tecnologias de informação e comunicação (TICs) nos esportes. A Copa das Confederações Fifa Brasil 2013 foi o primeiro torneio de alto nível a utilizar um chipdentro da bola. Mas ainda falta muito para o principal esporte do mundo aderir tranquilamente às TICs, tendo como oposto, neste sentido, o vôlei, que foi transformado ao longo das últimas décadas para atrair o público midiático.

A mudança da autoria do primeiro gol italiano, de Astori para Diamanti, no último dia da Copa das Confederações, serviu para traçar o ponto final da trajetória de discussões que levou a International Board – órgão responsável pelas regras do football association, com quatro membros da Fifa e um de cada país que conforma o Reino Unido – a permitir a presença de TICs no campo de jogo.

Só depois que a Cafusa foi interceptada, ainda na linha, pelo jogador italiano na disputa pelo 3º lugar contra o Uruguai, é que o juiz teve a confirmação em seu relógio. Assim, após a transmissão oficial considerar gol de Diamanti, autor da cobrança de falta, o segundo tempo veio com a mudança, após a correção do árbitro.

O motivo de o chip existir, na verdade, é para avisar se a bola entrou ou não, evitando inumeráveis erros históricos, mas que chegaram ao ápice na Copa do Mundo de 2010. Pelas oitavas-de-final, a Alemanha vencia a Inglaterra por 2 a 1 quando Lampard chutou de fora da área, a bola bateu no travessão e claramente entrou no gol. O juiz uruguaio Jorge Larrionda não viu o mesmo, não marcando o que seria o empate inglês, numa partida que a Inglaterra perderia por 4 a 1.

Gastos para fomentar o “padrão Fifa”

Porém, este foi o único passo de avanço do tradicional futebol quanto à presença das novas tecnologias de informação e comunicação. As mudanças testadas nos últimos anos, como a presença de um segundo árbitro em campo e de um auxiliar atrás de cada um dos gols, sinalizam a opção pela presença humana em detrimento à intermediação tecnológica.

Na semana retrasada, a Confederação Brasileira de Futebol avisou aos árbitros brasileiros para não permitirem qualquer contato da comissão técnica de um clube com pessoas fora do campo, algo que há muito tempo ocorre no Brasil, fosse através de telefone celular ou outro radiotransmissor. A confederação sul-americana, na Copa Libertadores deste ano, já vinha proibindo a utilização, que agora foi confirmada em território nacional.

A restrição vem a calhar por conta de uma série de decisões duvidosas da arbitragem, tanto por conta de maior pressão por parte da comissão técnica do clube prejudicado quanto por casos em que árbitros voltaram atrás no que haviam marcado após um tempo razoável, o que gerou inúmeros questionamentos sobre a consulta a pessoas de fora, que possuem acesso à transmissão televisiva.

Ainda que, provavelmente por descuido dos organizadores locais, a Fifa tenha mantido o replay nos telões dos estádios na Copa das Confederações, a pequena televisão que ficava no campo para auxiliar na transmissão foi retirada. Ainda assim, no que tange aos replays, é importante falar como a equipe que transmite para a entidade internacional optou por não mostrar a repetição de lances com erros da arbitragem. Não à toa – agregado à insatisfação da população com os gastos para fomentar o “padrão Fifa” –, até mesmo a Rede Globo fez questão de frisar que não era ela a produzir as imagens que iam ao ar.

Informações via áudio

O oposto no que ocorre com o futebol é o vôlei, esporte que mais alterou a sua estrutura para caber na transmissão televisiva. Para quem não lembra, até a década de 1990 havia a vantagem, que fazia com que para pontuar fossem necessárias duas jogadas em favor de uma equipe, e as partidas, ainda que cada set com até 15 pontos, pudessem demorar muito. A retirada da necessidade da vantagem acelerou o jogo, que pôde estar na grade de programação das emissoras de TV, com tempo parecido com o que é gasto por outras transmissões, como as de futebol e as corridas de Fórmula 1, cerca de 2 horas. Passou-se à necessidade de 25 pontos para o fechamento de sets normais, e 15 para o 5º set.

Houve também outros aperfeiçoamentos das regras, como a presença de um atleta só para defender, líbero, que dá mais emoção às partidas; e a possibilidade de o técnico estar à beira da quadra, em área delimitada, assim como no futebol, com o estilo Bernardinho de ser chamando muita atenção para replayse montagem de matérias após os jogos. Por fim, desde o ano passado, pode-se tocar na rede, desde que não na borda, o que mantém a "bola rolando" por mais tempo.

Ao contrário do futebol, o contato direto entre membros da comissão técnica via comunicação de áudio é frequente, com repasse de informações e estatísticas ao longo do jogo. No caso das seleções brasileiras, há uma câmera atrás da quadra que grava tudo e repassa as informações para o notebook de um dos membros da equipe, que está no banco, que os informa para o técnico e/ou jogadores.

Visão de negócio

A presença das novas tecnologias de informação e comunicação na estrutura decisiva da partida também passou a ser utilizada. Nas finais da Superliga (campeonato nacional de clubes) deste ano, cada time podia recorrer à ajuda tecnológica para questionar alguns pontos, o que é chamado de “tira-teima” e já era utilizado nos principais torneios do tênis. Ainda assim, houve falhas pontuais, já que não se podia questionar quando a bola tocava no bloqueio ou o jogador batia o braço na fita da rede. O modelo é criação polonesa, sendo utilizado nas partidas da seleção masculina da Polônia ao longo da Liga Mundial deste ano.

Esses elementos na partida de vôlei parecem inserir momentos da lógica do espetáculo esportivo, historicamente muito bem promovido nos Estados Unidos – local em que este esporte foi criado. Além dos elementos técnicos para evitar alguma “injustiça” na competição, basta ir a um jogo de vôlei para entender o quanto o esporte aqui no Brasil busca se destacar enquanto entretenimento.

Boa parte do público utiliza a camisa do patrocinador da seleção ou do clube mandante da partida, além de, ao menos no caso das partidas das seleções, ter um animador da plateia, que literalmente ensaia antes o que deve ser gritado ao longo do jogo. Fora as tradicionais mascotes de clubes, que no caso do Brasil se chama “Zecaré”, chamando a atenção do público infantil para o evento.

A diferença das origens explica as diferentes perspectivas quanto à utilização de elementos técnicos nos jogos de futebol e vôlei. Enquanto o primeiro foi normatizado no Reino Unido, seguindo o direito consuetudinário inglês, em que o direito precedente prevalece sobre o novo, não sendo necessário acrescer uma nova regra ao conjunto de normas inicialmente criado; o segundo vem a ser criado em 1895 nos Estados Unidos, local cuja visão de negócio prevalece sobre quaisquer tradições historicamente criadas.

***
[Texto originalmente publicado no Observatório da Imprensa]

P.S: Este texto foi enviado há duas semanas, mas publicado nesta. Acabei reenviando outro texto, mas foi publicado o primeiro. Há algumas outras informações a acrescentar:

1-2013 marca para o vôlei uma nova grande alteração quanto à estrutura, com a diminuição dos sets para 21 pontos, tendo em vista encurtar ainda mais o jogo para a transmissão televisiva e aumentar a emoção da disputa. Esta fórmula vem sendo testada desde junho na Liga Europeia e deverá ser utilizada na próxima edição da Superliga, campeonato nacional de vôlei, no Brasil.

2-A fase final da Liga Mundial também usou o "tira-teima" eletrônico.

quinta-feira, 25 de julho de 2013

Eles acreditaram e conquistaram

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Foto: Evaristo Sá/AFP
Eles começaram o campeonato com tudo, com direito a duas goleadas sobre os argentinos do Arsenal, apesar de pênalti perdido e a polícia mostrando o que geralmente faz por aqui. Depois de passear na primeira fase, "jogar pra valer" nas oitavas-de-final, tudo o que veio depois foi para testar os atleticanos após 42 longos anos sem títulos expressivos. O "Eu acredito!" muitas vezes entoado era para que o sofredor das arquibancadas se convencesse antes de qualquer um.

Um título que veio após a quebra de todo o tipo de barreiras subjetivas possíveis e imagináveis. O time de melhor campanha há 17 anos não levanta a taça. Cuca monta bons e ofensivos times, mas não ganha nada. O Atlético Mineiro, sob comando do polêmico Alexandre Kalil fora de campo e com nomes com procedência (baladeira) como Ronaldinho e Jô seria o cavalo paraguaio.


Aí vieram os confrontos com os (chatos) mexicanos do Tijuana. Empate no final do jogo no campo artificial (que só existe lá) graças a Luan e uma difícil partida de volta. O Tijuana até caiu no Horto, mas quem quase morreu foi o torcedor atleticano. Pênalti aos 47 do segundo tempo e o pé esquerdo de Victor levantado. Tudo bem que o goleiro faria mais depois, porém, um ano antes, também nas quartas-de-final, era Cássio quem garantia a "imagem do título". Nós palmeirenses bem sabemos o quanto a Taça LIBERTADORES é gloriosa para o jogador que sempre pode ser o mais criticado.

Crente, muito crente. Foi assim que vimos Cuca nas partidas do torneio, especialmente nos momentos difíceis. Mais que tática, gritaria, era uma de se ajoelhar durante o jogo, abraçar a imagem da santa na camiseta, enfim, temer tanto quanto o torcedor atleticano de que aquele pouquinho que faltou em vários momentos antes voltasse a acontecer.


Risos? Só de nervosismo ou dos cruzeirenses neste tempo todo. Especialmente, nos jogos de volta das semifinais e da final. Em ambos, diferença a ser tirada de 2 gols. Novamente, algo que poucas vezes aconteceu antes - uma delas contra o próprio Olímpia, em 1989. O segundo gol, o do empate, demorando a acontecer. Foi preciso passar dos 40 e até faltar luz no novo Independência para consegui-lo na semi, justo através de alguém formado no maior rival.

E na final, então? Não bastasse ter levado um gol no apagar das luzes no Defensores del Chaco - desta vez, metaforicamente falando -, o primeiro tempo foi sofrível para o torcedor atleticano. Jogando daquele jeito, dificilmente o time faria um gol, quanto mais dois. Mas o segundo tempo já começou com gol, graças à falha do mesmo rival que marcara o segundo na partida anterior.

Disseram muitas coisas contra o (novo) Mineirão devido ao recente histórico do Atlético no Independência. Entretanto, há de se agradecer ao gramado do estádio. Ferreyra, sozinho, após driblar Victor, ajeita-se para calar os 60 mil atleticanos na agora arena e prende o pé no gramado. Melhor, é puxado pela grama. Crianças e mulheres, e provavelmente muitos homens, choravam nas arquibancadas, embaladas por sequências de "eu acredito!" com os olhos voltados ao céu.

Independente de todos os problemas, todas as zicas individuais e coletivas, o Atlético seguia vivo, especialmente com as bolas alçadas na área. Numa delas, Leonardo Silva tentou cavar o pênalti - e foram tantas tentativas que quanto ele saiu o juiz não conseguiu ver -, a bola rolando e muita reclamação. Ela volta para a área e o zagueiro cabeceia. Instantes de um silêncio ainda mais angustiante, que não devem ter chegado a um segundo. O caminho da bola, que acertara a trave em lance do mesmo Leonardo num momento anterior, poderia ser destrinchado em 42 anos, até o grito gigante de gol.

Tensos estavam todos, mas ao menos o mínimo havia sido feito, com uma prorrogação inteira por vir e um jogador a menos no adversário. Mas se viesse desse jeito, com gol de cavadinha do Alecsandro (!!!) seria muito fácil. Tinha que ser de outra forma, da mais tradicional dentre as decisões emocionantes do futebol.


Os pênaltis vieram e, ao contrário do jogo contra o Newell's, Victor começou (se adiantando e) pegando logo o primeiro pênalti. Os rostos já eram tranquilos nas arquibancadas quando Giménez tirou do goleiro e acertou a trave. Clube Atlético Mineiro campeão da Copa Libertadores 2013! Eles acreditaram e conquistaram um título deste nível, que não chegava há 42 anos. Domingo tem clássico para provar que as brincadeiras, ao menos por enquanto, cessaram.


terça-feira, 23 de julho de 2013

Você é torcedor do... ?

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Ter várias camisas de times de futebol e usá-las acaba facilitando as pessoas de começarem um bate-papo. Já contei algumas destas histórias em outro post deste blog e não param de aparecer outras.

Outro dia, eu estava com a camisa do Aimoré, modelo comemorativo do título da terceira divisão do Gauchão de 2012, que usa o padrão do Barcelona na temporada passada, só que toda em azul. Uns meninos jogavam no início da rua e um deles me parou para saber que time era aquele.

O Aimoré voltaria a ser assunto, ainda que indiretamente. Faz quase uma semana que fui comprar umas coisas perto de casa vestido com a camisa do Grêmio. Paguei e o vendedor puxou assunto, dizendo que o "meu" Grêmio ganhara no dia anterior - o sofrido 2 a 1 contra o Botafogo. Nem me dei conta de explicar primeiro que sou colecionador de camisas. Disse que não torcia pelo Grêmio, que se fosse escolher o time a torcer no Rio Grande do Sul, onde morei recentemente, seria o que disputava a segunda divisão estadual - a partir de 2014 não mais!

Contei aqui a história com o meu vizinho corintiano. Naquele dia que peguei a carona, estava com uma camisa do Fluminense e a primeira coisa que ele queria saber era se eu tinha mudado de time. "Claro que não!". Aquela era só elemento de coleção.

Hoje foi a vez de reencontrar os meninos que moram mais para o final da rua. Um deles me viu com uma camisa de treino do Santos e logo me perguntou se eu era santista. Respondi que não, que colecionava camisas de futebol. O que, de pronto, outro respondeu que também fazia; enquanto o amigo, que deve ser paulista, dado o sotaque, falava, sem a mesma empolgação de antes, que ele sim era torcedor do Santos.

Aí começaram a perguntar se eu tinha camisas de vários clubes: tem do CSA? Sim!, respondi ao que estava com uma réplica da camisa azulina. E do Flamengo? Não. E do Vasco? Não. E do Botafogo? Não, do Rio só a do Fluminense. E a do Barcelona? Sim. E do Real Madrid? Não.

Depois da série de questionamentos, o santista me perguntou qual time eu torcia. A resposta: Palmeiras. Enquanto que outro tentou seguir às perguntas de bate-pronto:

- Tem camisa do Corinthians?

- Desse time aí, jamais!

Antes de irem embora, ainda o santista me perguntou qual a camisa que eu mais gostava. "Claro que as camisas do Palmeiras".

domingo, 21 de julho de 2013

[Por Trás do Gol] Eu e os diferentes acessos de Brasil e Aimoré

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Quando a Divisão de Acesso do Gauchão, ou Série A2, começou eu fui a um dos jogos, que seria o meu último em território gaúcho. Mal imaginava qual seria o resultado final, além das minhas expectativas. Se o São Paulo de Rio Grande garantiu a primeira vaga nos pênaltis, o título do Brasil de Pelotas ontem e a última vaga neste domingo para o Aimoré representam muito.

Representados por índios, os xavantes foram os primeiros que receberam a minha visita; os capilés foram os últimos. A camisa xavante foi a primeira que eu ganhei no Rio Grande do Sul; a capilé foi a última que eu consegui comprar, e a mais difícil. Conheci alguns torcedores xavantes, um fanático, se é que isso não é sinônimo para torcedores do Brasil; conheci os capilés indo ao Estádio João Correia. Um nem poderia ter saído da divisão principal, imagina ficar 4 edições de fora. O outro se reestruturava, acabando de sair da terceira divisão.

Na terra em que a maioria dos holofotes são para Grêmio e Internacional, a ponto de mesmo clubes com tradição recente como Juventude e Caxias estarem em divisões inferiores do Brasileiro, 4ª e 3ª, respectivamente, acabei por simpatizar por dois times do interior. De um lado, o Brasil, pela paixão da torcida - às vezes exagerada - e pela sensação de justiça. Do outro, o Aimoré, o azul e branco cujo estádio eu podia ir a pé e que estava no fundo do poço, na terceira divisão estadual. Este domingo, mudou tudo.


O QUE DEVERIA SER ÓBVIO
O Estádio Bento Freitas foi o primeiro que eu visitei, em 2011. Mas bastava conhecer um pouquinho da história do campeonato gaúcho - quer dizer, algo para além da dupla Gre-Nal -, para saber o quanto o Brasil de Pelotas, e sua torcida, estava longe de seu lugar de merecimento. E isso desde 2009, quando do fatídico acidente de ônibus que matou 3 pessoas, dentre as quais o ídolo Cláudio Millar. 

Ano após ano, o time ficava no quase, mesmo com maior potencial de investimentos que os seus rivais de divisão. Era como se os xavantes jamais pudessem sair do dia 16 de janeiro de 2009, como se os ponteiros do relógio, as folhas do calendário, seguissem paradas naquele momento.

Para 2013, a Federação Gaúcha aumentou o número dos que caíam da A1 e aumentou dos que subiam. Eram 3 as vagas. Ainda assim, o primeiro turno, com clássico da região sul do Estado, davam ares de drama para o que deveria ser óbvio. No Bento Freitas, vitória de 1 a 0; no Aldo Dapuzzo, 1 a 0 para o São Paulo. Após disputa de pênaltis quase intermináveis, derrota de 3 a 2.

Os xavantes deviam nadar tudo de novo. Quer dizer, o (confuso) calendário até já garantia ao clube ao menos a disputa com o perdedor do segundo turno.



A AMEAÇA DO RETORNO
Enquanto isso, a tribo capilé vivia a sua própria crise. Após aquela vitória inicial, com direito a dois gols de Rodrigão, o time seguiu para uma jornada de partidas sem vencer, com a demissão do técnico. Eu acompanhava a cada 3 rodadas e respirei aliviado com a boa sequência de resultados ainda no final do primeiro turno, dando boa margem de segurança para a disputa do segundo. (Afinal, não era possível que pela primeira vez na vida a minha ausência daria azar a algo).

Li algumas respostas à mídia da região do Vale dos Sinos, que considerava o Aimoré como possível rebaixado, logo após ter subido. As mudanças vindas com o técnico Ben-Hur Pereira, que retornara ao cargo no clube que iniciara seus trabalhos como técnico, daria muito certo. Provavelmente, bem mais que qualquer torcedor aimoresista poderia imaginar.


OS DIFERENTES ACESSOS
Com internet, passei a acompanhar mais a Divisão de Acesso. No Grupo A, não só o Aimoré se distanciou de qualquer ameaça de rebaixamento, como fez no segundo turno uma campanha exemplar: 5 vitórias, 1 empate e 1 derrota. O Brasil também liderou o Grupo B, com uma campanha um pouco pior: 4 vitórias, 2 empates e 2 derrotas. Sentia que o confronto poderia vir.

Nas quartas-de-final, o Brasil até perdeu o jogo de ida para o Avenida, mas goleou em casa. Enquanto o Aimoré goleou o Internacional de Santa Maria fora de casa e venceu por 2 a 1 na volta. Nas semifinais, foi a vez dos xavantes passarem fácil pelo Santo Ângelo, com um agregado de 6 a 0; enquanto o Aimoré passou no sufoco pelo Avenida, graças à melhor campanha, após perder por 2 a 1 fora e ganhar de 1 a 0 em casa, em meio a MUITA chuva no Cristo Rei.

Veio o confronto. Em meio a várias discussões sobre o "esquecimento" do regulamento sobre quem ficaria com uma terceira vaga, com pressão nos bastidores do Riograndense, de Santa Maria - e que também tenho uma camisa -, para ter uma decisão pelo 3º lugar de qualquer jeito, já que o time tinha a melhor campanha além dos finalistas do turno.

No final, parecia que o Brasil já tinha vaga garantida, já que tinha o melhor aproveitamento geral mesmo perdendo as duas partidas. Ao Aimoré, caberia 2 pontos para ultrapassar o Riograndense na pontuação geral. Como o vice-campeão do 1º turno seria o campeão do segundo e que era o time de maior pontuação; o Aimoré não teria quem enfrentar, sendo o segundo de maior campanha e vice de turno ao mesmo tempo.

No primeiro jogo, 3 a 0 para o Brasil de Pelotas, título de turno praticamente garantido e muita conversa sobre possível jogo de entrega na volta. De novo com MUITA chuva, Aimoré e Brasil de Pelotas fizeram um jogo bem disputado. O time capilé até teve pênalti a favor, mas desperdiçou, tendo que disputar os jogos extras com o Riograndense.

Assim, enquanto o Brasil partiu para a revanche com o São Paulo, o Aimoré disputaria a última vaga com o time de Santa Maria, fora da primeira divisão há 47 anos!

O Brasil não deu moleza e venceu por 4 a 1 o São Paulo no Aldo Dapuzzo. No sábado, confirmou o título da Série A2 com o gol de Rafael Foster, de pênalti. FINALMENTE o Brasil de Pelotas voltará ao Gauchão. Finalmente teremos um BRAPEL (Brasil X Pelotas) de novo na principal disputa do Rio Grande do Sul.

Numa partida bem disputa, o Aimoré começou perdendo fora de casa, virou o placar, sofreu o empate e marcou o gol da vitória aos 46 do segundo tempo! Se os 3 a 2 pareciam tranquilos, eu não fiquei nada ao ver que o Riograndense abrira o placar em São Leopoldo com menos de 15 minutos de jogo. Os capilés estavam com a vaga por terem feito mais gols fora de casa.

A disputa seguia, com gols anulados do time de Santa Maria e muita disputa no enlameado, ainda que sem chuva, gramado do Estádio João Correia. Se o artilheiro Japa parou no goleiro adversário, a bola achou Luan que, de bico, venceu as travas dos zagueiros e mandou ao gol. Empate no segundo tempo, faltando cerca de 20 minutos, e gritos de "o Aimoré voltou".

Mas ainda teve mais. Pênalti contra não dado, técnico adversário expulso e pênalti a favor, mais uma vez desperdiçado, aos 44 minutos do segundo tempo.

Provavelmente ninguém esperava no início, mais ainda não se esperava após aquelas primeiras rodadas preocupantes, mas o Aimoré voltará a disputar o Gauchão após 20 anos. Mais do que nunca, eu tenho a sensação de novamente ter feito parte da escritura da história.

sábado, 20 de julho de 2013

Coleção - Camisa Nº 4

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Se fosse seguir a ordem, do período que esta camisa passou à minha posse, ela demoraria mais alguns meses até aparecer por aqui. Explico, esta camisa era do meu pai e ele me deu já quando tínhamos voltado a Maceió, até mesmo porque até então eu não tinha camisa do clube local. Explicarei...

Moramos de 1990 a 2000 em Aracaju-SE. A minha referência de futebol em Alagoas foi o CSA, especialmente por conta do tetracampeonato do final daquela década - com direito à final da Copa Conmebol, ainda hoje o único nordestino a chegar numa final internacional. Se virei palmeirense, em casa de corintiano, graças à TV (e à era Parmalat), a escolha foi herdada no Estado de origem. Não à toa que em Sergipe torcíamos, ou simpatizávamos, com o Confiança.

Lembro (bem) de ter ido a uma partida contra o Itabaiana, no Estádio Presidente Médici, pela Série C de 1997. Derrota de 2 a 0. Além de ter ido alguns anos antes disso, para o Estádio Rei Pelé para ver uma partida do CSA a qual não me recordo. Só sei que fui ao estádio e, quem diria, dormi, cansado da viagem realizada horas antes de Aracaju para Maceió.

Esta camisa tem boas histórias. Ela chegou à família por meio de uma tia, que trabalhava numa (então) grande livraria de Maceió pelas mãos do então presidente do CSA, Arnon de Mello Neto. O nome não é mera coincidência. Ele é filho do senador Fernando Collor, e inclusive falaria sobre ele posteriormente, num equívoco, em meu ver, de uma revista nacional. Ele fazia compras na livraria/papelaria e ganhou, se me lembro bem, duas camisas no período. Como é a única azulina da família, deu os uniformes ao meu pai.

Este é de 1999, sendo utilizado na Copa do Nordeste daquele ano, em que o CSA foi eliminado pelo Bahia nas semifinais, mas garantiu vaga para a Copa Conmebol com o bom torneio realizado. Eu não encontrei imagens, mas ela teria sido utilizada também no torneio sul-americano. Esta não é a utilizada no quarto título seguido, conquistado em 1999, porque nela o patrocínio da Vasp pulou para frente e o da Tampico para trás da camisa, que, por sinal, é bem bonita, apesar do material ser pesado.

Ainda deu tempo de em Aracaju o meu pai ser questionado nas ruas do Centro de como ele tinha conseguido esta camisa. Não lembro que fim levou a do ano anterior, provavelmente (e infelizmente) deve ter ido para o lixo. Esta resiste bravamente, guardada, como item da minha coleção, a qual deve ter sido entregue a mim em 2004 ou 2005.

Camisa 4
Centro Sportivo Alagoano
Réplica
1999
Valor não recordado

segunda-feira, 15 de julho de 2013

[Baú do Por Trás do Gol] Carta de um campeão sul-americano

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Este texto não era bem do Por Trás do Gol, surgiu de um desafio da comunidade Olé Olé. Precisava-se escrever algo sobre a final da Taça Libertadores da América de 1979, entre Olímpia e Boca Juniors. Lembrei a tempo de resgatar do baú antes de mais uma final com a presença dos paraguaios, desta vez com o Atlético-MG sendo o time que busca seu primeiro título.

“Já são trinta anos e não dá para tirar da memória. 

A nossa responsabilidade era enorme, já que a única vez que fizemos uma final de Libertadores foi em 1960, derrota para o Peñarol - que também nos eliminaria, só que nas semifinais, da edição seguinte. 

O Olímpia carregava este fardo nas costas desde a criação do torneio. Você tem dúvida que estávamos nervosos?

As pernas tremiam no vestiário só de ouvir o barulho da nossa torcida no primeiro jogo. Era muita emoção, muita responsabilidade. O nosso adversário era nada mais nada menos que o atual bicampeão da Taça Libertadores, o Boca Juniors!

Quando adentramos no gramado do Defensores del Chaco e vimos a festa de 50 mil alvinegros nas arquibancadas, sentimos que naquele dia não jogaríamos apenas por nós. Era um pedaço da nação que acreditava na nossa vitória.

Tremer? Agora não mais. É no campo que podemos resolver os nossos problemas e fazer com que tanta gente esqueça dos seus, ao menos por 90 minutos. A torcida era mais do que nosso 12º jogador, ela nos empurrava.

Com o apito do juiz, partimos para cima dos argentinos. Logo no início do jogo conseguimos um gol, que foi o reflexo da nossa vontade. A bola batia em todo mundo, mas não permitia que alguém a matasse, ajeitasse. Até que Ayuno conseguiu colocá-la no gol. A torcida explodiu!

Sabíamos da importância de sair de casa com a vitória, mas quantos mais gols, melhor. E o aviso de que o fardo sairia de cima de nós veio ainda no primeiro tempo. Num chute rasteiro em cobrança de falta de Piazza, a bola resvalou num morrinho no gramado após vir na altura do chão por muitos metros. O goleiro argentino não teve tempo de se recuperar e a bola entrou.

Não tirarei da memória o final daquela nossa vitória por 2 a 0. O quanto nossa torcida vibrava! 

Foi a semana mais demorada das nossas vidas. Era difícil manter a cabeça no lugar e entender que tanta alegria poderia resultar numa grande frustração no segundo jogo, na casa deles, num dos estádios mais perturbadores do mundo.

Se hoje a Bombonera já assusta os rivais com garrafas, gritos, pulos, cusparadas, imagina como era naquela época, sem todos esses limites impostos pela FIFA! Aquilo foi um caldeirão com 65 mil ingredientes dentro!

Cada bola tirada, cada minuto passado trazia a sensação de que não tinha jeito, seríamos campeões!

Os minutos pareciam se arrastar no final do segundo tempo. O nervosismo estava estampado nas caras dos jogadores, da comissão técnica, dos torcedores. Uns querendo que a partida acabasse e outros esperando por um milagre de dois rápidos gols.

O árbitro parece ter escutado as nossas preces e encerrou a partida antes dos 45 minutos. Pular, gritar, abraçar os companheiros, tirar a camisa, ir à direção aos nossos poucos torcedores lá presentes,... A alegria era tanta que não tinha como escolher qual das coisas fazer.

O mais importante estava feito, o Olímpia poderia dizer que era campeão da Libertadores!

Entramos na história do clube, que ainda venceu os torneios de 1990 e 2002. Ah, este foi em cima de um dos times do seu Brasil e só não foi mais emocionante que o que conquistamos, porque aquele foi o primeiro.

Se a história só trata dos campeões, com 19 anos de atraso colocamos o Olímpia na biografia do futebol sul-americano.”

domingo, 14 de julho de 2013

[Por Trás do Gol] Quando a fase é ruim...

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Pressão, com boa parte dos jogadores adversários na defesa. Troca de passes, a bola chega na área e o centro-avante é travado na hora do gol. Bola mandada para área, antecipação do goleiro e a bola passando raspando a trave sem ninguém empurrar ao gol. Meia-atacante recebe um excelente passe na área, chuta torto, mas no canto. A bola vai para fora. No lance seguinte, contra-ataque e o centro-avante adversário, Leandro Kível, acerta um chutaço mesmo sem ângulo.

Esta situação representa muito bem o que foi o primeiro tempo de CSA X Sergipe. Ainda que o campeão sergipano deste ano tenha começado controlando bem a posse de bola, o desentrosado time alagoano foi empurrado pela torcida e conseguiu criar, mas sem perfeição nas finalizações. Já haviam passado mais de 180 minutos sem gols, o desespero pelo primeiro seguia.

A bola seguiu rolando no Estádio Rei Pelé e as coisas não mudaram, ao menos no primeiro tempo. Mais um cruzamento para a área e cabeceio clássico, no contrapé do goleiro, que fica parado no meio do gol. A bola raspa a trave e vai para fora. Com 3 atacantes, o Sergipe só não conseguia acertar lançamento nas costas dos laterais porque errava de bobeira. "Quando a fase é ruim...". Muitas foram as vezes que ouvi o comentarista da rádio comentar isto. Assim, terminou o primeiro tempo com 1 a 0 para os colorados.

No sábado, nem assim sairia gol do CSA
Torcida pegando no pé dos jogadores, dividida entre aplausos a poucos e vaias à maioria. Não teve fôlego nem para os que se destacaram no Campeonato Alagoano, casos do meia Elyeser e do atacante Everaldo, que pareciam firular muito com a bola nos pés.

A irritação da torcida aumentaria no segundo tempo. O time pareceu cansar de tanto atacar e cada um quis tentar algo sozinho, para mais vaias da torcida nos lances a seguir. Nem as alterações, colocando o time mais para o ataque, mudaram a situação, com pouquíssimas chances sendo criadas.

Raiva do time, que ia para a terceira derrota seguida em três jogos, e muita provocação da torcida sergipana, uma dais rivais da organizada da região. Motivo o qual torcedores que nem eu tiveram que dar uma volta a mais até chegar ao estádio "para não cruzar com a torcida adversária", por sugestão (!!!) da polícia.


O ápice foi o gol na casa dos 30 minutos. Após Flávio salvar em alguns contra-ataques, saiu o segundo gol, com Parral, com a torcida, em massa, abandonando o estádio. A imensa maioria não viu a chance de, ao menos, deixar de ser o único dos 101 times entre as 4 divisões do Campeonato Brasileiro a não marcar gol. Alex Henrique partiu para a bola e "quando a fase é ruim...", o atacante tira do goleiro, mas também do gol.

Final do jogo: CSA 0X2 Sergipe. Além das inúmeras vaias e xingamentos, o presidente do CSA anunciou a dispensa do diretor de futebol Elias Mansur e que deverá utilizar os jogadores do clube para os demais 5 jogos na Série D. Parece que o ano do centenário acabou e, no final das contas, o vendedor de garrafinhas estava certo...

sábado, 13 de julho de 2013

"Chile, la alegría ya viene"

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Duas coisas me fizeram ter tanta vontade em ver "No", dirigido por Pablo Larraín: a história do plebiscito que ajudou a tirar o ditador Augusto Pinochet do poder; e a utilização das câmeras U-Matique 4:3, padrão da década de 1980, num filme do século XXI. Foram mais de quatro meses esperando a oportunidade, de ter o filme num cinema próximo e eu tendo condições de assisti-lo. Não foi num cinema, mas consegui vê-lo.

Comentava com um amigo, dias atrás, que desde que cheguei em Maceió não havia conseguido ver um filme completo, fosse pela TV, pelo computador e muito menos no cinema - neste caso, muito por conta do fechamento do Centro Cultural SESI. O último havia sido Anna Karenina. Mesmo "No", que queria ver em Porto Alegre, mas não foi aos cinemas mais centrais, chegou a ir à Sessão de Arte do Centerplex do Maceió Shopping, mas às 11h e com preço de sábado.

Até que vi na agenda cultural de um dos jornais locais as informações sobre a segunda edição do "Festival Cinema Pela Verdade" e, dentre os 4 filmes a serem exibidos e debatidos, estava o primeiro filme chileno a ser escolhido pela Academia de Hollywood enquanto candidato ao Oscar. Vi que seria numa terça-feira à noite, dia que até então não tinha compromisso formal. O local: a Universidade Federal de Alagoas, que não pisava desde o dia 6 de janeiro de 2011, quando colei grau.


UM FILME SOBRE A CAMPANHA
Larraín havia dirigido outros dois filmes que se situam no período da ditadura militar no Chile (1973-1988), "Tony Manero" e "Post-Mortem", sempre de forma crítica, apesar de ser filho de pais de direita, nas relações político-partidárias. Segundo o diretor, a ditadura foi o pior tempo para os artistas, só isso justificaria as críticas apontadas por alguém que também trabalha com publicidade, cujas contradições são centrais para o desenvolvimento de "No". O roteiro foi escrito por Pedro Peirano, baseado na peça teatral "El plebiscito", ainda inédita, de António Skarmeta - cuja uma das transcrições para tela é "Il Postino", comentada aqui.

Ouvi falar bastante sobre o período ditatorial do Chile, inclusive na perspectiva de grande abertura dos mercados - inclusive o comunicacional -, mas nunca soube como ele terminou. Até antes de ler uma resenha sobre este filme, estava submerso na ignorância que somos acostumados, de só ver em escolas e faculdades, no geral, informações sobre as nações ocidentais ricas.

Explicando para quem, que nem eu, não conhecia a história. Como muitos devem saber, os golpes militares na América Latina tiveram um grande incentivo dos Estados Unidos, começando com o do Brasil, em 1964. A partir dos anos 1980, a aplicação de políticas neoliberais a partir dos EUA e do Reino Unido força com que se tenha um modelo que permita às empresas atuarem livremente e, consequentemente, uma nova abertura para o consumo, agora em escala internacional, fazendo as pressões das nações desenvolvidas e de órgãos transnacionais (como o FMI) para o fim dos governos golpistas.

Em 1988, Pinochet e sua equipe resolvem criar um plebiscito popular para escolher se ele poderia ficar por mais 8 anos no cargo. Algo que já estava na Constituição aprovada pelos militares em 1980. Ele teria 15 minutos e os demais 17 partidos outros 15 minutos para, numa campanha eleitoral de 27 dias, convencer a população.

O filme mostra, com elementos ficcionais, a formação da campanha do "No" a partir do publicitário Reneé Saavedra (Gael García Bernal), político forçado ao exílio com a família. Ele voltara ao país e já conseguia muito dinheiro para trabalhar, tendo casa e carro próprios. Por conta de amigos, acaba topando fazer a campanha, tendo em vista, inclusive, que a ex-mulher, Verônica (Antonia Zegers) era militante contra os militares, aparecendo em rápidos momentos para ver o filho, Simón.

O chefe de Reneé na empresa de publicidade, Lucho Guzmán (Alfredo Castro), é pinochetista convicto e o tenta convencer das mais diversas formas a não entrar na campanha contrária, propondo, inclusive, uma sociedade. Depois, com essa opção rechaçada, chega a fazer ameaças. Ainda assim, não demite o (bom) profissional e ainda o ajuda em determinado momento.


"O povo chileno pensa no futuro"
O filme abre, intermedeia e fecha com a frase deste tópico, que ainda tem como início algo como: "o que você verão está inserido no atual contexto social". Para quem estuda a Indústria Cultural, é um prato cheio para análise, afinal, mostra como a publicidade, que é posta como a ferramenta para vender qualquer produto, pode vender ideias sociais importantíssimas.

O longa é permeado por discussões de como "a campanha parece propaganda de refrigerante", que "não mostra as atrocidades cometidas", etc. que são expostas por Verônica, mas também pelo diretor audiovisual, ligado à luta de esquerda, Fernando Arancibia (Néstor Cantillana), que faz questão de entrar em debates pesados. 

De um lado, Reneé tem a contradição com o chefe, que depois do início da campanha na TV assume a direção do "Sim" e faz coisas vergonhosas, diga-se de passagem. Do outro, pressão de uma visão de esquerda que claramente não acreditava numa vitória no plebiscito por ser cria do ditador, montado a partir de seus desejos.

Vemos como a linguagem publicitária, de que não há argumentos contra a alegria, vence na equipe de produção, com alguns relatos e cenas mais fortes para agradar o posicionamento mais radical, por mais que "não venda", seja "feio". Ao longo do tempo, eles conseguem desenvolver um material que faça com que as pessoas com medo de votar o façam. Isso correspondendo a tipos totalmente diferentes: pessoas acima dos 60 anos e jovens, ambos não acreditando que aquilo possa ser alterado.

Há várias semelhanças com as campanhas políticas recentes, com pessoas sorrindo o tempo todo, jingles e tudo o mais. Incrível que conseguiram convencer tantos a fazer aquilo para uma campanha que necessitava apresentar um traço radical, mas inspirador de mudança. Foi colocado após o filme, é serve como parâmetro para as mudanças nas campanhas presidenciais petistas, de 1989 a 2002, especialmente - por mais que o futuro também não tenha sido tão nobre, já que foram necessárias articulações político-econômicas por aqui.


Partindo para a estética, "No" tem cara dos anos 1980 e isso fica bem interessante quanto há a transposição para as imagens de arquivo, fazendo com que não nos pareça tão diferente, por mais que haja atores sendo mostrados no antes de gravar para a campanha. Confesso que não achei a quantidade de arquivos exagerada, mas também tenho uma motivação política para gostar de ver o material.

Ainda assim, é importante frisar que há um exagero quanto ao tratamento da imagem, nesta tentativa de reproduzir a (falta de) qualidade do passado. Desfoques e granulações são muito visíveis, ficando claro que a tentativa era expor isso. Assim como, há cortes, em meu ver de amador, que ficaram confusos. Isso aparece, justamente, quando a qualidade da imagem é provocativamente tornada dúbia. Deu-me a parecer que havia problemas de continuidade.

Há outras questões que, numa nova recepção do filme, podem ficam mais expostas. Destaco também que apesar de estar envolvido com a história, há a história de ficção, da separação/possível volta do publicitário com a mãe de seu filho que é desenvolvida em paralelo que pode desagradar. Além disso, momentos em que as ameaças dos militares parecem que vão aparecer com maior força parecem depois não passar de um susto, passando rápido para o período seguinte.

Mesmo assim, vale a pena conferir o filme chileno, ainda mais que nós brasileiros não estamos acostumados com as histórias dos países vizinhos, os mesmos que souberam olhar mais para o passado sombrio, punindo alguns dos responsáveis, ao contrário de nós. 

Esteticamente, em meio a tantas produções em 3D, é interessante ver uma aposta de cinema "retrô" para além das exibições em preto e branco, com mais momentos de câmera na mão. Como também, a questão da utilização de imagens reais, de arquivo, para alimentar uma produção que, apesar de baseada na campanha real, tem a ficção como pano de fundo. Ou seja, a campanha do plebiscito existiu, há imagens do período, mas "No" não é um documentário, não precisando seguir fielmente a história.

PRÊMIOS E NO+
"No" foi o primeiro filme chileno a ser selecionado ao Oscar, perdendo o prêmio de melhor produção estrangeira para (o excepcional) Amour, vencendo os seguintes prêmios: melhor filme (2012) na quinzena de realizadores do Festival de Cannes; Prêmio Pedro Sena (2012) como melhor longa-metragem, junto a "Mi último round"; primeiro prêmio Coral ao melhor longa de ficção no Festival de Havana (2012); e o Prêmio Altazor (2013) por melhor direção.

Devido a uma crítica duríssima - "o Chile não precisava desse filme" - que ouvi num dos comentários após a exibição de "No" fui dar uma olhada no site oficial. Uma das coisas interessantes por lá é "La maquina de No", onde você pode produzir e imprimir algo "a qué le quieres dicer no". No filme, a campanha pede para as pessoas riscarem na vertical o traço, formando um "No+".

Dentre os mais baixados estão, respectivamente: Hinspeter, o fundador do partido direitista Renovação Nacional; "Guattón Labbe en Providencia", prefeito da comuna de Providencia, bairro nobre e centro financeiro de Santiago; e a líder da associação nacional dos estudantes (2010-2011), Camila Vallejos, que ficou famosa no mundo após as manifestações por educação pública. (Inclusive, se alguém souber o que ela faz com tantas pessoas "não a querendo mais" ao lado das figuras que ponteiam, por favor, expliquem-me).

CINEMA PELA VERDADE
A exibição de "No" consta na programação da segunda edição do Festival Cinema Pela Verdade, realizado pelo Instituto Cultura em Movimento (ICEM), em parceria com o Ministério da Justiça, que foi contemplado pelo edital "Marcos da Memória", da Comissão da Anistia, que visa a promoção de eventos e projetos com foco no período da ditadura cívico-militar no Brasil, algo muito importante para entendermos a nossa história. 

No ano passado foram realizadas 201 sessões, com 5 filmes brasileiros exibidos em 90 universidades de todas as unidades da Federação, com um público de 20.401 pessoas. Neste ano, o festival também exibe filmes internacionais, seguindo a gratuidade os debates após as sessões, com acadêmicos, pesquisadores, ex-presos políticos, pessoas ligadas a movimentos sociais, culturais e de direitos humanos, além da participação de diretores ou da equipe de produção dos filmes exibidos.

Em 2013, além de "No", os outros 3 filmes escolhidos foram:

- Documentário "Eu me lembro" (Luiz Fernando Lobo, 2012), que acompanhou os cinco anos da Caravana da Anistia;
- O argentino "Infância Clandestina" (Benjamin Ávila, 2011), que já comentei neste blog;
- "Mariguella" (Isa Grinspum Ferraz, 2012), que conta a história do "maior inimigo da ditadura militar no Brasil", autor do Manuela do Guerrilheiro Urbano.

Para quem é de Maceió, a exibição ocorre no Auditório da Reitoria da Universidade Federal de Alagoas, a partir das 19h. No dia 15 de julho, será "Eu me Lembro", a ser debatido pelo presidente da Comissão de Direitos Humanos da Assembleia Legislativa, Judson Cabral (PT), e pelo presidente da Comissão da Verdade dos Jornalistas em Alagoas, Edberto Ticianeli. No dia 16, será a vez de "Infância Clandestina", debatido pela cientista política Luciana Santana e pela historiadora Ana Paula Palamartchuk.